sexta-feira, abril 24, 2009
O melindre da distinção entre Fé e heresia
"Guilherme tinha sido indubitavelmente insinuante, tinha procurado dizer-lhe que havia pouca diferença entre a sua fé mística (e ortodoxa) e a fé distorcida dos hereges. Ubertino tinha-se melindrado, como quem visse bem a diferença."

"O Nome da Rosa", Umberto Eco (tradução de Maria Celeste Pinto, Edição Difel, pag. 121)

timshel
posted by @ 7:40 da tarde  
18 Comments:
  • At 25 de abril de 2009 às 15:35, Blogger cbs said…

    interrogo-me se Jesus via bem a diferença... talvez os manos evangélicos me possam ajudar com umas citações...

     
  • At 25 de abril de 2009 às 19:07, Blogger Nuno Fonseca said…

    Com prazer:

    1. Jesus sabe a diferença: os seus permanecem na sua Palavra e seguem os seus ensinamentos:

    Jo 8:31 - Dizia, pois, Jesus aos judeus que nele creram: Se vós permanecerdes na minha Palavra, verdadeiramente sois meus discípulos;

    Joh 10:27 - As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu as conheço, e elas me seguem;

    2. Jesus conhece os falsos, e faz-se desconhecido perante eles, pois até os mais místicos milagres vangloriam as suas carnes, estando calejados para a Verdade da Palavra, e recusando glorificar Cristo - esse que, na realidade, desconhecem eles mesmos:

    Joh 10:26 - Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas.

    Mat 7:21,23 - Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então lhes direi claramemnte: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade.

    §

    SOLI DEO GLORIA

     
  • At 27 de abril de 2009 às 14:32, Blogger Vítor Mácula said…

    penso que isto indica a diferença entre identificar a Palavra de Deus com os textos bíblicos ou com a voz do magistério, ou entendê-la como o acto em que tudo é criado e o próprio nada (mística ortodoxa)

    é claro que o Verbo se dá a indiciar de modo supremo nos textos sagrados; mas reduzir o acesso e vivência nestes, é cilindrar a dinâmica dessa mesma indiciação: tudo se torna usos, costumes, sabedoria humana que ao pretender mais do que pode, se inverte no seu contrário.

    há evidentemente heresias mais perto duma vivência de e com Jesus Cristo do que pretensões de sabedoria absoluta e indicutível acerca do divino e do seu Verbo.

    tenho que ler este Eco com o qual tenho uma quiçá preconceituosa desconfiança ;)

     
  • At 27 de abril de 2009 às 15:19, Blogger Nuno Fonseca said…

    E essa afirmação, é uma das 'pretensões de sabedoria absoluta e indi[s]cutível acerca do divino e do seu Verbo'? E mais: donde vem?

     
  • At 27 de abril de 2009 às 15:59, Blogger zazie said…

    Eu tenho de arranjar tempo para postar os santos loucos que são um excelente exemplo da forma como o místico não é equiparável à fé distorcida dos hereges mais fanático.

    O Eco é agnóstico e dá uma visão bem diferente do que pode ser o misticismo.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:00, Blogger zazie said…

    E concordo com o Vítor quando diz:

    «há evidentemente heresias mais perto duma vivência de e com Jesus Cristo do que pretensões de sabedoria absoluta e indicutível acerca do divino e do seu Verbo.»

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:03, Blogger zazie said…

    Os místicos do deserto que depois se tornam "bobos" na cidade estavam para lá da heresia precisamente porque não interpretavam qualquer Verbo,antes provocavam a anomia.

    E usavam essas provocações a par de uma vida de despojamento cristão que não queriam sequer que fosse conhecida.

    Mas eram ignorantes. Nada ali tinha a ver com intenção de "leitura teórica" ou fundação de nova seita.

    Eram absolutamente individualistas. Sozinhos no meio do mundo, deixando-se escarnecer por ele.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:07, Blogger zazie said…

    Resumindo:

    nem toda a fé mística tem de ser ortodoxa.
    E, por isso, mesmo, não é equiparável à fé dos hereges.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:37, Blogger Vítor Mácula said…

    vem daqui, Nuno:

    "Ubertino tinha-se melindrado, como quem visse bem a diferença."

    já agora um esclarecimento e um acrescento: quando digo "textos sagrados" incluo a tradição magisterial católica, não com-fundindo evidentemente os seus modos com os dos textos bíblicos; e acrescento-lhe agora as tradições práticas do povo cristão, que tanto têm de "acção do Espírito".

    mas onde o Espírito se dá, dá-se também a possibilidade de o negar directamente etc

    reitero que não li o livro, estou apenas na trento-palheta.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:41, Blogger Vítor Mácula said…

    PS: e a tradição protestante, claro; é a tradição cristã que está em liça no cristianismo, em todas as suas dialécticas de erro e acerto.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:44, Blogger Vítor Mácula said…

    PS : penso no entanto que é o magistério católico que tem historicamente a possibilidade de, lentamente, isto é, com o ritmo histórico, avançar no meio das dialécticas vivas sem por fim, criar divisões cristologicamente falsas ou acidentais.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:49, Blogger Vítor Mácula said…

    "Eram absolutamente individualistas. Sozinhos no meio do mundo, deixando-se escarnecer por ele."

    Não é bem assim. Tinham monastérios, em que muitos dos anacoretas iam ao domingo, voltando para as suas grutas. Recebiam também as gentes, um pouco ao modos dos filósofos gregos. João Clímaco teve até um pedido de Roma para escrever a sua experiência mística, de que resultou a "Escada do Paraíso". Mas claro que também havia uns ferozes individualistas, mas esses levavam, segundo rezam as "crónicas" a estória do desaparecimento do eu "terreno" em Deus de modo assaz concretista ;) o que dá ao seu "individualismo" um certo aspecto não-individual.

     
  • At 27 de abril de 2009 às 16:50, Blogger Vítor Mácula said…

    PS: bjocas, abraços

     
  • At 27 de abril de 2009 às 17:01, Blogger zazie said…

    Mas eu estou a falar dos outros, dos loucos que largaram os mosteiros, passaram pelo deserto e depois foram sozinhos para as cidades.

    São os equivalentes aos Yurodivyi russos.

    Beijocas

     
  • At 27 de abril de 2009 às 17:15, Blogger Vítor Mácula said…

    que não fizeram mal nenhum ao Tolstoi. enfim, depende dos pontos de vista, claro LOL

    e rever o "Ordet" do Dreyer é tão bom como rever Bressons ;)

    há sempre outros, essa é que é essa; e por isso esta coisa das identidades é uma alteridade imanente, e as identificações um fio da navalha.

    também há o estapafúrdio do Rasputine, o homem mais venenoso que o próprio veneno JAJAJAJAJAJAJAJAJA!

     
  • At 27 de abril de 2009 às 18:01, Blogger zazie said…

    ehehe

    Andas com um riso muito javardo-lordiano

    ":O))))

    Também me lembrei do pai da tua Navratilova

     
  • At 27 de abril de 2009 às 18:11, Blogger Vítor Mácula said…

    LOL

    é um riso ossiânico que suspende todas as interpretações possíveis como um vento que varre, à Álvaro de Campos ;) já lhe tentei arranjar substituto e não consegui, é uma obra-prima fonética, a tal ponto que já o vi utilizado, pasme-se, por um padre espanhol da Sociedade S. Pio X. não faço a mínima como ele chegou lá... talvez o bispo de Erewhon saiba JAJAJAJAJAJAJAJAJA!

    o Rasputine com um LOL, por favor... LOL

     
  • At 27 de abril de 2009 às 18:16, Blogger zazie said…

    ahahahahahahaha

    Que delícia. E acredito que tenha acontecido. Esse riso varre tudo mas é às avessas.

    ":O))))))

     
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