sexta-feira, maio 25, 2007
Dogville II... acerca da Graça (Grace), do perdão, da justiça, do amor, da fé, das circunstâncias, da utopia e sei lá mais o quê...
No seguimento do Carlos, ficam os últimos pensamentos da Grace (de Dogville):

"Grace olhou para as amoreiras, tão frágeis na macia escuridão; era bom saber que se não fossem maltratadas estariam ali como sempre na primavera, e carregadas no verão com a incompreensível quantidade de amoras que tornam tão deliciosas as tartes, especialmente com canela.
Grace olhou as expressões assustadas que seguiam atrás das vidraças cada gesto dela, e sentiu vergonha por ser parte do que lhes infligia medo.

Como os odiar pelo que, no fundo, era a fraqueza deles? Teria provavelmente feito o mesmo que lhe havia sido infligido se vivesse numa daquelas casas.
E medindo-os pelos seus próprios padrões, como a acusava o pai.
Falando francamente, não teria ela feito o mesmo que Chuck e Vera e Ben e Mrs. Henson… e Tom, e todas as demais pessoas?

Grace deteve-se.

E nesse instante as nuvens dispersaram-se, deixando passar o luar.
E Dogville sofreu outra das subtis alterações de luminosidade.
Foi como se a luz, até ali tão piedosa e ténue, recusasse continuar e encobrir mais a aldeia. Subitamente já não se conseguia imaginar que amoras reaparecessem nos arbustos; apenas se via os espinhos que lá se encontravam agora.
A luz agora iluminava cada falha e defeito das casas. E daquela gente!
E, de repente, soube qual era a resposta à dúvida dela. Se tivesse agido como eles não encontraria uma só desculpa para os seus actos e não haveria castigo que os punisse. E foi como se a dor dela se tivesse reencontrado.

Não, não havia desculpa para o que tinham feito. E se alguém tinha o poder para os corrigir tinha o dever de o fazer, a bem das outras aldeias, a bem de toda a humanidade. E não em menor grau a bem do ser humano que era ela, Grace."

Tiago Oliveira
posted by @ 8:08 da tarde  
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