terça-feira, fevereiro 02, 2010 |
A culpa e a Graça |
Estava eu em alegre cavaqueira com o Nuno Fonseca aí nuns comentários abaixo, quando me deparei com o ponto 847 do catecismo. Este ponto reza:
"Esta afirmação não visa aqueles que, sem culpa da sua parte, ignoram Cristo e a sua igreja:«Com efeito, também podem conseguir a salvação eterna aqueles que, ignorando sem culpa o Evangelho de Cristo e a sua Igreja, no entanto procuram Deus com um coração sincero e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir a sua vontade conhecida através do que a consciência lhes dita»".
O que mais me fascina neste ponto não é tanto o problema de fundo que nele é abordado, mas a relação entre a culpa e a Graça.
Saber o que é do domínio da culpa e o que é o resultado da Graça.
Estou convicto que este problema, que atravessou e atravessa a Humanidade, sob diversas formulações e com diferentes palavras, frequentemente filosóficas ou científicas, nunca terá uma resposta terrena por razões que agora não interessa invocar para não tornar este post demasiado fastidioso.
O que pressinto, contudo, é que este problema, que atravessou igualmente a história do cristianismo, é pouco importante do ponto de vista dos dogmas da fé.
Deus, quando enviou o Seu Filho, não foi para trazer a resposta a esta questão. Foi, no único mandamento que Ele nos deixou, para nos pedir para fazermos uma escolha, a escolha do Amor.
Talvez este pedido para escolhermos o Amor seja afinal também a resposta divina para esse eterno problema humano de saber o que é do domínio da culpa e o que é o resultado da Graça.
timshel |
posted by @ 9:28 da tarde |
|
51 Comments: |
-
A culpa vem do pecado e, como diz a Escritura, 'onde entrou o pecado sobreabundou a Graça'.
Claro que há aquela culpa que vem da rejeição da Graça (o tal pecado imperdoável - contra o Espírito Santo), mas penso que seria subverter a justiça de Deus pedir que ele extendesse a misericórdia a quem já a viu, já a reconheceu e não quer nada com ela.
É preciso ser-se convencido para vir ao Reino; mas para o Hades - todos nós iríamos sem indagações de consciência ou culpa.
-
eu mais curto na exegese bíblica do Tim é a capacidade de liofilização.
Reduz todos aqueles séculos e séculos de palavras a uma única- o Amor.
":O))))))
-
Neste caso deu uma gracinha amorosa e sem sombras de culpa.
":OP
-
Desde que não autonomize o amor, tudo bem. Coisas horríveis acontecem quando se deixa o amor ir a solo. E não falo só de doenças venéreas.
Bom, é ler o Caritas in Veritate.
-
«E não falo só de doenças venéreas »
ahhahahaha
Estás a romanizar-te.
-
"eu mais curto na exegese bíblica do Tim é a capacidade de liofilização.
Reduz todos aqueles séculos e séculos de palavras a uma única- o Amor."
Mas é esse mesmo o sentido cristão. Jesus Cristo - o Alfa e o Ómega.
-
Pois. Mas a Bíblia não é apenas Jesus.
São séculos e séculos de História.
-
Ainda assim são séculos de História em que Jesus aparece como arquétipo nos ritos e Lei do povo de Israel. O Tabernáculo foi a velha dramatização do que aconteceria no Calvário com o Cordeiro de Deus. Cristo também jurou aos fariseus que era de Si que toda Torah testificava e que Moisés falou dEle todo o tempo. Até mesmo os dois mandamentos do Amor, que Jesus enunciou já estavam presentes no Deuteronómio.
Tenho apreciado muito a leitura litúrgica da Palavra. Consegue-se ver elementos neotestamentários em todo o VT (incluindo a Virgem na figura da incorruptível Arca da Aliança). Fun stuff. Com este método, ler o Apocalipse torna-se possível.
Fica a promessa dum post futuro a vislumbrar-se.
-
*a Arca transportava a Shekkinah (presença de Deus), e continha dentro de si o sangue da expiação do todo o cordeiro propiciatório. Não podia ser tocada, para se manter imaculada (daí a morte do israelita que o tentou fazer). Vá, divirtam-se com os paralelos.
-
Se soubessem com que utensílio escrevo isto, passavam-se.
-
É muito interessante ver como, segundo Lucas, os apóstolos sentiam essa necessidade, nos seus discursos, de explicar a ligação do AT com Jesus. Por isso é que me causa estranheza um certo discurso de revisionismo vetero testamentário de alguns cristãos, como se, de facto, a História não fosse essa: há uma fibra nervosa que vai do Génesis ao Evangelho que é o Amor de Deus por nós, criaturas caídas, personificada de forma final em Jesus, nos seus actos e nas suas palavras. Podemos não gostar, não entender ou simplesmente virar a cara, mas há uma unidade temática. Quer dizer, aposto que já toda a gente sabe isto, mas não perco nada em dizê-lo de novo.
-
Zazie,
mas ninguém quer anular a história. Nem pode. Lê-se é através de Jesus Cristo. O Nuno e o João focam isso mesmo.
Mas atenção: cada facto/leitura histórico vale por si mesmo. Quer isto dizer: a Arca era a Arca, o maná era o maná.
-
Não, não é isso.
Se falamos de mandamento principal da mensagem cristã,sim.
Mas nem o Novo Testamento se resume a um mandamento e muito menos o Antigo a este.
Essa relação entre culpa e graça é complicada.
Mas esquece. Há uma série de questões em que a religião não me dá resposta e, a principal, como me farto de referir é a questão do fundamento ético e da justiça.
Aqui há tempos o Dragão ia falar nisso mas depois chateou-se.
Deve ser a questão crucial que a nossa civilização nunca conseguiu resolver.
É claro que o amor como mandamento é uma coisa- e é-o em termos ideais. Mas nunca poderá ser qualquer coisa que substitua a justiça, sob pena de se tornar uma gigantesca hipocrisia ou apenas acessível a santos.
-
Percebo melhor do modo que o Nuno colocou a questão e que vem na encíclica do Papa. A caridade.
Mas, mais uma vez, é um acrescento que nem é original em relação à Bíblia- faz parte do cristianismo, mas não tem fundamento divino, uma vez que pode existir de forma igual e laica.
-
Outra coisa.
Não faço a menor ideia do motivo pelo qual a História se tem de ler através de Cristo e ainda menos o Antigo Testamento.
Não tem. Só tem em termos de fé, de adoração. Mas essa não substitui a exegese dos textos que até pode ter vertentes meramente históricas, linguísticas, semânticas, comparativas com outras da época, buscas de genealogias de conceitos e por aí fora.
A Bíblia é demasiado importante para poder ser liofilizada num mandamento ou reduzida a uma crença que a actualiza a partir de Cristo.
-
Esta é uma conversa que mantenho há uns bons anos aqui na blogo com o Tim e com outras pessoas mas que se mantém como monólogo meu.
Nunca consegui ir mais longe nem contrariada ou entendida.
Mas sei que é um ponto em vazio no qual nunca introduzi completamente crença católica.
Ou melhor- no qual a suspendo e onde deixo a imagem que tenho de Deus fora dela.
Por isso é que é correcto o Luis dizer que sou simpatizante.
Nestes aspectos sim. A doutrina não me dá resposta e no que diz não me agrada.
-
Essa ideia da Virgem na Arca é que teve piada. Nunca tinha pensado nisso.
Há uma série de questões que nunca entendi e acerca das quais também não encontrei explicação dos próprios padres da Igreja (em particular S. Tomás de Aquino).
Uma delas são as contradições proféticas onde aparece o cântico de David a prenunciar a crucificação e outra é a que apenas vem no Evangelho de Mateus, quando os judeus dizem que o sangue de Cristo jorre sobre eles e sobre os seus filhos.
Nunca entendi isso. Os outros não o referem e chega a ser lido pelos padres da igreja como uma espécie de desafio- já que não acreditam então até desafiam a serem amaldiçoados até à eternidade.
Na Idade Média lia-se esta passagem como mais um exemplo deles O terem negado.
Mas nunca vi que pudesse ser lida como uma espécie de "moira" a que os próprios não pudessem escapar.
É muito estranho- e, ainda mais, por só ter uma única referência (pelo que sei)
-
João Leal:
Eu não encontro essa "unidade temática". O que mais encontro são situações de "uncanny" por assim dizer.
e outras absolutamente duplas- tudo e o seu contrário.
ehehe
-
A justiça é um conceito judaico e não cristão.
PS: estou a brincar PS1: mas não sei em que medida estou a brincar
-
Retira-se do NT, sobretudo de Lucas o seguinte:
A justiça de Deus é a misericórdia. O homem não consegue (porque é limitado)viver deste modo o mandamento do Amor. Mas pela Graça é chamado a converter-se a e(E)le. E para mim é esta a conversão que verdadeiramente interessa.
Quando digo ler a História através de Cristo, quero referir que Cristo é Revelação de Deus. Mas não se trata de nomear Cristo (esse profetismo está mais que gasto)trata-se antes de agir de acordo com o que Ele é para cada um. Isto para os cristãos. Para os que o não são, as obras de Cristo são as mesmas. A ética não é cristã. E são-nos desconhecidos os caminhos porque Deus age.
Mas Zazie, colocas questões bem pertinentes. Com tempo pego em algumas.
-
A justiça, não tem representação divina.
Mas sem ela não existe moral.
-
É complicado, pois.
Sem o sentido de justiça nem havia moral e nem se sabia o que era a caridade e por aí fora.
No entanto, a religião católica não tem uma fundamentação sagrada para a justiça.
E nunca foi possível, teoricamente, resolver o problema.
É uma noção de tradição greco-latina. Mas sem ela não havia tradição cristã.
A thora tem a vingança, não têm o equilíbrio da justiça.
E nós ficámos com o Bem e o Mal e sem saber onde "enfiar" a justiça porque nem um nem outro respondem a ela.
-
-
A justiça consiste no dar a cada um o que lhe pertence.
É este o conceito que ficou do direito romano e que, ainda hoje, faz parte da nossa lei- a de tradição romana e cristã.
Mas a religião não responde ao "dar a cada um o que lhe pertence". Penso eu- porque à custa disso criaram-se milenarismos de injustiças que desejavam a Igualdade Eterna baseada mais no Ter do que na justiça.
O sentido de Justiça dos últimos dias também não passa de um fora de tempo igualitário onde toda a moral deixa de ser necessária e, portanto, nem a Caridade é precisa.
E, mesmo nesse julgamento Final o que temos é um retomar da vingança da Thora. Da separação do trigo do jóio. E não do equilíbrio e harmonia no que a cada qual pertence.
Por restituição do que lhe foi tirado, E aí entra muito mais que bens, entram direitos, respeitos, reposição da Verdade, etc, etc.
-
Zazie,
em primeiro lugar (já fui ao cocanha, mas fica antes aqui) tenho um desafio para ti no meu blogue. ;)
Em segundo, falemos então de justiça. A justiça é tida em conta pelo cristianismo. Justiça no sentido de igualdade e de cada um receber o que lhe pertence. Ela é uma das quatro virtudes cardinais: Justiça, fortaleza, prudência e temperança.
É a justiça que tem de orientar a nossa acção. Há atropelos à mesma? pois há. Por isso precisamos das outras virtudes. A Igreja é sábia. :)
A caridade, a par da fé e da esperança, faz parte das virtudes teologais.
Nenhuma anula a outra, antes completam-se.
Cristo lixou esta coisa da igualdade porque também para Ele, havia uns "mais iguais" que outros. ;) Havia nele uma preferência pelos mais abaixo da cadeia social. Isso é inegável nos Evangelhos.
-
Exacto. Mas essas virtudes cardeais que se opõe aos vícios são acrescentos da tradição greco latina.
Não vêm na Bíblia.
bjs
Vou ver isso.
E nem é só esse o problema. Não têm fundamentação divina.
-
Ah, e a igualdade de que falas é a que adulterou a noção de justiça.
Essa é a igualdade económica ou a de ninguém precisar de trabalhar. A do Paraíso Celeste que se torna terrestre e depois promete o Eterno com a descida da Jerusalém Celeste.
E essa é que foi a adulteração que, desde os judeus aos cristão, levou aos milenarismos igualitários mais sanguinários.
Já deixei até a indicação do Estudo que o Norman Cohn lhes dedicou- Na senda do Milénio.
Na tradição romana e na que ainda hoje faz parte do nosso sistema de justiça- "dar a cada qual o que lhe pertence" não é dar bens, nem dinheiro, nem tornar as pessoas iguais mas repor injustiças.
-
repor danos de injustiças.
Parte-se do princípio que a justiça pode dar a alguém a sua verdade, os seus direitos, por aí fora. Voltar a dar-lhe o que lhe tiraram.
-
Portanto, esta ideia de justiça é uma reposição de um equilíbrio que foi estragado.
Não pretende vingar nem acrescentar o que não se tinha antes.
E muito menos é fazer de toda a gente ricos ou de todos pobres para serem iguais na condição social.
Coisa que nada tem a ver nem com Deus nem com a moral. E também não terá a ver com o Mal e com o Diabo.
Mas, como falta a justiça, o catolicismo sempre viveu coxo com esta confusão.
-
zazie
como já deves ter intuido, a definição da noção de justiça é essencial no teu raciocínio
penso que a defines como um estado natural de equilíbrio
ao longo dos séculos, tentaram-se várias tentativas de definir em concreto em que consiste esse equilíbrio natural
o mais recente e talvez o mais sólido é o de Rawls, "o véu da ignorância", que constitui neste momento, independentemente da posição em que o próprio Rawls se situa, o mais sólido fundamento do esquerdismo
o único problema é que a "Teoria da Justiça" de Rawls não é de fácil leitura
-
Zazie,
a justiça tem fundamentação divina, sim. Toda a Bíblia é atravessada pela procura da mesma. Mas é um caminho que se faz. Não vem pronta em nenhuma fórmula.
Lucas 12,57 diz: "Porque não julgais por vós mesmos, o que é justo?" É um desfio a essa procura.
Não me refiro a bens materiais ou outros, estou ainda nas noções. A igualdade de que falo é a de que todo o homem tem direito a ser tratado de forma justa. E tem o dever de ser justo.
-
Vais acreditar porque é fácil mas eu nunca li Rawls.
ejejhe Em tendo tempo leio. O que li acerca da justiça foi em Schopenhauer que até era ateu, embora para o caso não interesse.
A minha noção de justiça é complicada. Tem para aí metade de código de honra de série B e outro tanto de franciscanismo à Teixeira de Pascoaes ou Bresson, ou Ordem da Natureza, como quiseres.
ehehe
Mas duvido que seja de esquerda ou de direita. Eu não incluo nela nenhuma ideia de progresso e ainda menos de economicismo.
-
Pois, julgar por nós mesmos o que é justo é relativismo.
Eu não sei. Nunca encontrei justiça na Bíblia a não ser o castigo e a vingança judaica.
E, na minha noção de justiça nunca pode haver vingança.
Tem de haver paz e harmonia- porque tudo tende a repor equilíbrios, como dizia o Aristóteles.
E esses equilíbrios são feitos cá. Na vida terrena.
-
é um estado natural de uma Ordem.
Essa ordem é que entra em desequilíbrios e entre eles os da injustiça ou da culpa e da expiação.
Mas cá. Não é depois.
-
não sei se o Rawls era religioso
mas o que eu critico em Rawls é precisamente querer construir uma teoria da Justiça de "consenso" que, consequentemente, parece prescindir de um fundamento transcendental
a sua validade encontra-se aparentemente condicionada pelos actores do consenso
embora genericamente subscreva teoria do Rawls, penso que ela apenas é válida não enquanto teoria "consensual" mas porque representa uma forma de tradução do mandamento do amor "em termos de mínimo denominador comum" nas relações entre as pessoas
por isso é fácil
-
Mas fiquei com curiosidade do Rawls.
Tu quando falas em esquerdismo fazes sempre poesia como eu com a justiça e a natureza e os memés e o Pascoaes.
ajhahaha
O esquerdismo é e será sempre a maior hipocrisia, comprovada por todos os milenarismos.
Lê o Nornam Cohon que aposto que desconheces essa história das seitas igualitárias.
Eu no Carnaval a ver se tiro tempo para espreitar o Rawls, apesar de ter de pegar no Swift e no Hogarth
e de ainda dar um pezinho de dança.
":O))))
-
Vou ver isso.
Palavra. Mas o melhor que conheço está no Schopenhauer.
(estranho que não gosto nada de consensos).
A ideia que tenho de justiça é muito individual. Nunca é partilhada. Obedece sempre a algo maior que nós.
-
relativismo, nada. Não sejas literalista. :) se eu disse que era um caminho.
Deus não nos dá fórmulas acabadas.
-
ah, ok, ok. Estou a perceber o que queres dizer.
Os consensos são sempre relativos e sociais e eu também não prescindo de um fundamento transcendente.
Tive foi de o inventar.
ejhehehe
-
Nas questões de justiça nem sei se poderia entrar o mandamento do amor.
Entra o de caridade, por exemplo.
O amor é a ligação com a tal Ordem e o sentido de tudo.
-
as seitas igualitárias são uma constante da história do cristianismo
acredito que no aproximar do fim do primeiro milénio tenham tido uma maior influência na perspectiva do que eles pensariam ser o fim dos tempos
o Umberto Eco no Nome da Rosa recorre abundantemente aos igualitários para traduzir um dos elementos essenciais do livro, a pureza versus intolerância
como em tudo, o problema são as tentativas de deitar fora o bébé com a água do banho
-
num instante lês o capítulo 12 de Lucas e vês se de lá se pode tirar algum relativismo. É desafio puro.
-
bom, estamos para aqui três a comentar...vou-me ver o resto do Benfica. :)
-
e eu também vou ver o resto do Benfica que já estou preocupado (e ainda por cima com sono :)
que o Benfica ganhe e boa noite para vocês
-
Olha, bom empate de bola
ejehe
A minha ingonrância em teoria política é tão grande que nem estava a ver quem era o Rawls.
Não. Não vou ler nada disso. O que mais quero é que se fodam os sistemas sociais e engenharias dessas.
Quando falo em justiça estou a falar em coisas sérias. Nunca em palhaçadas políticas.
-
E ressonem bem, seus dorminhocos.
":O)))))
-
Olhem só no que se tornou este post!
Zazie, queria contribuir desta forma: a busílis que se gera quanto ao paradoxo graça vs justiça é resolvida na Cruz: todos os pecados de todos os pecadores são ali propiciados sem excepção. A justiça é ali feita. Nas palavras de Cristo: 'Está consumado'. Todos os que herdarão o Reino e que efectivaram a sua salvação crendo em Cristo e vivendo piamente, saciaram plenamente a ira de Deus na pessoa do Cristo executado no Calvário e na partilha do Seu sofrimento e morte nos seus sofrimentos e mortes. Os mais, preferiram tomar a justiça de Deus sobre si ao negar o Cordeiro imolado.
Que Deus salve aqueles, é amor incondicional; que os outros sejam entregues à condenação que preferiram é um amor condicionado pela sua obstinação.
Afinal que é o Calvário senão o eixo em que a justiça e a Graça de Deus convergem? O pecado é justamente morto para que se viva em misericórdia.
Bom, é esta a resposta ocidental e escolástica que me foi catequizada.
A outra, a oriental e mística, também é interessante. Diz que não se pode descrever Deus enquanto essência, porque Deus é incompreensível, e que atributos como 'justiça' e 'misericórdia' são categorias criacionais que não podem compreender o Incriado. Assim, quando se diz que Deus é justo, estamos a afirmar que a acção da essência ('energes'), é justa. Para eles, apenas o Amor e a Graça são-nos revelados como sendo da natureza e essência de Deus, pois são incriadas e presentes desde o eterno na Trindade. O mais, deixa-se orientalmente ao mistério. E aos ícones.
Claro que depois do Vaticano II sínteses várias disto foram já apresentadas. Mas isso é matéria para outro post.
-
uau, nuno. tou gostando. posta lá.
-
Obrigada, Nuno.
Deixaste aí uma série de pistas bem curiosas. Particularmente a mística.
-
Certo, mas ainda vou estudar isto mais a fundo.
Quero só lembrar que quando falo em 'orientais' não falo dos Ortodoxos. Falo dos Católicos de rito oriental, antes do Grande Cisma; ou seja, os 'padres orientais'(S. Atanásio, S. Crisóstomo, S. Maximiliano, etc).
A orientalidade e misticismo do Catolicismo foi recuperado no Vaticano II. O Catecismo que daí saiu é orientalíssimo (ex: constante apelo ao mistério e à incompreensibilidade do Deus Triuno); e até a Novus Ordo Missae recupera elementos litúrgicos bizantinos, como a Epiclese na consagração da Eucaristia.
Penso que o pós-moderno responde melhor a esta abordagem teológica que o logicismo latino à S. Tomás de Aquinas (em resposta ao nojo pelo sistematismo paelomoderno). Vejam, por exemplo, o que a Comunidade Taizé tem feito.
Lembro-me agora também do Xavier Zubiri. Foi um teólogo basco que afirmam ter conseguido uma síntese entre as duas escolas (ando a lê-lo agora). E pelo que se percebe da concretização ecuménica com os Ortodoxos, mais esforços têm sido apresentado com sucesso. Porém, durante todo um milénio a Simplicidade Divina professada pelos latinos sempre foi o escândalo dos nossos irmãos barbudos e lambuzadores de ícones.
Mas mais sobre isto mais tarde. Até lá, fica um brinde. Só o séc XXI nos daria fenómenos como este: * http://www.facebook.com/pages/Icon-of-Fatima/184523789663?v=info * http://orientem.blogspot.com/2010/01/icon-of-mother-of-god-of-fatima.html
-
Estes brindes é que são deliciosos.
(aproveito a agredecer aqui, que não quero interromper o namoro azulado e fracturante, lá mais em cima).
|
|
<< Home |
|
|
|
|
Um blogue de protestantes e católicos. |
|
Já escrito |
|
Arquivos |
|
Links |
|
|
A culpa vem do pecado e, como diz a Escritura, 'onde entrou o pecado sobreabundou a Graça'.
Claro que há aquela culpa que vem da rejeição da Graça (o tal pecado imperdoável - contra o Espírito Santo), mas penso que seria subverter a justiça de Deus pedir que ele extendesse a misericórdia a quem já a viu, já a reconheceu e não quer nada com ela.
É preciso ser-se convencido para vir ao Reino; mas para o Hades - todos nós iríamos sem indagações de consciência ou culpa.