"Não é o objecto da brincadeira que marca um limite; são as circunstâncias que afirmam ou negam o acto de gracejar. Eu não quero comportar-me desse modo, usando sarcasmo. A questão muito difícil é a de como traçamos o limite - e estou certa de que tu aceitas limites. Dizê-los, fixá-los é que é o cabo dos trabalhos!"
Poderia transpor este raciocínio para a agressividade, o insulto e a violência verbal.
A primeira questão que me devo colocar é "quais os limites para a agressividade, o insulto e a violência verbal?"
Pode parecer simplismo mas são os limites do amor.
Enquanto sinto que o meu interlocutor não se sente ofendido mas entende e sente a minha agressividade ou os meus insultos apenas como eu desejo que ele os sinta e entenda, isto é, como simples figuras de retórica ou meros exercícios de humor não penso que eu esteja a ser incorrecto. Um debate, e nomeadamente um debate blogosférico, não deve ser uma troca fria de informação entre computadores mas também um jogo emocional.
Mas esse tipo de discursos exige muita atenção
("E há que estar atento, atento ... E disponível, disponível ..."
escrevia o Vítor algures na blogosfera há uns meses atrás)
A qualquer momento o julgamento que eu faço pode ser (ou vir a estar) inexacto.
E muitas vezes, é preciso ler nas entrelinhas das reacções do meu interlocutor que ele está realmente agastado e não apenas a responder no mesmo jogo de "agressividade/insultos" como simples figuras de retórica ou meros exercícios de humor.
Quando eu sentir que o meu interlocutor está de facto agastado devo parar imediatamente e se ele fizer expressamente manifestação do seu desagrado devo não só parar a "agressividade/insultos" mas imediatamente pedir desculpa pelas minhas palavras.
Continuar no comprimento de onda de "agressividade/insultos" mesmo que a brincar é, de facto, estar a importunar o meu interlocutor (peço desculpa pela comparação mas é como continuar com um discurso de engate depois de a visada já ter manifestado o seu desacordo: é exactamente o mesmo tipo de ordinarice).
Tento modular o meu discurso blogosférico em função dos interlocutores. As pessoas com quem me sinto mais à vontade a esse nível é o dragão e logo a seguir a zazie (desliguei o link a seu pedido: ver comentários) e alguns dos blasfemos. Somos capazes de grande violência verbal sem que isso signifique nada de especialmente negativo.
As pessoas são todas diferentes. E cada pessoa tem o seu nível de susceptibilidade sem que nós tenhamos nada a ver com isso. Respeitar o outro é respeitar também o seu nível de susceptibilidade. O discurso que tenho com o dragão não é nem pode ser o discurso que tenho com outra pessoa qualquer, especialmente se mal a conhecer ou, pior ainda, se souber que o seu nível de susceptibilidade não permite certas palavras.
Mas, repito, é quase inevitável acontecerem erros de avaliação. É para isso que existem as desculpas.
A segunda questão que devo colocar é: o que é que estou disposto a aceitar num diálogo?
A resposta santa é: TUDO.
Mesmo que o meu interlocutor esteja com uma agressividade genuína e com uns insultos que ultrapassam todos os limites e com uma violência verbal inaudita e genuína, mesmo que seja mais do que óbvio que essa "agressividade /insultos" nada têm de benévolo ou de simples figuras de retórica ou meros exercícios de humor, a minha disponibilidade para com ele deve continuar a ser total.
Dir-me-ão que a interrupção temporária do debate é por vezes necessária se de facto amamos o nosso interlocutor. Por vezes a interrupção do debate é a única medida adequada para impedir a corrente de emoções negativas (não só a do nosso interlocutor mas, também, por vezes, a nossa). Sem dúvida. Mas, para além de a considerar uma medida excepcional que deve ser utilisada apenas em situações excepcionais em que não se vê no horizonte nenhuma atitude alternativa adequada, ela deve ser isso, uma interrupção TEMPORÁRIA.
Porquê? Porque penso que a maior ofensa que existe ao Deus-Amor que venero é excluir alguém nem que seja de um simples debate.
Se eu cortar definitivamente com alguém, uma de duas:
- ou entendo essa atitude como uma atitude errada mas inevitável e, nesse caso, apenas me resta rezar e esforçar-me para que essa conduta deixe de ser "inevitável"
- ou entendo essa atitude como uma atitude certa. Aí, acho que, definitivamente, deixei de ser um discípulo de Cristo e é melhor procurar outra religião.
Metendo as mãos na merda (2): pimenta no cu dos outros para mim é refresco
Dir-se-á que é muito fácil a alguém debitar "santidades" quando os insultos ou a violência não atingem esse alguém.
Dir-se-á que a paciência tem limites.
Existem poucas coisas sobre as quais eu não tenha dúvidas. Mas uma delas é que um cristão (seja eu ou seja quem for) que desiste de tentar e tentar alcançar a santidade está no caminho do afastamento de Deus.
Este blogue viveu recentemente uma excelente experiência para o caminho da santidade. Penso que a violenta discussão que ocorreu merece uma análise mais detalhada e não a devemos esquecer sem tentar retirar dela algo que nos ajude a percorrer esse caminho da santidade. É isso que me proponho fazer.
Metendo as mãos na merda (1): as emoções ("Nuno, Nuno, lemá sabachthani")
O manicómio está de regresso. Salvo erro, da última vez foi graças ao Nuno, fiquei-lhe muito agradecido nessa altura mas, desta vez, até o Nuno se espantou e desapareceu de cena. Peço desculpa aos amigos protestantes do triste espectáculo para o qual aqui contribui.Talvez a religião (ou antes o catolicismo) seja, como pensam os amigos ateus, a doença infantil da humanidade. A esses só posso contrapor que, utilizando um excerto do José, num dos posts anteriores, a Igreja "é portadora de um tal capital de amor, de generosidade, de esperança, de humildade, de boa vontade e de fé no único mestre Jesus, que nenhuma das suas fraquezas (e estou a pensar em mim e noutros católicos que aqui escreveram ou comentaram - parêntesis meu) pode prevalecer e barrar o caminho por muito tempo ao Espírito Santo".
Do que vi aí para trás escrito fica-me uma ideia de várias emoções.
É natural, como em todos os debates, que as argumentações se incendeiem. Não me parece que daí possa advir algum mal irreparável. Os debates muito frios têm as suas vantagens mas se fosse possível o debate resolver-se de um modo completamente lógico, racional e "científico" púnhamos os computadores a travá-lo e a resolvê-lo.
Se a emoção é muitas vezes má conselheira, também é verdade que a exactidão e a adequação de muitas decisões humanas são também, e por vezes fundamentalmente (segundo alguns cientistas do comportamento), conseguidas pelo facto de sermos seres emocionais. Felizmente para os humanos.
O mal da emoção é apenas quando ela conduz a males irreparáveis. Mas, felizmente, normalmente perdoamos a quem nos ofendeu. Uma herança cristã? Não sei. Sempre pensei que talvez o Pai Nosso estivesse mal formulado quando nos mandava perdoar a quem nos ofendeu. Ele deveria dizer-nos para nunca nos ofendermos com o que quer que seja.
Mas, se nunca nos ofendêssemos nem sequer por alguns milésimos de segundo, seríamos computadores e não humanos.
Portanto o Pai Nosso tem razão. Podemos e devemos ofender-nos por alguns milésimos de segundo mas não mais do que isso.
Uma das coisas que define o ser humano face aos outros animais é (a par do riso não agressivo, a actividade mais humana por excelência) a sua capacidade para comunicar de modo inteligente. Sempre que se reduz a comunicação a Humanidade torna-se um pouco menos humana. Quando a comunicação se reduz de modo definitivo é um mal irreparável que infligimos à essência da nossa condição humana.
Um bom cristão terá sempre muitas ocasiões para se tornar a zangar. Assim o espero.
Essa salganhada toda aí em baixo acabou por inquinar uma discussão que pode ainda ser interessante. Chamo a particular atenção para o que o Antonius escreveu aqui e de que destaco um trecho luminosamente verdadeiro: «O que incomoda as pessoas é não terem poder decisório (sobre a doutrina católica), algo de completamente contrário ao Evangelho que prega a humildade».
A isto acrescento apenas uma citação do Padre André Depierre, um daqueles pères ouvriers franceses, cujos exemplos de vida tem alimentado tantas indignações contra os hierarcas da Igreja por parte desses Anselmos Borges. Pois esse bom Padre Depierre, que hoje está certamente em Deus, disse uma vez o seguinte: «Obedeci à Igreja para me manter livre. Prefiro ser vítima dos velhos cardeais romanos do que tornar-me escravo de mim próprio. Digo sim à Igreja e foi dentro dela que me bati por ela. Dez vezes, com alguns irmãos delegados dos outros padres operários, fomos a Roma para que as decisões tomadas contra nós fossem revistas. Durante seis anos fomos mal ou nem sequer recebidos. E no entanto, nunca desesperei da Igreja. Ela é portadora de um tal capital de amor, de generosidade, de esperança, de humildade, de boa vontade e de fé no único mestre Jesus, que nenhuma das suas fraquezas pode prevalecer e barrar o caminho por muito tempo ao Espírito Santo. O capital de santidade acumulado ao longo do tempo e do espaço por milhões de santos desconhecidos acabará certamente por abrir novos caminhos.»
Lá tenho eu que que vir aqui pôr um pouco de ordem e desta vez por causa dessa tremenda Zazie, de tão sangrento historial na blogosfera e que, mais uma vez, põe de pantanas este concílio que, como o nome indica, é uma coisa séria. Usando com proficiência uma linguagem de carroceiro, a Zazie afasta-nos daqui a clientela. Usando com inesgotável e inexplicável abundância a sua retórica, a Zazie afasta-nos a nós que aqui escrevemos dos objectivos deste blogue, distraindo-nos do essencial. Aliás, deixem-me dizer que a Zazie actua nos blogues, sobretudo os colectivos, como a filoxera actua na vinha. Citando precisamente a Wikipedia (só para a chatear): «assume as formas partenogénicas, isto é fêmeas capazes de se reproduzir sem necessidade de fertilização, ápteras (i.e. sem asas), com cores que vão do amarelado ao castanho escuro, com dimensões entre 0,3 e 1,4 mm, com formas distintas consoante a parte da planta que atacam». E realmente é assim que ela entra nos blogues, pelos campos de comentários adentro. Mede cada um, inocula cirurgicamente os seu ovos, escolhendo uns tantos para apaparicar, outros (tipo Desidério Murcho do Rerum Natura) para achincalhar e vai por aí adiante, usando a sua terrível e torrencial retórica. Passado pouco tempo, começam a caír umas tantas ramadas secas enquanto que outras, sentindo-se viçosas e adubadas pela Zazie, não sabem ainda que a sua vez chegará. Como nos diz a Wiki: «a infestação com a filoxera de uma videira com índice de Ravaz inferior a 12 pontos leva em geral à morte da planta em cerca de três anos». Mas deixemo-nos de alegorias vitícolas pois este tema da Zazie interessa-me e intriga-me. Não percebo, por exemplo, como é possível alguém, mesmo que seja à custa do erário público - e só este poderia sustentar uma Zazie – manter um tal débito de comentários, réplicas e tréplicas. Já assisti com estes que a terra há-de comer, a algo inaudito: um de nós, penso que o Miguel, responde à Zazie à 1h43 da madrugada e logo à 1h47 responde ela com inaudita ferocidade e pelo menos 5 page downs de texto cerrado. Não se percebe mas aqui, como em tudo, eu tenho uma teoria: a Zazie não é uma pessoa anónimamas uma sociedade secreta, são pelo menos três, como as Parcas, sendo a Átropos a que mais aparece por aqui no Trento. Só assim se percebe como consegue a Zazie assolar tão prolixamente tanto blogue por aí. E depois há a questão das suas intenções: o que pretende a Zazie ao dedicar ao Trento tanta atenção? Contribuír para o diálogo inter-confessional? Não me façam rir! Rir-se ela de nós? Não chega! Para mim a coisa cheira a enxofre. Detecto algo de diabólico nalgumas das suas artes de sedução intelectual. Vejo com surpresa moços sérios, como eu próprio aliás, a ajeitarem o cabelo no elevador. E pasmo também com receio perante aquelas bruscas mudanças de ritmo, quando uma Zazie prazenteira dá lugar a uma Fúria terrível e descompassada. Humm, já vi isso em filmes. Temos pois o Demo aqui entre nós. Mas se estão à espera que eu convoque agora o padre de Vilar de Perdizes para exorcizar isto à antiga portuguesa, estão muito enganados. Como me disse o Antonius há dias, o catolicismo espanhol, se calhar espicaçado por esse taumaturgo que é o Zapatero, o catolicismo espanhol está muito à frente. E aí a Igreja, na sua secular munificência para com os seus filhos, já arranjou um instrumento para que pessoas como o Miguel e o cbs possam lidar com seres como a Zazie sem incorrerem nalgum dos sete pecados mortais. Eis pois aí o coiso, como se fosse uma minuta. Malta, blogadores do Trento e seus leitores: sempre que a Zazie apareça por aí a descarregar a sua caudalosa bílis, cliquem aí em baixo e substituam os nomes. Então muito bom dia.
Miguel, tenho andado tão afundado nas desgraças da vida real que nem leio a blogosfera, nem mesmo o Trento. Mas já me fazia falta ler a Naziezita, só pra aquecer, lol Agora, se fosse a ti não ligava, népia mesmo. Já topàmos a figurona faz muito tempo. Existe ali um problema grave de desadaptação ao mundo, é questão do foro psíquico (há quem diga que tá possessa, mas não me engulo essa :). E é muito impulsiva, à menor contrariedade oscila, e oscila em vibrações de grande frequencia e amplitude... desespera. Vibra no éter como os gritos de Munch. Outrora o processo terapêutico era outro, internavam-nas em asilos psiquiátricos. Hoje, meros ansiolíticos são eficazes, conseguem estabilizar até cavalheiras destas, muito antes do colete de forças. Permitem andar solta. E a caganeira virtual, essa é o purgante das angustias, lolol Um grande abraço cbs
Aprofundando ainda um pouco mais descobre-se que a zona da Índia que é adepta do caril é a do Punjab, próxima do Paquistão e tradicionalmente com uma elevada concentração de muçulmanos.
Portanto, não é de todo errado afirmar que o caril é uma comida querida essencialmente por populações muçulmanas (excepção feita à Tailândia), e que uma percentagem muito significativa de muçulmanos (a maioria) reside em países ou áreas geográficas adeptas do mesmo.
Ou seja, o Nuno tinha razão.
Perguntam-me: o que é que isto interessa? Nada. Mas isso tem sido uma constante nos últimos posts. Quando é que voltamos ao que interessa?
Já agora deixo um repto aos pastores aqui do Trento que partilhassem um pouco da sua experiência pastoral relacionada com as questões que deixei neste post. Tenho curiosidade em saber como é que o assunto é tratado (especialmente nas comunidades conservadoras onde o assunto deve assumir contornos mais dramáticos).
Antonius Block Adenda: Não sei por que carga de água o blogger me antecipa a data dos posts.
De qualquer forma caríssimos, julgo que este tema merecia um outro blog (termos que estar a aborrecer os nossos amigos protestantes com isto não sei se vale a pena).
Quem me oiça poderá pensar que sou um tradicionalista reaccionário para quem está tudo bem. Mas existem problemas que me preocupam e aos quais não sei dar resposta fácil, problemas esses sim que julgo envolverem realmente o único mandamento que Cristo nos deixou.
São os problemas essencialmente pastorais. São os divorciados que casaram na flor da juventude e que agora gostariam de voltar a casar de novo, com um cristianismo amadurecido e com um companheiro também ele devoto cristão. São os homossexuais a quem temos respondido muito mal e tibiamente, encomendando-os displicentemente à graça de Deus sem darmos sequer os meios para um encaminhamento espiritual. São as mulheres casadas com esposos abusivos física e verbalmente, que chegam muitas vezes a ser mortas pelos maridos e a quem a resposta usual é mais uma vez "confiarem na graça de Deus e rezarem muito para que o marido mude". É que estes são os problemas onde se joga de facto o cristianismo. E nestes tenho sempre dúvidas, nestes nunca sei se realmente será só uma questão de confiança na graça de Deus (é-o em muitos problemas) ou se é impingir pesados fardos sem querer tocar neles com um dedo. É que se por um lado o cristianismo é tomar a nossa cruz, por outro a tendência farísaica é forte e devemos sempre analisar se não estamos a ser nós a ser causa indevida de sofrimento.
Nenhum desses problemas que o AB enuncia são verdadeiras questões em que estejam envolvidas pessoas com problemas reais. Não passam de ideologia mascarada de progressismo onde se confunde liberdade com igualdade e ciência com positivismo.
Não é meu hábito fazer afirmações que não possa fundamentar minimamente, especialmente quando estas dizem respeito à Igreja católica.
Em primeiro lugar é preciso começar por dizer que falar de democracia numa igreja é em si tão pertinente como falar de democracia numa empresa ou de democracia numa associação qualquer. É completamente absurdo falar da igreja como se nela estivesse contida toda a sociedade, como se na igreja existisse uma monarquia ou uma democracia tal como existe nos sistemas políticos dos respectivos países.
É que não é dentro da igreja que se luta por melhores condições de trabalho, ou por um melhor sistema de saúde, ou por poder livremente discutir ideias. Não é dentro da igreja que se faz greves ou manifestações, que se roubam pessoas ou que estas vão para a prisão. A igreja não regula o sistema judicial, nem o legislativo, nem o executivo. Ser o Bento XVI o Papa ou o António Borges não tem nenhum impacto na minha vida para além de mudanças doutrinais com as quais eu posso concordar ou não (mas que acataria de qualquer forma), mas que nada têm que ver com a minha vida em termos de bem-estar material ou de liberdades e garantias. As mulheres serem ordenadas ou não não altera nada na minha vida nem altera nada nas vidas das mulheres para além de passar a haver algumas a poderem dizer umas coisas nos púlpitos (que grande parte das pessoas já ninguém ouve) ou a celebrar sacramentos. Não me torna nem mais rico nem mais pobre.
É por isso absurdo querer transportar um sistema democrático que governa uma sociedade como um todo para a igreja. É que a grande virtude do sistema democrático é que gere as diferentes aspirações das populações de forma mais ou menos equilibrada. Aspirações muito concretas de uma vida melhor. Transportar isso para a igreja significa que o que se pretenderia gerir seriam visões ideológicas ou doutrinais opostas. E aí caros amigos, temos um exemplo muito claro do que acontece nessas situações. Completa e total fragmentação. É o caso protestante, em que as igrejas se vão sucessivamente fragmentando (tal e qual como partidos) quando novas personalidades surgem capaz de mobilizar algumas pessoas dentro de uma comunidade. "Dar o poder às bases" dá invariavelmente nisso, o que para os protestantes não tem problema porque têm uma visão eclesiológica completamente diferente, em que não têm problema com a pluralidade.
Não é o caso católico. Destruam a unidade da Igreja Católica e destroiem a sucessão apostólica e já nada destinguirá a Igreja Católica de uma igreja protestante (ou várias que é o que resultaria de dar o poder às bases). É que a Igreja Católica no Chile nada tem que ver com a portuguesa, ou esta última com a americana, ou com a alemã, ou com a chinesa. Dar o poder às bases implica a fragmentação, isto é um dado mais que adquirido (os protestantes sabem-no).
E ainda há mais. Para a Igreja Católica, como para a Ortodoxa, a Tradição tem um papel fundamental em termos doutrinais. Ao contrário das doutrinas protestantes, isto torna necessário a existência de uma camada de fieis especializada no conhecimento da mesma, que possa ser garante da manutenção desta mesma Tradição. Na Igreja Católica não se pode pura e simplesmente afirmar todo e qualquer postulado teológico sem ir aos 2000 anos de história analisar se este faria sentido ou não. E os bispos são a garantia viva da manutenção desta Tradição, é esse o seu Magistério e é essa a sua responsabilidade. Não se pode querer que outras pessoas tenham poder decisório sem serem ao mesmo tempo incumbidos desta responsabilidade, porque correríamos o risco de daí poder sair todo e qualquer disparate (como sai nas igrejas protestantes). E os bispos têm esta responsabilidade de forma quase sensitiva, porque foram ordenados em sucessão apostólica e portanto têm uma relação directa com os apóstolos.
Isto não quer dizer que os leigos não possam contribuir para o aprofundamento dos conteúdos da fé. Mas caro Miguel, quando é que isso não aconteceu? Leigos, mulheres e homens, sempre deram esse fundamental contributo. Desde Hildegard von Bingen e Catarina de Sena até a von Hildebrand passando por S. Francisco de Assis (é preciso não esquecer que este era um leigo e foi-o sempre até ao fim da vida) os exemplos são mais que muitos. Fizeram-no frequentemente e muitas vezes obrigando a hierarquia a reformular-se interiormente. Mas fizeram-no segundo o Evangelho, fizeram-no com humildade e fizeram-no começando por se reformar a si mesmos e dando o exemplo. E esssa possibilidade nunca nos foi negada. Simplesmente é mais fácil querer ir pelo caminho decisório directo.
Isto nada tem que ver com o mandamento do Amor tim. O que incomoda as pessoas é não terem poder decisório, algo de completamente contrário ao Evangelho que prega a humildade (e humildade não só para com os nossos contemporâneos como para com os que nos antecederam, e daí a importância da Tradição). Explica-me lá em que é que eu poder ter um papel na decisão da doutrina católica é "um acto de amor" para comigo? Em que raio é que o Amor se manifesta em qualquer um dos postulados que o AB enunciou? O que é que o igualitarismo redistributivo e social que defendes para a sociedade tem que ver com as instâncias de poder dentro da igreja?
Interroga-se a Zazie aqui nos comentários sobre a razão pela qual, do Mandamento do Amor, decorre que todos os homens são iguais.
Parece-me inútil fazer longas lucubrações teóricas porque a resposta é simples.
Os homens são filhos de Deus mas não são todos iguais. Tal como os filhos de um homem não são todos iguais.
Mas, qual é o Pai que, amando os seus filhos, todos os seus filhos, perante as diferenças de capacidades naturais entre os seus diferentes filhos, não regula as relações com (e entre) eles de modo a que todos tendam a ter os mesmos direitos e os mesmos recursos?
"Sempre no Evangelho de domingo está contido o ensinamento de Jesus que vale para todos: “Quem quer somente possuir a própria vida, tomá-la só para si mesmo, a perderá. Só quem se entrega recebe sua vida. Com outras palavras: só aquele que ama encontra a vida - destacou Bento XVI -. Com outras palavras: o amor requer sempre o sair de si mesmo, requer abandonar-se a si mesmo… Só o amor de Deus, que perdeu a si mesmo por nós entregando-se a nós, faz possível também para nós o ser livres, de deixar perder e, assim, encontrar verdadeiramente a vida”. (...) Meu grande predecessor na sede episcopal de Munique e Freising, o cardeal Faulhaber, expressou isso uma vez da seguinte maneira: «Dá à alma seu Domingo, dá ao Domingo sua alma». Precisamente porque no Domingo se trata em profundidade o encontro, na Palavra e no Sacramento, com o Cristo ressuscitado, o alcance deste dia abraça a realidade inteira… o Domingo é para a Igreja também a festa semanal da criação - a festa do agradecimento e da alegria pela criação de Deus. Em uma época na qual, por causa de nossas intervenções humanas, a criação parece exposta a múltiplos perigos, temos de acolher conscientemente inclusive esta dimensão do Domingo. Para a Igreja primitiva, o primeiro dia, depois, assimilou progressivamente também a herança do sétimo dia, o sabbat. Participamos do repouso de Deus, um repouso que abraça todos os homens. Assim percebemos neste dia um pouco de liberdade e da igualdade de todas as criaturas de Deus”.
[13h15] Perder tempo, era noutro sentido (vê como treslê): era perder tempo a explicar aquilo que nunca vai aceitar, porque a Zazie nunca aceita a opinião dos outros.
E perdi pouco tempo, veja lá, num fim-de-semana passado a trabalhar, sem tempo para a família, amigos ou o lazer. Mas perdi cinco minutos a escrever uma adenda aos seus pedidos. Mais um minuto a pôr um post, e outros a cinco a actualizar para responder a 5-cinco-5 comentários seus. Como vê não perdi tempo, roubei-os num instantinho ao patrão. E agora roubo ao meu almoço, pode ser?!
Sobretudo não tenho tempo para ir pesquisar, escrever demoradamente, porque nos seus 50 comentários diz muita coisa que não é verdade e que não escrevi e não está no texto de Anselmo Borges. Para si, desejamos o fim da Igreja, de Roma, somos anarco-fundamentalistas-islâmicos, que gostamos de orgias para obrigar as mulheres a abortar. (Posso caricaturar assim?, foi como me senti a ler as coisas todas que disse.)
E perco agora tempo. Para que não se ria, porque gosta muito de atacar os outros, mas depois diz que não fulaniza, está apenas a discutir ideias. Disse-lhe que as suas ideias são historicamente, teologicamente e eclesiologicamente arrogantes, porque as define como únicas e verdades feitas. Que eu saiba, a História, a Teologia e a Eclesiologia não ciências exactas. A não ser na cartilha de Zazie.
Mais tempo: Anselmo Borges não quer a destruição da Igreja, como é óbvio. Nem eu. Queremos transformá-la para melhor, desejamo-lo. E queremos fazê-lo por dentro, claro está, porque somos católicos apostólicos romanos. Aliás, acho graça a esta pulsão bloquista da Zazie: gosta muito de comentar a vida ad intra de uma instituição que não é a sua, e que é (peço desculpa, vou ser arrogante) visceralmente minha. Não gosto de quem põe em causa a minha fé, escudando-se em verdades pretensamente históricas ou eclesiais.
Com tempo: a democracia é um sistema integrado em muitas coisas quotidianas da Igreja. A própria eleição do Papa, sacrilégio!, faz-se por votos e maiorias. O que AB e eu defendemos e queremos é que o exercício da democracia seja mais verdadeiro e concreto no dia-a-dia da Igreja. Vai matar a Igreja? Sim, sim, os absolutistas e os monárquicos também o diziam. Claro que não mata a Igreja!
[A monarquia é absoluta? Um regime monárquico é tendencialmente absolutista, mesmo que adocicado. Mas que dizer de uma democracia como a inglesa que sustenta os luxos e vícios de uns quantos senhores e senhoras, apenas por estes terem nascido em determinados palacetes?!]
Logo, a monarquia na Igreja foi perniciosa, ao longo dos séculos, com papados muito infelizes. Hoje, o Vaticano pode ter uma prática mais democrática no exercício de representatividade, como instituição política e religiosa, do Povo de Deus: colocando mais e mais homens e mulheres, leigos e leigas, na discussão e na concretização das propostas de evangelização da Igreja, na praxis diária do exercício do múnus de cada um. Eu não sou menos que o Papa. Uma mulher não é menos que um padre. E os exemplos não se esgotam.
Desejo a ordenação das mulheres. Sim, não vejo porque não. Não há razões eclesiológicas, nem teológicas suficientes, nem bíblicas, para o contrariar.
Mas para Zazie, o problema de AB (e por arrasto o meu), é este: «Tudo começa com um equívoco. Hoje, quando se fala da Igreja, é numa gigantesca instituição e nos seus altos e médios hierarcas que de facto se pensa: Papa, bispos, padres. Já se esqueceu que, no princípio, não era assim, pois Igreja significava a reunião das Igrejas, entendidas como assembleias dos cristãos congregados em nome de Jesus.» É a pura das verdades: hoje, alguém de fora quando fala da Igreja ataca a posição do Papa sobre o preservativo, o silêncio do Vaticano sobre a ditadura tal, ou o bispo que aprendeu mais em 15 minutos do que em 67 anos. É escusado ao católico discutir com alguém de fora, da mais valia do trabalho de centenas de missionários no combate à sida em África, no papel clandestino de tantos e tantas contra ditaduras ou que a sexualidade é uma coisa única, belíssima, e não um pecado ou anátema que se abate sobre as pessoas. Dizer pois que ao princípio não era assim, está a explicar-se que hoje «a fé está mais dirigida ao dogma do que à pessoa de Jesus e ao Deus salvado», esquecendo «a Igreja enquanto comunidade dos fiéis a Cristo, que caminha na fé e na tentativa de actualizar no mundo o reinado de Deus a favor de todos os homens e mulheres, sobretudo dos mais pobres e abandonados, [sublinhando] sobretudo uma Igreja-instituição, hierarquizada e poderosa». Isto é muito diferente do fim do papado que leu ali.
Ainda isto. O dogma do Amor não está na lista burocrática de dogmas. Deve estar presente na vida de cada um de nós. Só assim, como dogma, experimentado dogmaticamente, faz sentido...
Mas de resto, não a tenho de convencer nem converter, nunca foi essa a minha atitude. Daí não me achar arrogante. Mas não tenho nada que defender-me do que nunca disse. (Quantas vezes disse isto?) Vivo a minha fé com a convicção de fazer um mundo melhor. Utopia, fé, ideologia? Chame-lhe o que quiser. É nisto que acredito.
Sem mais tempo. Posso dizer muito mais. Mas não vale a pena, foi esse o meu desabafo. Porque na discussão do aborto (que voltou a lembrar repetidas vezes, sem que fosse esse o objecto do texto de AB) sei como dirigiu a discussão entre os seus "50 comentários vs. os meus 4". É para isto que não tenho tempo. Fim de argumentação.
O Mandamento do Amor, o único Mandamento do Cristianismo (catequizando a Zazie - 1)
"O mandamento que o Senhor nos deu, o único mandamento que nos deu, foi precisamente esse: 'O meu mandamento é este: Que vos ameis uns aos outros como eu vos amei (Jo 15 12)'. Ele só nos deu este mandamento."
(João César das Neves, "Parábolas sobre Jesus", Principia, pags. 102/103)
[Actualizo, depois de ler os cinco comentários deixados por Zazie: julgo, como o Timshel escreveu nos comentários a outro post, que leu no texto de Anselmo Borges, nas minhas adendas breves (de quem não tem tido tempo quase nenhum para a acompanhar nos extensos comentários), coisas que não podem ser lidas. As afirmações que me atribui é de quem tresleu muita coisa e há uma arrogância de verdade histórica e (pasmo) teológica e eclesiológica que não conseguiria desconstruir, por me faltar tempo, mas por já ter discutido en passant assim consigo. Não me repito, mas o meu regresso (malgré Nunoggard) a este blogue foi com a promessa de deixar escritos os posts e não comentar comentários. Faço-o apenas porque me acusa de intolerância e cobardia. Mas também não tenho de comentar uma intencionalidade que dá às minhas palavras - e já agora às de Anselmo Borges, de quem conheço bem os escritos e o pensamento -, e de tão absurdas são as conclusões que tira, que não vou perder mais tempo. Tome-me como arrogante, não sou. Não tenho é que explicar o que nunca escrevi.] Miguel Marujo
«Deve ser mesmo a mão de Deus que nos tem guardado desta malta nas hiearquias superiores da Igreja. Graças a Deus por um João Paulo II e graças a Deus por um Bento XVI.» [Antonius em comentário ao texto de Anselmo que subscrevo a 100 por cento. Mas sou eu, bem sei, O errado, o apóstata, o herege.]
Actualize-se, a pedido: a minha Igreja vive da terra, mergulha nas coisas dos dias das pessoas, vive e mora nos rostos dos desempregados ou aflitos, assenta na convicção que a democracia é o melhor de todos os sistemas com excepção de todos os outros, não tem medo de se embrenhar no quotidiano, fugindo do misticismo ou da filosofia, não porque os desdenhe, mas sim porque faz deles prática de vida, estilo de vida, modo de vida. Prefiro uma Igreja socialmente comprometida, do que uma Igreja amorfa ou a discutir -ismos sem se afirmar coerente no dia-a-dia. A incoerência de práticas que chutam a Igreja para fora do mundo, quando são homens e mulheres que todos os dias vivem no Mundo que são e fazem Igreja. Acredito numa Igreja sem hierarquia (termo dispensado pela eclesiologia do Vaticano II - ou será que infelizmente houve Vaticano II?), em que todos somos irmãos, uns chamados ao serviço pelo sacerdócio, seja como presbíteros, monges ou bispos, outros, muitos, muitos mais aliás, chamados como leigos, que servem sem outras pretensões a sua fé. Isto não é ideologia, nem é transformar a religião em ideologia. Isto é viver a minha fé, convictamente, de acordo com o meu tempo, porque sou deste tempo, deste mundo, deste reino. Não há nenhuma vitimização minha, duvido que valha a pena qualquer explicação minha, apenas isto.
«Tudo começa com um equívoco. Hoje, quando se fala da Igreja, é numa gigantesca instituição e nos seus altos e médios hierarcas que de facto se pensa: Papa, bispos, padres. Já se esqueceu que, no princípio, não era assim, pois Igreja significava a reunião das Igrejas, entendidas como assembleias dos cristãos congregados em nome de Jesus.
Foi com Constantino e Teodósio que tudo se modificou, quando o cristianismo se tornou religião oficial do Estado e a Igreja acabou por transformar-se numa instituição de poder. Desde então, de um modo ou outro, espreitou o perigo de esquecer a Igreja enquanto comunidade dos fiéis a Cristo, que caminha na fé e na tentativa de actualizar no mundo o reinado de Deus a favor de todos os homens e mulheres, sobretudo dos mais pobres e abandonados, para sublinhar sobretudo uma Igreja-instituição, hierarquizada e poderosa. Quem congrega é menos Jesus do que a hierarquia, e a fé está mais dirigida ao dogma do que à pessoa de Jesus e ao Deus salvador.
Depois, tenta-se o diálogo da Igreja com o mundo. Mas que pode entender-se por isso? Também a Igreja não é de facto mundo, embora mundo a partir de uma determinada visão? Pertencemos todos ao mesmo mundo, ainda que a partir de visões múltiplas e diversas. Mas, mesmo no pressuposto do diálogo, ele torna-se difícil, já que houve rupturas quase insanáveis. Pense-se, por exemplo, que até à década de 60 do século passado se manteve o Índex, isto é, o catálogo dos livros cuja leitura era proibida aos católicos. Aí figuravam não só muitos teólogos, mas também os pais da ciência e da filosofia modernas, figuras eminentes da história, da literatura e do direito: Copérnico e Galileu, Descartes e Pascal, Bayle, Malebranche e Espinosa, Hobbes, Locke e Hume, também Kant, evidentemente Rousseau e Voltaire, mais tarde, John Stuart Mill, Comte, os historiadores Condorcet, Ranke, Taine, igualmente Diderot e D'Alembert com a Encyclopédie e até o Dictionnaire Larousse, os juristas e filósofos do Direito Grotius, Von Pufendorf, Montesquieu, a nata da literatura moderna, de Heine, Vítor Hugo, Lamartine, Dumas pai e filho, Balzac, Flaubert, Zola, a Leopardi e D'Annunzio, entre os mais recentes, Bergson, Sartre e Simone de Beauvoir, Unamuno, Gide. Com o fim do Índex, não terminaram as censuras a dezenas de teólogos, entre os quais Hans Küng, Leonardo Boff, J. Masiá, Jon Sobrino. Como se a Igreja vivesse sob o reflexo do medo de quem ousa pensar.
As dificuldades são diversas, tanto ao nível da doutrina como da própria organização. O mundo moderno pôs em causa o princípio da simples autoridade vertical, mas a Igreja tem dificuldade em aceitar a dúvida e argumentar. Ao princípio da democracia a Igreja contrapõe uma monarquia absoluta. Na sociedade civil, aos dirigentes aplicam-se denominações funcionais: ministros, reitores, directores, mas, na Igreja, o Código de Direito Canónico continua com categorias quase ontológicas: são "superiores" e até "superiores maiores", o que implica que os outros são "inferiores". Jesus tinha dito: "sois todos irmãos". Mal um padre é nomeado bispo fica o seu nome próprio precedido de "Dom", abreviatura de "Dominus" (senhor), título senhorial antiquado. Dificuldade maior é a reconciliação com o corpo, com a sexualidade e com as mulheres na sua igualdade com os homens. Do ponto de vista doutrinal ainda hoje causa espanto que o padre Teilhard de Chardin, o cientista que tentou conciliar a fé com uma concepção evolucionista do mundo, continue sob suspeita. Mas como se pode proclamar ainda, no quadro da evolução, a visão tradicional de Adão e Eva e do pecado original? Como é concebível que dois seres apenas semiconscientes tenham cometido um pecado que estaria na origem de todo o mal do mundo? Como é possível continuar a transmitir a ideia perversa de que Deus descarregou sobre o seu Filho na cruz toda a sua cólera, reconciliando-se desse modo com a Humanidade? Este é o nervo da questão: acredita-se, sinceramente, por palavras e obras, que Deus é Amor?»
Sobre este post parece-me que a questão nem é bem essa.
Os evangélicos são o protestantismo possível neste tempo. O protestantismo luterano está morto e enterrado, e só nas admirações/fantasias que os povos mediterrânicos sempre tiveram pelo suposto "despojamento" e arcaboiço intelectual do dito cujo é que ele ainda tem qualquer tipo de projecção. Não tenho qualquer tipo de fantasias quanto ao protestantismo luterano (até porque o conheci), aquela esterilidade e falta de devoção física e de acção do espírito não se poderia aguentar durante muito tempo. E não aguentou. Aliás repare-se que não foi o protestantismo luterano que evangelizou a América do Norte (pelo menos na sua forma pura, a grande misturada que é a Igreja Episcopal ou Anglicana não se pode propriamente apelidar de luterana). A capacidade de proselitismo de Lutero foi nula, e a sua vivência religiosa corresponde a uma condenação ao definhamento do cristianismo (o cristianismo está completamente moribundo em qualquer país de tradição puramente luterana e as igrejas luteranas nesses países estão bem mais aflitas do que qualquer crise de vocações católica pode fazer crer).
Os responsáveis pela evangelização protestante foram em muito maior grau os elementos das comunidades religiosas puritanas que sistematicamente cortavam com a Igreja Anglicana ou a Luterana (e donde descendem historicamente os nossos amigos protestantes aqui ou pelo menos alguns deles). E esses sim tinham uma vivência da fé mesmo assim mais próxima do catolicismo, mais carnal, mais visceral. Essa é a condição fundamental para o sucesso da evangelização.
É achar que encontrar a Deus não implica encontrar a sua Cruz, e que a sua Cruz também é (como tão bem disse o josé) depararmo-nos com estados de espírito completamente avessos à fé que desejaríamos manter.
Falei de ideologia porque a ideologia é estática. Se eu acreditar em Deus como quem acredita no capitalismo (ou noutra coisa qualquer) então posso andar sempre a reconhecer no mundo todos os sinais da presença de Deus e cheio de vivências e alegrias. Mas são o tipo de alegrias parecidas às dos entusiasmados pelo mercado liberal que se maravilham constantemente com "a capacidade de reinvenção da sociedade capitalista, da resolução espontânea e não programada de problemas por parte dos agentes individuais do mercado". A ideologia encontra sempre pretextos para se confirmar a si própria, e como não compromete verdadeiramente, pode manter-se assim. As alegrias tornam-se essencialmente em buscas obcecadas de sinais que confirmem a ideologia que perfilhámos.
Coisa bem e totalmente diferente é a fé ser uma relação. Uma relação implica que está tudo sobre a mesa, rigorosamente tudo. E isso implica que haverá vezes em que nada parece fazer sentido, em que a nossa crença parece um tremendo absurdo ou uma enorme ingenuidade, em que suspeitamos que o tipo do lado que não a perfilha e que não tem "os nossos condicionalismos" se calhar vive muito mais feliz, em resumo, uma relação em essência. E essa implicará sempre a convivência com estes sentimentos e a sua resolução (ou pelo menos o assumir que eles existem). Não é deleitarmo-nos neles, ou ter até um certo prazer insidioso nestes "dramas e lutas interiores". É pura e simplesmente assumir que eles existem, porque sim, porque é da natureza das coisas (e concordo até com o Tiago na Voz do Deserto quando adivinha que a coisa será do demo). Caso contrário estamo-nos a alegrar com o vazio e a tentar a todo o custo tapar o buraco com uma histeria perigosa. Com o risco de a coisa ser toda muito angélica até ao dia em que dá fortemente o berro.
Isto não implica claro está que se deva viver em grande estado de suspensão teleológica ou dúvida existencial. Se a fé for saudável e constituir uma relação salutar com Deus, será sempre cheia de grandes alegrias e profundas vivências. Esse não era no entanto o âmbito do post.
Será que o que nos une é a fé e o que nos separa é a religião?
*Assim também a fé cristã, se não se traduzir em actos, é morta em si mesma. (da carta de S. Tiago denominado por Erasmus capítulo 2, v 17)
*religião - do Lat. religione, s. f., - culto prestado à divindade; - crença na existência de uma ou mais forças sobrenaturais; - reverência às coisas sagradas; - observância dos preceitos religiosos; - doutrina, sistema religioso; - ordem religiosa (do dicionário online da Priberam)
como diria o inefável reverendo Padre Vaz Pinto. É que tu, ó caríssima e insidiosíssima zazie, tu tens aí um um ponto muito interessante. Há muito que ando com dúvidas sobre se os evangélicos, na sua versão chã, bem como todos os pentecostais, ainda podem ser considerados como protestantes. Nem vejo porque não serão já eles todo um ramo individual do Cristianismo. Passaríamos assim a ter os católicos, os ortodoxos, os protestantes e agora os anabaptistas. Chamemos-lhe isso para lhes reter a designação original, o seu ponto de saída do protestantismo rumo aos States e a tudo o resto. Serão eles mais scofieldianos do que luteranos? Por amostragens recentes dir-se-ia que, pelo menos tendencialmente, sim. Aceitam-se opiniões.
O texto do Antonius é um belo texto. Deveria ser lido com muita atenção pelos evangélicos protestantes daqui e não só. Só peca por algum excesso de catolicismo. Conto voltar a ele mais tarde.
Y a este dogma central de la resurrección en Cristo y por Cristo, corresponde un sacramento central también, el eje de la piedad popula r católica, y es el sacramento de la Eucaristía. En él se administra el cuerpo de Cristo, que es pan de inmortalidad.
Es el sacramento genuinamente realista, dinglich, que se diría en alemán, y que no es gran violencia traducir material, el sacramento más genuinamente ex opere operato, sustituido entre los protestantes con el sacramento idealista de la palabra. Trátase, en el fondo, y lo digo con todo el posible respeto, pero sin querer sacrificar la expresividad de la frase, de comerse y beberse a Dios, el Eternizador, de alimentarse de Él. ¿Qué mucho, pues, que nos diga santa Teresa que cuando estando en la Encarnación el segundo año que tenía el priorato, octava de san Martín, comulgando, partió la Forma el padre fray Juan de la Cruz para otra hermana, pensó que no era falta de forma, sino que le quería mortificar, «porque yo le había dicho que gustaba mucho cuando eran grandes las formas, no porque no entendía no importaba para dejar de estar entero el Señor, aunque fuese muy pequeño el pedacito»? Aquí la razón va por un lado, el sentimiento por otro. ¿Y qué importan para este sentimiento las mil y una dificultades que surgen de reflexionar racionalmente en el misterio de ese sacramento? ¿Qué es un cuerpo divino? El cuerpo, en cuanto cuerpo de Cristo, ¿era divino? ¿Qué es un cuerpo inmortal e inmortalizador? ¿Qué es una sustancia separada de los accidentes? ¿Qué es la sustancia del cuerpo? Hoy hemos afinado mucho en esto de la materialidad y sustancialidad; pero hasta Padres de la Iglesia hay para los cuales la inmaterialidad de Dios mismo no era una cosa tan definida y clara como para nosotros. Y este sacramento de la Eucaristía es el inmortalizador por excelencia y el eje, por lo tanto, de la piedad popular católica. Y si cabe decirlo, el más específicamente religioso.
Porque lo específico religioso católico es la inmortalización y no la justificación al modo protestante. Esto es más bien ético. Y es en Kant, en quien el protestantismo, mal que pese a los ortodoxos de él, sacó sus penúltimas consecuencias: la religión depende de la moral, y no esta de aquella como en el catolicismo.
No ha sido la preocupación del pecado nunca tan angustiosa entre los católicos, o por lo menos, con tanta aparencialidad de angustia. El sacramento de la confesión ayuda a ello. Y tal vez es que persiste aquí más que entre ellos el fondo de la concepción primitiva judaica y pagana del pecado como de algo material e infeccioso y hereditario, que se cura con el bautismo y la absolución. En Adán pecó toda su descendencia, casi materialmente, y se transmitió su pecado como una enfermedad material se transmite. Tenía, pues, razón Renán, cuya educación era católica, al resolverse contra el protestante Amiel, que le acusó de no dar la debida importancia al pecado. Y, en cambio, el protestantismo, absorto en eso de la justificación, tomada en un sentido más ético que otra cosa, aunque con apariencias religiosas, acaba por neutralizar y casi borrar lo escatológico, abandona la simbólica nicena, cae en la anarquía confesional, en puro individualismo religioso y en vaga religiosidad estética, ética o cultural.
Excerto de La esencia del catolicismo, capítulo IV da opus magnum de Unamuno, Del sentimiento tragico de la vida e que me parece abordar com clarividência os temas que o josé e o timshel levantaram recentemente.
O Antonius regressa muito bem mas com algum wishful thinking. Quando fala em "relação com o Senhor" esquece as palavras de Jesus que dizem: "Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando (Jo.15:14)". Que é como quem diz, o voluntarismo conta para alguma coisa. Acusar-nos de "visão superficial da fé" é no mínimo insultuoso para quem vive constantemente mudado por "uma proposição à qual se adere". Já o problema da igreja Católica não ter este tipo de amendoins éticos cumpridos pelos seus fiéis (veja-se o caso da sexualidade) é transmitir a ideia que só os patetas, feios e socialmente desocupados podem levar a sério o que diz. Se é que que Cristo lhes pode dizer algo além da "beleza dos sacramentos".
Dah, tipo vai buscar? (o terrorista nunaggardiano só treslê o que lhe apetece)
«Amai-vos uns aos outros como eu vos amei»... mas melhor mesmo é ir matar uns maometanos lá para o Iraque.
(ou de regresso ao Velho Testamento, que também dá para o outro lado: «Não usarás de violência contra o estrangeiro residente nem o oprimirás, porque foste estrangeiro residente na terra do Egipto», Ex 22, 20)
Paz à alma de quem é O iluminado. O Reino da soberba será seu.
Meu, e onde no Corão aparece um Messias redentor que cumpra Ele mesmo a toda a Lei e limpe da condenação pelo pecado a humanidade que nEle creia?
'Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito. Porque a lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou da lei do pecado e da morte, porquanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne, para que a justiça da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito' (Rom8:1-4).
«abada* apologética por responder te adie o prazer de ter a última palavra às 2h da manhã para os despertantes do dia seguinte acordarem com a bola retórica do teu lado.»
Ó carago (interjeição nortenha que marca a minha identidade), lá está o Haggard com a mania de que os terroristas são sempre os outros (adoradores fatimistas) e de que o Martim Moniz é um antro de Bin Ladens (quantas vezes passa o gajo no Martim Moniz, sem ser de metro, e se demora a escolher as especiarias para uma boa carilada?!). Não tenho prazer nenhum em combater o Haggard ou o Ahmadinejad, e as duas da manhã é mesmo a hora a que chego depois de um Mourinho despedir-se e atrasar o fecho do jornal. Mas fica lá com a bola de berlim e o bife de caril, ó special one da verdade evangélica!
* - da abada que levei deve ter sido como no râguebi: perdi por tantos que gostei.
«Tomámos, então, todas as suas cidades e votámos à destruição todas as cidades, homens, mulheres e crianças, sem deixar um sobrevivente.» (Dt 2, 34)
«E quando o Senhor, teu Deus, a entregar nas tuas mãos, passarás todos os seus varões ao fio da espada. Só poderás tomar para ti as mulheres, as crianças, o gado e o que se encontrar na cidade, todo o seu espólio; comerás dos despojos dos teus inimigos, que o Senhor, teu Deus, te deu. Procederás assim para com todas as cidades muito afastadas de ti, que não fazem parte das cidades destas nações. Só das cidades destes povos, que o Senhor, teu Deus, te há-de dar por herança, é que não deixarás nelas alma viva.» (Dt 20, 13-16)
«Votaram-na ao anátema, passando ao fio da espada quanto nela encontraram, homens e mulheres, crianças e velhos, e os bois, as ovelhas e os jumentos.» (Js 6, 21)
Etc.
Moral da história: ainda aguardo o apedrejamento de uma mulher adúltera na arena nunaggardiana.
'Dalai Lama vergou-se com os maometanos adeptos de caril (facto)'. 'Outra questão é o termo 'maometano'. Designa o crente em Maomé. Não uma raça. Contudo, se certo leitor subentende que todo o maometano é de certa raça (que não especifico), então demonstra um pré-conceito racial, isto é, racismo'.
Cf.
'O caril é uma mistura de especiarias muito utilizada na culinária de países como Índia, Tailândia e alguns países asiáticos'. '81, 5 por cento da população da Índia são hindus'.
Está explicado o estereótipo do maometano segundo Miguel: são todos hindus indianos comedores de frango de caril.
CONCLUSÃO MORAL: Não deixes que uma abada apologética por responder te adie o prazer de ter a última palavra às 2h da manhã para os despertantes do dia seguinte acordarem com a bola retórica do teu lado.
Nuno Fonseca
[Post-Scriptum: clicai aqui para a receita do bife de caril islâmico e além para a massa de caril muçulmana.]
«O caril é uma mistura de especiarias muito utilizada na culinária de países como Índia, Tailândia e alguns países asiáticos. Este condimento é feito à base de pó amarelo de açafrão-da-índia (curcuma), cardamomo, coriandro, gengibre, cominho, casca de noz-moscada, cravinho, pimenta e canela. (...). Inicialmente o caril servia para temperar exclusivamente o arroz, mas actualmente é usado para a confecção de inúmeras receitas, como o frango de caril, etc.» [in Wikipédia]
'O simples dá crédito a cada palavra, mas o prudente atenta para os seus passos'. 'A boca do tolo é a sua própria destruição, e os seus lábios um laço para a sua alma'. (Pro14:15; 18:7).
Miguel, o ler-se levianamente parece-me ser ainda mais grave. A frase é: 'o pacifista tibetano vergou o joelho e adorou Alá, junto com os mais maometanos adeptos de caril e terrorismo'.
Explanação:
Dalai Lama vergou-se com os maometanos adeptos de caril (facto) e terrorismo (por provar). Não sendo maometano e sendo descrito na frase como 'pacifista', decerto não aprecia terrorismo, mas o seu gosto por caril é aqui omisso. Contudo, todo o maometano é crente duma fé terrorista que inspira ao genocídio do incrédulo ou apóstata segundo o Corão, que assim reza:
'Lembra-te que o teu Senhor inspirou os anjos com esta mensagem: 'Eu sou contigo: mostra firmeza para com os crentes, e eu encherei de terror os corações dos incrédulos -- Flagelai-os sobre os pescoços e cortai-lhes todas as pontas dos seus dedos' (Corão 8:12).
'A única recompensa para aqueles que encetam a guerra com Alá ao Seu mensageiro e praticam corrupção na terra será a de virem a ser chacinados ou crucificados, ou haver decepados as suas mãos e os seus pés e as suas mais extremidades, ou serem arrastados da terra' (Corão 5:33-34).
'Mas para aqueles que descrêem, vestes de fogo lhes serão ataviadas, água escaldada lhes será vertida sobre as cabeças. E assim tudo sob os seus ventres e sobre as peles será cozido. Para estes, ganchos de ferro em vara' (Corão 22:20/2).
'Preparados para o incrédulo estão a corrente, o aguilhão, o fogo ardente' (Corão 76:4).
Etc.
Assim, fica o terrorismo do maometano provado. O caril, esse, é irrelevante para a fé do maometano, porque se trata dum elemento gastronómico que ele aprecia muito, mas sim, com a mesma leviandade do genocídio dos incrédulos.
Outra questão é o termo 'maometano'. Designa o crente em Maomé. Não uma raça. Contudo, se certo leitor subentende que todo o maometano é de certa raça (que não especifico), então demonstra um pré-conceito racial, isto é, racismo. Anteriormente se revela que este está 'espiritualmente não longe do Martim Moniz', bairro lisboeta com população maometana densa (que raça?), por se encontrar numa mesquita (com população maometana densa).
A referência a Dalai Lama advém não da partilha da fé maometana, pois não é islâmico, mas da oportunidade fotográfica que a sua fisionomia vergada em direcção a um ídolo, a cidade de Meca, não dispensou, nem achou hipócrita. Dalai Lama não crê que Alá é o único deus verdadeiro, nem que Meca é a sua cidade santa. Então porque se vergou?
É com ele.
Em todo o caso, nós concristãos, bem sabemos que não devemos comungar em rituais hereges (Êx20:30), nem venerar ídolos (Rev22:15).
(ou quando os argumentos se viram contra o que se escreve levianamente, para não dizer estupidamente, ou lançar o opróbio aos outros está bem, mas aos meus, é melhor não)
A espiritualidade newage-ista não só é vácua, mano, mas insidiosa e nociva.
Certa amiga, com quem me envolvia em discussões apologéticas nas mais tardas horas, dizia-se um deus, reencarnado desde milénios, e que sabia ela mesma o que era o Bem e o Mal, não necessitando do Deus da Escritura, e de invocar o nome de Jesus, e de experimentar o Espírito para a sua santificação, essa que ela não achava necessitar.
Hoje vive feliz, esse deus. Com os seus vícios de heroína, haxixe, e um curso de Letras a meio, fruto dum cérebro 'estupefacientado'.
O New Age é um budismo gnosticista mas sincrético, absorvendo todas as fés, marcas de incensos, tai-chis, e CDs com sons de baleia necessários para o cumprimento de Gén3:3-5, enchendo de alegria o coração hippie do Leviatã.
Caro josé, como podem os nossos amigos evangélicos saber do que falas quando não são confrontados todos os Domingos com a tibieza da sua fé? Quando não lhes é pedido que acreditem num milagre que acontece diante dos seus olhos, sem no entanto haver qualquer manifestação visível do mesmo? E basta ver o comentário da Hadassah ao teu post para perceber até que ponto a noção evangélica da fé é nominal e dada a categorias, o que a torna terrivelmente mais próxima de uma ideologia do que duma vivência. Para estes a fé é algo basicamente do foro de uma proposição à qual se adere ou não, um postulado que “aceitamos ou recusamos”, pois há que “aceitar Jesus Cristo no nosso coração e seremos salvos”. A angústia derivada do silêncio de Deus é para eles uma obscenidade porque têm da fé uma visão essencialmente de opção humana voluntariosa. Curiosamente o voluntarismo que criticam nos católicos face ao valor das obras para a salvação, possuem-no exactamente no que diz respeito à fé. A fé deixa de ser uma vivência, regida pelas leis profundas e ignotas que pautam a nossa interioridade, para ser uma tomada de posição fundamentalmente ideológica (e por isso também não vê a Beguina grandes problemas na mistura com o marxismo, porque se põem as duas coisas no mesmo plano).
Ora um católico sabe que a fé é essa enorme graça que nos faz estar em relação com o Senhor, fundamental e singelamente em relação. E como todas as relações, implicam a dor da ausência e a alegria da presença e se formos honestos connosco mesmos, ambas existirão abundantemente. E precisamente porque o sabe é que não faz depender do seu estado de espírito per se a sua salvação, porque não confunde estado de espírito com fé, alegrias exteriores com relação na interioridade com Deus. E é por isso que as obras adquirem mérito, porque prefiguram movimentos interiores de adesão a Deus, e é por isso que reconhece e institui os sacramentos. É que a beleza dos sacramentos está toda na sua natureza ex opere operato, na sua natureza intrínseca de milagre não dependente do estado de espírito do celebrante ou do que dele recebe os frutos. O pão e o vinho transformam-se no Corpo e Sangue de Cristo independentemente dos méritos ou desméritos do sacerdote. São o Corpo e Sangue de Cristo mesmo que ninguém naquela assembleia acredite nisso ou esteja com a disposição interior para o sentir muito vivamente. E mais belo ainda, se tomares o Corpo e o Sangue de Cristo na Missa, ainda que não estejas a louvar o Senhor nas alturas, é da santa doutrina da Igreja que estes não deixam de fazer efeito em ti. É isto que escandaliza a fé superficial do evangélico que chama fé a uns estados de espírito muitas vezes auto-induzidos, que suprimiu a enorme lacuna de materialidade que existia no protestantismo clássico com uma horrorosa caricatura de curas mágicas e exorcismos baratos.
É interessante notar que todos os grandes artistas que vieram do mundo protestante (tradicional, não este evangelismo do século XX) se preocuparam sempre muito com a fé materializada e em adensar a visão superficial da fé que era apanágio do meio. Kierkegaard sabia o quanto se ia “para além da fé”, Kaj Munk o quanto ela implica a corporeidade. E basta ver A Luz de Inverno do Bergman para ver a relação que o cineasta constatou entre o grande sacramento e o silêncio de Deus (é mesmo das missas mais excelentemente filmadas que conheço no cinema).
Termino com o grande Unamuno que citaste (outro que nos faz sempre confrontar-mo-nos com a diferença abissal de nível que existe entre o nosso catolicismo e o catolicismo espanhol) mas num segundo post que este já vai longo.
'Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina. Mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências. E desviarão os ouvidos da Verdade, voltando às fábulas' (2Tim4:3/4).
Nuno Fonseca [Post Scriptum: Na mesquita de Lisboa, não espiritualmente longe do Martim Moniz, o pacifista tibetano vergou o joelho e adorou Alá, junto com os mais maometanos adeptos de caril e terrorismo, que então, de testa sobre o solo, frente ao Este, louvaram a sua terra prometida. Que ou é Meca, ou o Inferno.]
(Estava eu numa de low profile, tentando fade into de wallpaper bloguiano, quando me chamam de novo para aqui.) Os milhões que o comunismo matou na antiga União Soviética (mais do que as câmaras de Hitler), e os milhões que passaram pelos Glavenoe Uporavlenie Lagerei (GULAG)- não podemos branquear - mas são feitos dos mesmos ideais mortíferos das cruzadas e das lutas protestantes pós-reforma: Massificação, uniformização, domínio. Quanto mais instucionalizada é uma convicção, mais perigos corre de fazer mal.
Nunca votaria na CDU para governar Portugal. Porque as suas crenças absolutas trariam a falta de liberdade (os absolutos são normalmente totalitários). Só Jesus pegou em absolutos e os transformou em algo absolutmente livre e libertador. No entanto muito dos discursos dos profetas dos Antigo Testamento têm no seu ventre a luta por um mundo (aqui na terra) justo e equitativo. Mas a grande diferença entre o comunismo e o cristianismo é que no comunismo todos têm que ser pobres, é um aparelho estatal que deve distribuir a riqueza, a justiça vem de cima para baixo e não há esperança para o além.
No cristianismo todos são chamados a ter o pão de cada dia, e a distribuirem entre si o que têm. A justiça é partilhada e distribuída horizontalmente, não há capatazes (grande câncro do sistema sovietico) somos todos realmente irmãos. A pobreza não é condição suficiente (como na teologia da libertação) para a salvação. A riqueza não é em si um pecado, mas cada um - e não um sistema - é responsável pelo bem estar do outro.
O comunismo é sistema, o cristianismo é humano. No comunismo a responsabilidade é diluída e entregue a uma entidade sobrehumana, no cristianismo a responsabilidade é individual: eu sou responsável pelo bem estar do meu irmão, do meu vizinho, do estranjeiro.
Não podemos demonizar pessoas que muitas vezes são das poucas que realmente lutam e dão voz aos mais pobres. E não podemos pensar que o nosso cristianismo é sem falha ou culpa, porque de facto cada um de nós cuida do seu quintal e esquece-se a responsabilidade por todo a criação. Quando os cristãos não agem de acordo com o mandato cultural que recebemos de Deus: cuidar da criação, outros - não em nome de Jesus, mas em nome da dignidade humana - tomam a tarefa nas suas mãos. Nós gostaríamos de pedir fogo do céu para os consumir, Jesus disse: Deixem-nos estar! Pelos vistos se estão a cuidar dos mais pobres não são contra Jesus... A Beguina
Este post da Beguina levanta questões interessantes. Pessoalmente, custa-me muito perceber, não percebo mesmo, como um cristão pode ser comunista. As boas intenções, as promessas, o esquema perfeito traçado em teoria, não chegam para lavar as mãos de tantas experiências falhadas. Como se pode apoiar uma ideologia que, invariavelmente, quando foi concretizada, perseguiu e matou milhões de irmãos na fé e conduziu os povos à miséria? Não percebo. Aliás, o mesmo se passa com os cristãos que, na Alemanha nazi, apoiaram o nacional-socialismo de Hitler. Mas a verdade é que, como aponta a Beguína, Cristo transcende, e muito, a ideologia. Mesmo que não compreenda, e para além de considerações sobre o grau de fé e outras condicionantes, a evidência impõe-se: a fé cristã não tem espartilhos. Nem ideológicos, nem eclesiásticos, nem filosóficos, nem nada. Mais ainda. Pelo que vou conhecendo, Cristo trabalha na pluralidade. Ou seja, o Espírito Santo pode guiar dois cristãos a caminhos diversos no cumprimento da mesma vontade de Deus. (Atenção. Isto não tem a ver com relativismo ou liberalismo teológico. A ideia é que cada um é responsável perante Deus pela medida de fé e entendimento que lhe é dada. E só sendo fiel a esse dom pode cumprir a vontade divina).
Pois eu, meu caro e bem regressado Nuno, eu quero vê-la canonizada, subito, colocada nos altares de acordo com os sábios preceitos da Santa Madre Igreja. Para que nos lembremos dela e para que Deus, com quem ela está, se lembre de nós. E quero-o sobretudo agora que surgem alguns a querer assumir o canónico papel de advogado do diabo, apontando as suas crises de fé. E mais ainda por ter agora lido algumas das suas palavras em que se queixava da mesma noite escura de S.João da Cruz, do silêncio de Deus que a oprimia. Eu cá desconfio sempre daqueles que tem uma relação pessoal com Deus, daqueles que conversam familiarmente com Jesus; desconfio que esses cometem o pior dos pecados, o do orgulho. E admiro imensamente aqueles que, dedicando toda a sua vida a Deus, permanecem sentindo dolorosa e humildemente que Ele não lhes liga nenhuma, não Se lhes revelando. E que ainda assim permanecem amando-O em cada um dos seus irmãos. Para eles esse é o maior martírio e é nele que se santificam. Desses santos é que eu gosto e deles é que temos falta. Já agora, se puderem, leiam o «S.Manuel Bom, mártir» desse grandecíssimo católico que foi Miguel de Unamuno. Há uns anos o Carlos Cunha recomendou-mo e fez muitíssimo bem.
'Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo, como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemossantose irrepreensíveis diante dele em amor' (Ef 1:3-4).
'Porque esta é a vontade de Deus: a vossa santificação' (1Tess 4:3).
Irmão católico, não procures entre concílios romanos a canonização que o Cânone declarou a todos os cristãos. Atenta as palavras de João Paulo II, quando disse: 'Não temos medo de ser santos'.
Se és salvo no nome de JESUS, logo és santo. Os teus frutos justificam a fé com que te declaras adorador do único Deus verdadeiro.
Não ores senão ao Pai, ao Filho, ao Espírito. A santa Teresa de Calcutá melhor intercederá por ti, assim, que a honraste como mulher santificada, e nada acima dos seus desejos, enquanto serva do SENHOR.
Cumpridos os meus 40 dias no ermo jejuado da minha missão blogosférica, eis que torno ao vosso http://, amados, com novas folhas de palmeira para mais hossanas ao SENHOR de Israel.
“Porque o reino dos céus é semelhante a um dono de casa que saiu de madrugada para assalariar trabalhadores para a sua vinha. E, tendo ajustado com os trabalhadores a um denário por dia, mandou-os para a vinha. Saindo pela terceira hora, viu, na praça, outros que estavam desocupados e disse-lhes: Ide vós também para a vinha, e vos darei o que for justo. Eles foram. Tendo saído outra vez, perto da hora sexta e da nona, procedeu da mesma forma, e, saindo por volta da hora undécima, encontrou outros que estavam desocupados e perguntou-lhes: Por que estivestes aqui desocupados o dia todo. Responderam-lhe: Porque ninguém nos contratou. Então, lhes disse ele: Ide também vós para a vinha. Ao cair da tarde, disse o senhor da vinha ao seu administrador: Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, começando pelos últimos, indo até aos primeiros Vindo os da hora undécima, recebeu cada um deles um denário. Ao chegarem os primeiros, pensaram que receberiam mais; porém também estes receberam um denário cada um. Mas, tendo-o recebido, murmuravam contra o dono da casa, dizendo: Estes últimos trabalharam apenas uma hora; contudo, os igualaste a nós, que suportamos a fadiga e o calor do dia. Mas o proprietário, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te faço injustiça; não combinaste comigo um denário? Toma o que é teu e vai-te; pois quero dar a este último tanto quanto a ti. Porventura, não me é lícito fazer o que quero do que é meu? Ou são maus os teus olhos porque eu sou bom?” Mateus 20:1 a 15
Não é o assunto principal desta parábola de Jesus, mas podemos descobrir aqui algumas características da justiça divina. Primeiro, e usando terminologia sindical, Deus não faz contratação colectiva, faz contratos individuais. Depois, a frase chave:”Não me é lícito fazer o que quero do que é meu?”