sexta-feira, março 20, 2009 |
Jardim de Infância |
Tento ao máximo afastar-me de um pensamento dicotómico em relação aos cristãos. É-me difícil porque foi nesse ambiente que a minha consciência foi formatada. No entanto, por mais que me esforce, continua o escândalo supremo a inquietar-me. A saber, a arrogância do cristão que nega o esclarecimento da dúvida e condena sem se sentir obrigado a justificar-se pelas suas palavras, com o poder da Bíblia ou da Igreja. A maior parte dos cristãos que eu conheço não sente necessidade de responder pela sua fé. De que fé falo? Da que diz ao mundo que todos os homens pecaram e estão destituídos do Reino de Deus, a não ser que humildemente aceitem a soberania de Cristo nas suas vidas pelo arrependimento. A leviandade com que o cristão de hoje trata estes assuntos, não é diferente da figura do Fariseu, supremo exemplo bíblico do legalismo e da intolerância. Católicos e protestantes são iguais nisto. "Sou cristão porque sim", imagine-se! Que insulto a Cristo me parece isto, principalmente num tempo em que as pessoas andam cada vez mais informadas e em que respostas dessas não são aceites. "Não tenho tempo para te responder" ou "a minha fé não me leva a aprofundar muito essas questões". Mas é certo que "não sabendo explicar-te porquê, danças e fornicas com demónios" ou "só existe salvação dentro da Igreja Católica, lamento." A apropriação do Amor e da Lei de Deus é a vergonha das igrejas. O sentimento latente de vontade de exclusão ao mínimo não concordar é a maior fraqueza. A Igreja está doente. Não basta que as pessoas gostem de lá estar e se sintam confortáveis com os seus dogmas. É preciso que se torne espiritual em vez de meramente carnal. A Igreja ainda está no jardim de infância. É isto o que eu vejo de fora.
JL |
posted by @ 1:51 da tarde |
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15 Comments: |
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Eu poria porventura aqui umas “nuances”, João.
A noção de pecado original, ou se preferires, do humano enquanto (re)negação originária da fonte da vida e da verdade, é, como noção difusa, uma constante antropológica; de modo nenhum é exclusiva do cristianismo, do judaísmo, do islamismo…
De resto, percebo o que dizes, mas tenho uma experiência eclesial completamente diferente; devo andar por meios eclesiais pouco recomendáveis LOL Quero dizer, há muita gente a tentar dar conta dos seus próprios motivos e motores religiosos, e a enfrentar as suas próprias dúvidas e inquietações, no erro e no acerto, na fuga e na procura. Há muitos “cristãos de hoje”, como sempre houve, mesmo em tempos de mais ou menos tensões identitárias.
E, já agora, também há planos que são puramente afirmativos; claro que se pode explicar os motivos e motores das paixões, mas enfim… ;)
Dá-me ideia que a “doença da Igreja” corresponde ao primeiro parágrafo deste comentário ;) isto é, corresponde à “doença do humano” terrivelmente configurado na intensidade religiosa; deve-se ao facto do “disfarce de anjo da luz”, ou da falsidade só ter poder próprio, precisamente sob as vestes do autêntico; a intensificação da ferida originária, ou se preferires, da consciência do pecado, tem também possibilidades de execução deste, como muito bem viu Lutero (o problema das identificações históricas desta possibilidade, é precisamente… outra história); os demónios entram em tua casa e desarrumam-na enquanto te purificas e enfrentas no deserto… esta é a guerra santa, e dá-se evidentemente com toda a sua força dentro da Igreja, sob formas pessoais, institucionais, doutrinais, etc
O problema é eminentemente existencial: todo o cristão e a Igreja não podem não apropriar-se do “amor e lei de Deus”; essa apropriação é a dinâmica profunda da sua própria constituição enquanto pessoa ou igreja cristãs. Que tal apropriação se inverta no seu contrário, lá está… a letra mata, e por isso a lei sem a sua completude espiritual não passa de “produção da morte”; e esta completude espiritual que nos caracteriza é sempre dada na forma da busca inquieta e na abertura; só a humanização do divino, no mesmo movimento em que é a divinização do humano, pode atravessar tal fio sem soçobrar; e eis um dos motivos do meu cristianismo LOL
abraço, João
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Suponho que o "danças e fornicas com demónios" seja mais uma farpa ao Tiago Cavaco. Se a igreja está no jardim de infância, não me parece que este tipo de comentários seja muito adulto.
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Paulo,
para ti fica bem defender os amigos, independentemente de eles dizerem coisas dessas, gravissimas aos olhos de um cristão, acerca das outras pessoas. Sim, porque duvido que essa frase infeliz, mais uma, fosse uma autocensura do Tiago. A vergonha da amizade ser maior do que o dever de obedecer a Deus é um mal bem conhecido por mim no vosso meio. Mais um exemplo em que os interesses falam mais alto. "Não há nada de novo debaixo do Sol".
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Sim. Fica bem defender os amigos em público. "Atacar" guardo para o privado.
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Vitor,
devemos mesmo ter andado por sitios diferentes : ) De onde eu vim nada se discute e ninguém apresenta as suas dúvidas. É um meio fechado e em quae todos os casos tacanho. Há miraculosas excepções, mas também a verificação de muitas e dramáticas decepções. As paredes que se erguem pela "“doença do humano” terrivelmente configurado na intensidade religiosa", como tu dizes, têm uma carga dramática de conformismo à vontade de um qualquer sacerdote e de traição "ao primeiro amor", essa centelha que acredito que Deus planta na nossa alma e o no-lo faz reconhecer pela primeira vez. A igreja que conheço, de um modo geral, tende a ser um espaço de esquecimento: placas de vidro fosco. Essa malta de que falas deve ser bastante fixe.
1 abraço
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Paulo,
cada um com a sua consciência. No meu caso, não me coíbo de criticar, e não 'atacar', como referes, um amigo em público desde que ache que isso lhe pode fazer bem. Aliás, não espero outra coisa dos meus amigos. Cada um na sua.
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Nós não somos propriamente amigos, mas se fossemos, a frase "A vergonha da amizade ser maior do que o dever de obedecer a Deus é um mal bem conhecido por mim no vosso meio", parece-me um pouco mais que uma crítica. Não vejo que bem isso me possa fazer (ou a outra pessoa qualquer). Mas é como dizes, cada um com a sua consciência, até nas palavras que escrevem.
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Certo, Paulo. Desconfio que esse nacional-porreirismo não terá muito de divino. Mas é só a minha opinião. E só uma coisa: quem escreve em público arrisca-se a que haja gente que o ache parvo e que o diga publicamente também. Sei-o de experiência própria...
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João,
Quando Jesus disse que devemos vir ao Reino como crianças, não achas que ele estaria a falar exactamente de quem aceita a soberania de Deus humildemente, e não precisa de satisfazer dúvida alguma senão a do porquê da nossa salvação?
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Phónix, Deus tem as costas largas.
E depois eu é que tenho má fama por ajustar contas sempre em directo, sem precisar de dizer que o faço em nome da bondade de qualquer doutrina.
É sempre em nome próprio e à bruta que é para não haver engano.
":O))))))
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Só não percebi onde está a perspectiva "de fora" já que até para mim que estou mesmo de fora, dá para topar que foi tudo mal digerido e bem de dentro.
eheh
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Não faço juizos de valor sobre vós, até porque a todos encontro bons defeitos a par de salutares qualidades. Mas, constata-se novamente que os desalinhados são sempre pólos de "pancada" - é verdade que se põem a jeito, se não fosse isso não desalinhavam...
Aqui na casa, o desarrumo já teve o nome de Miguel, depois foi Nuno... no momento dá pela graça de João. Aqui como no mundo, é a vida, já dizia o santo antónio ;)
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Por acaso o perfil de jardim de infância não liga muito bem, até porque são as crianças que normalmente fazem muitas perguntas, e muitas delas indiscretas.
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Nuno e José,
o que eu queria dizer é mais do estilo 1 Corintios 3:2; Hebreus 5:12-13
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Eu poria porventura aqui umas “nuances”, João.
A noção de pecado original, ou se preferires, do humano enquanto (re)negação originária da fonte da vida e da verdade, é, como noção difusa, uma constante antropológica; de modo nenhum é exclusiva do cristianismo, do judaísmo, do islamismo…
De resto, percebo o que dizes, mas tenho uma experiência eclesial completamente diferente; devo andar por meios eclesiais pouco recomendáveis LOL Quero dizer, há muita gente a tentar dar conta dos seus próprios motivos e motores religiosos, e a enfrentar as suas próprias dúvidas e inquietações, no erro e no acerto, na fuga e na procura. Há muitos “cristãos de hoje”, como sempre houve, mesmo em tempos de mais ou menos tensões identitárias.
E, já agora, também há planos que são puramente afirmativos; claro que se pode explicar os motivos e motores das paixões, mas enfim… ;)
Dá-me ideia que a “doença da Igreja” corresponde ao primeiro parágrafo deste comentário ;) isto é, corresponde à “doença do humano” terrivelmente configurado na intensidade religiosa; deve-se ao facto do “disfarce de anjo da luz”, ou da falsidade só ter poder próprio, precisamente sob as vestes do autêntico; a intensificação da ferida originária, ou se preferires, da consciência do pecado, tem também possibilidades de execução deste, como muito bem viu Lutero (o problema das identificações históricas desta possibilidade, é precisamente… outra história); os demónios entram em tua casa e desarrumam-na enquanto te purificas e enfrentas no deserto… esta é a guerra santa, e dá-se evidentemente com toda a sua força dentro da Igreja, sob formas pessoais, institucionais, doutrinais, etc
O problema é eminentemente existencial: todo o cristão e a Igreja não podem não apropriar-se do “amor e lei de Deus”; essa apropriação é a dinâmica profunda da sua própria constituição enquanto pessoa ou igreja cristãs. Que tal apropriação se inverta no seu contrário, lá está… a letra mata, e por isso a lei sem a sua completude espiritual não passa de “produção da morte”; e esta completude espiritual que nos caracteriza é sempre dada na forma da busca inquieta e na abertura; só a humanização do divino, no mesmo movimento em que é a divinização do humano, pode atravessar tal fio sem soçobrar; e eis um dos motivos do meu cristianismo LOL
abraço, João