quarta-feira, julho 09, 2008
Cânon da crítica: a contracepção
Peter Seewald: Muitos fiéis não compreendem a atitude da Igreja em relação à contracepção. Compreende porque não a compreendem?

Joseph Ratzinger: Sim, pode-se compreender muito bem, é realmente complicado (…) Devíamos agarra-nos menos à casuística do caso individual, mas olhar para as grandes intenções da Igreja. Julgo que, neste contexto, se trata de três opções essenciais.

A primeira é a de adoptar, fundamentalmente, uma atitude positiva em relação ao lugar da criança na humanidade. Verifica-se neste domínio uma mudança curiosa. Enquanto que a bênção dos filhos era considerada a bênção por excelência nas sociedades até ao século XIX, hoje a criança é quase considerada como uma ameaça. Pensa-se que nos tiram o lugar do futuro, ameaçam o nosso espaço vital, etc.
Trata-se de voltar a encontrar a perspectiva originária, a verdadeira perspectiva, segundo a qual a criança é uma bênção. Que é por darmos a vida, que também recebemos a vida, e que este sair de si e aceitar a bênção da criação é fundamentalmente bom para o homem.

O segundo ponto é que hoje estamos entre uma divisão entre a sexualidade e a procriação, que antes se desconhecia e que torna necessário reconsiderar a relação interior entre ambas. Desenvolve-se cada vez mais no sentido de serem duas realidades completamente separadas. Encontramos Aldous Huxley, no célebre romance de ficção “Admirável mundo novo”, uma visão muito fundada e muito clara, na sua dimensão humana trágica, de um mundo vindouro em que a sexualidade está totalmente separada da procriação. As crianças são planeadas segundo regras e fabricadas em laboratórios. É uma caricatura intencional mas, como em todas em todas as caricaturas, revela alguma coisa (…) E, assim, o homem destrói-se a si mesmo. As crianças transformam-se em produtos em que as pessoas se querem representar a si mesmas; antes de as crianças nascerem já se lhes roubou o seu projecto de vida. E a sexualidade, por sua vez, torna-se alguma coisa de substituível. Claro que também se perde a relação entre mulher e homem; vemos como esta situação se desenvolve.

(…) a terceira opção, neste contexto, é que não se pode resolver grandes problemas morais simplesmente com técnicas, com química, mas que é preciso resolvê-las moralmente através de um estilo de vida.
Este é, julgo eu, independentemente da contracepção, um dos nossos grandes perigos; o facto de também querermos dominar a existência humana com a técnica e de já não sabermos que existem problemas humanos originários que não podem ser resolvidos através da técnica, mas que exigem um estilo de vida e certas decisões de vida.

Em relação à contracepção diria que se devia considerar mais estas grandes opções fundamentais em que a Igreja luta pelo ser humano. E pô-lo em evidencia é o sentido da intervenção da Igreja, que talvez não sejam sempre formuladas de modo feliz, mas nas quais estão em jogo as grandes orientações da existência humana.
(Salz der Erde, 2005)
cbs
posted by @ 8:07 da manhã  
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