segunda-feira, junho 30, 2008
Luz
Os mortos guardam, no mal que a verdade não anula, no silencioso terror do que não sabemos, que não podemos conhecer. É no silêncio dos mortos o único lugar onde distracção alguma entra, em que não se desfoca a atenção do que é estar vivo e não saber de que se trata afinal, do princípio ao fim. O que é morrer? É a pergunta que subjaz a todas as outras, qualquer uma, é a respiração do acto e da reflexão. Talvez se conseguíssemos formular outra pergunta, acerca da vida mortal que somos, pudéssemos não exprimir nem produzir o mal, mas tal não nos é outorgado. Somos uma espécie amaldiçoada dizia o céptico romeno, por vezes com raiva, outras com melancolia.

Deus é aquilo que contém o vazio, que lhe é anterior, é a dedução simples da vida não poder brotar do nada, o mistério da anterioridade do ser. E é sobretudo o lugar onde a pergunta pode ser outra, e de que não fazemos a mínima de como será, até calarmos a morte.

Talvez alguém já tenha calado a morte, como poderia eu sabê-lo, que nunca o fiz?
Vítor Mácula
posted by @ 12:33 da tarde  
9 Comments:
  • At 2 de julho de 2008 às 02:04, Blogger cbs said…

    Ele calou a morte.
    Essa a diferença dos cristãos, sabem.
    Nunca a experimentei - ou talvez... já caí do Paraíso uma vez!
    Mas sei, mas sei, "Vim para que tenham vida" não foi o que Ele nos disse?

     
  • At 2 de julho de 2008 às 15:51, Blogger Vítor Mácula said…

    Tens mesmo a certeza que Cristo foi a única figura que pretensamente calou a morte?
    É curioso.

     
  • At 2 de julho de 2008 às 15:54, Blogger Vítor Mácula said…

    Mas o importante, o único importante, é se tu ou eu, a calamos em Cristo. Isto é, qual o valor real e concreto do nosso fiat, se é sequer que o tenhamos verdadeira e existencialmente proferido. Que cada qual meta o chapéu, e prosit ;)

     
  • At 2 de julho de 2008 às 23:35, Blogger cbs said…

    Sim, tenho a certeza, tanto quanto uma fé frágil,como a minha, o permite.
    Curioso, por...

     
  • At 3 de julho de 2008 às 17:17, Blogger Vítor Mácula said…

    Curioso porque pretender calar a morte é uma actividade antropológica, de Lascaux ao ateísmo.

     
  • At 3 de julho de 2008 às 21:16, Blogger cbs said…

    ah! nesse sentido. Confundi "calar" com "derrotar".
    Como sabes, só o Verbo encarnado pôde reverter o afastamento de Deus, ou seja a morte no sentido absoluto. A ressureição é no sentido, da oferta da Vida (não da terrena)um facto basilar e único.

    creio eu, acrescente-se ;)

     
  • At 4 de julho de 2008 às 13:12, Blogger Vítor Mácula said…

    Sim, pretender derrotar a morte é uma actividade antropológica, de Lascaux ao ateísmo, passando pelo epicurismo, pelo estoicismo, taoismo e até pelo Sandokan ;)

    Eu sinceramente, quando vejo alguns de nós ufanar-se de ter vencido a morte, dá-me uma irónica vontade de fazer o famoso teste do Dillinger LOL

    O que nós temos mais é bazófia, pá, balões de ar, vanitas. Não sei se alguém o fez, é o que digo, mas não basta ir à missa para fazer mais que o Epicteto, e sobretudo: não basta dizê-lo. A morte está-se cagando para o que um gajo diz, até lhe podes declamar os evangelhos de ponta a ponta.

    Eu, ter dito o fiat... 'Tá bem abelha LOL Há três anos a minha esposa teve um ataque de asma que a cangou para o hospital com botija de oxigénio e soro nas veias e este destrambelhado cristão nem dormir conseguia em casa, quer dizer, conseguir conseguia, mas com um Morfex pela goela abaixo ;)

    Nem todos nós somos um Job ou uma Maria, e muito menos um Cristo. Alguns lutamos por isso, é a guerra santa, o combate ascético.

    Enfim, falo por mim, como já disse. Sou incapaz de proferir a sério a frase "Eu calei a morte".

    "Afasta de mim este cálice", até aí vou espontaneamente LOL; garantir de coração e acto "faça-se a tua vontade" é outra coisa...

     
  • At 5 de julho de 2008 às 19:03, Blogger cbs said…

    Portanto não falavamos do mesmo.
    Cristo vence a morte na sua dimensão absoluta e deixa uma porta aberta para entrarmos na Vida (Arquivida diz o Henri Michel).
    Mas a morte terrena é singular em ada um de nós e ness~e sentido, só no momento da morte a poderemos ou não vencer, julgo eu.
    Já vi a minha morte um par de vezes... senti medo, cobardia, borrei-me... e acho a experiencia absoluta, talvez a experiencia mística por excelencia.
    De qualquer forma, distingo a minha morte e a morte do outro que amo. É diferente. Não sei como comparar, mas apetece-me dizer que é muito mais dificil a relação com a morte do ser amado, porque perdemos (de certa forma, morremos) e depois continuamos a viver, na vida terrena.

    PS:quanto à vanitas, concordarei contigo, se acrescentares que somos uma permanente tensão entre as duas coisas, a vanitas e a humilitas...

     
  • At 7 de julho de 2008 às 13:41, Blogger Vítor Mácula said…

    Boas, cbs, well, well, não sei se falávamos do mesmo ou não, mas cuspo numa morte absoluta e numa arquivida que não se conectem com as minhas próprias, directa e concretamente.

    Não quis de modo nenhum equivaler a morte de outro com a própria, fónix! Referia-me à questão do fiat, à relação com todo e qualquer acontecimento enquanto possibilidade de conexão com a vontade de Deus, sem medição final pelo agradável ou desagradável, como parece configurar-se em certos estóicos e em certos cristãos e etc (ah grande Job;)

    O ano passado ia-me afogando no mar, e houve um momento em que numa vaga consciência de que “é desta”, apercebi-me violentamente que aquilo com que se fica nas mãos perante a morte é (…).

    abraço

     
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