É já neste dia 10 de Julho que observaremos os 500 anos do nascimento do reformador, teólogo, pastor e professor Jean Cauvin. Como calvinista, devo a honra que um protestante deve limitar a um santo da fé: prezar somente a forma como Deus usou um tão condenável pecador, modelando-o num vaso para a glória, para que, segundo a graça, se anulasse e se entregasse ao Senhor, bradando o mote: 'Cor meum te offero, Domine, prompte et sincere!'.
Enumero as razões pelas quais devemos ser imitadores de Calvino, na mesma forma que o apóstolo Paulo o exigia perante a Igreja: ou seja, replicando o quanto no cristão viam que vinha de Cristo:
1. Calvino era um biblicista absoluto, cuja abordagem apologética baseava-se na autoridade da Palavra de Deus e não na verificabilidade empírica das Escrituras (cf. inerrantistas);
2. Calvino não cria que a Bíblia estava aberta ao juízo da humanidade, mas era a humanidade que se achava sob o julgamento dela;
3. Calvino acreditava que todo o cristão deve oferecer o seu coração a Deus pronta e sinceramente e obrar durante toda a sua vida para o Reino na terra pelo avanço do Evangelho;
4. Calvino não era um fundamentalista-separatista, mas um cristão ortodoxo que via a Palavra como autoritativa sobre todas as áreas da vida em que ela se afirma soberana – a saber: todas;
5. Calvino aceitava a verdade bíblica tal como no-la delegaram os santos de Israel e os apóstolos da Igreja: inadulterada, sem filtros epocais ou de tradição, nem com o pecado de desculpar o Deus soberano na sua ira como era hábito dos humanistas (Erasmo, Armínio, Grócio, etc);
6. Calvino foi talvez o maior exegeta que a Igreja conheceu. Não se conta um só sermão tópico no seu repertório: toda a sua pregação foi expositiva segundo uma fidelidade absurda. O reformador genovês comentava a Palavra livro por livro, capítulo por capítulo, versículo por versículo, positivamente absorvido no texto. Pregou mais de 300 vezes Génesis, 250 vezes Levítico, 200 vezes Actos. Neste último livro, foi interrompida a sua pregação ao ser deportado para Estrasburgo. Porém, quando Geneva o chamou de novo, Calvino recomeçou exactamente no mesmo versículo;
7. Calvino odiava a monarquia e toda a forma de tirania monadista, pois cria na depravação total do indivíduo e lamentava o erro de delegar todo o poder a um homem caído e corrupto. Promovia a teonomia bíblica, e no seu cumprimento pelas assembleias de homens apontados pela comunidade. Assim, antecipou em largos séculos a democracia e a autonomização das esferas sociais; a estas últimas, vendo-as interdependentes entre si, mas insofismavelmente dependentes da Palavra de Deus para prosperarem;
8. Calvino criou a noção de Estado tal como a temos: a sua separação de poderes em assembleias e ministérios, as institucionalizações do casamento civil, dos bancos e consórcios, das universidades e da educação em geral, etc, todas reportam para a Genebra seiscentista, para a ofensa de muitos secularistas e ignorância de tantos cristãos;
9. Calvino cria que o indivíduo era um fim em si e nem as autoridades nem o todo da sociedade se podia sobrepor a essa obra de Deus, por mais malvada que se fizesse. Afirmou que a negação da consciência individual era o caminho para a ruína, e que até os mais vis governantes necessitam das nossas orações, mais do que as nossas lâminas nos seus peitos déspotas.
10. Calvino jamais quereria ser lembrado. Pediu para ser enterrado numa campa comum, sem inscrição na sua lápide. Mas que o Senhor me permita que o não faça a esse pobre pecador, tal como os santos que o enterraram, por virtude apenas da Escritura que nos diz:
'Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus' (Mateus 5:14-16).
Nuno Fonseca
cheers!