quinta-feira, maio 24, 2007
Baralhando e dando de novo...
Tendo chegado a altura de me eclipsar por uns tempos devido a outras solicitações bem mais mundanas (afinal, não só de pão vive o homem mas também), ocorreu-me apresentar-vos o balanço interior que faço e sempre fiz destas discussões teológicas e filosóficas.

Depois de discussões acesas sobre os mais diversos tópicos caros aos respectivos participantes, com tomadas de posição mais ou menos acaloradas, chego sempre à conclusão que bem mais que as nossas posições intelectuais, são os nossos afectos que determinam aquilo que somos. O intelecto vem depois, constroi por cima e em geral tem como função sedimentar e dar segurança a uma posição fundamentalmente afectiva. Assim, não teria muita dificuldade em ver-me a defender as mesmas posições que os meus amigos protestantes caso se desse o caso que eu amasse a Igreja Baptista, ou amasse a Assembleia de Deus, ou a Prisbeteriana ou a Luterana. O que não quer dizer que não ache que a Igreja Católica possui mais consistência teológica do que qualquer uma delas. Mas acho-o, sei-o bem, porque a Igreja Católica me é afectivamente mais cara do que qualquer outra. É este o paradoxo sob o qual os relativistas se confundem, eu creio na Igreja Católica porque a amo e amo-a porque creio nela e mesmo assim, da subjectividade intrínseca aos afectos, professo que ela é a única igreja verdadeiramente de Jesus Cristo.

A minha afirmação de que é absurdo ser protestante nesta terra não decorre portanto de nenhuma posição teológica ou intelectual. Ser protestante em si não é absurdo, mas é-o numa terra em que me é incompreensível amar uma igreja protestante.

Ainda antes de ser católico professo, sempre tive um certo quadro emocional que associava a cada uma das correntes cristãs neste país. Para mim, as igrejas protestantes sempre corresponderam afectivamente àquela mulher nobre e altiva, reservada e que admiramos discretamente, que tem o seu circulo restrito de amigos intímos ao qual nos poderá admitir com facilidade pois já tem por nós uma certa afeição contida. Nesse círculo, sentimos a comunhão e a partilha dos círculos de amigos muito próximos, a intimidade e a confiança são grandes, sente-se o amparo de quem nos prefere a nós face ao resto do mundo. Elogiamo-nos mutuamente pelas qualidades que temos, e cultivamos um certo olhar grupal face ao mundo exterior.

A Igreja Católica sempre a vi mais como aquela mulher viva e de enorme afabilidade, que possui um largo grupo de amigos e conhecidos de variável grau de intimidade. Admirada por muitos, cobiçada por outros tantos, parece seu apanágio mover-se em cada um dos grupos com igual destreza, nunca se deixando prender totalmente em cada um deles mas nunca dando ao mesmo tempo a impressão de se encontrar afastada emocionalmente. Ao mesmo tempo dedicada como se cada um dos seus amigos fosse único mas abrangente no seu tecido de relações. A sua personalidade é multifacetada e ao mesmo tempo simples, as suas áreas de interesse múltiplas, tanto é capaz de privar com um grupo cujo único pretexto de união é o de luxuriantes saídas nocturnas como entabular uma qualquer discussão metafísica com o grupo de intelectuais residente. Desperta cíumes e sentimentos antagónicos numa série de pretendentes, que julgam ver na atenção que ela lhes dedica uma especial afeição da sua parte. É-lhes pesado e díficil o sentimento que "serão apenas mais um", desejariam conter aquela mulher, torná-la sua, mas ela é indomável na sua afabilidade, difícil de aprisionar na devoção universal que presta a todos os seus conhecidos. Muitos pretendentes cortam com ela, sendo-lhes insuportável esta partilha, acabando por preferir as senhoras do tipo enunciado no parágrafo anterior, com a segurança e a exclusividade que oferecem.

Este sempre me pareceu ser o retrato das igrejas cristãs em Portugal. E no meu caso muito pessoal, baseado nas minhas limitações, sempre soube que não poderia evoluir espiritualmente com uma mulher do primeiro tipo. Pois os meus defeitos são precisamente a arrogância de querer ser único, o gosto pelos pequenos grupos de grande partilha intimista quase siamesa. É por isso que das primeiras coisas que disse neste blog foi precisamente que me considerava demasiado arrogante para que alguma vez aderir ao protestantismo fosse para mim salutar. Sempre me assustou a segunda mulher, pela sua independência e pela independência que me obrigava a ter. Mas uma coisa sempre me pareceu ser lei na evolução espiritual. Entre duas opções, deve-se escolher sempre a mais difícil.

Antonius Block
posted by @ 1:03 da tarde  
5 Comments:
  • At 24 de maio de 2007 às 14:04, Anonymous Anónimo said…

    Fixe!

     
  • At 24 de maio de 2007 às 14:10, Blogger Unknown said…

    ei pelo contario é sempre a lei do menor esforço que prossigo qual feixa de lux neste neste abismo escuro... isto é fermat.

     
  • At 24 de maio de 2007 às 14:58, Anonymous Anónimo said…

    Bom post, esse do que acha das igrejas protestantes. Sempre tive curiosidade sobre como os católicos vêm os evangélicos, já que o oposto eu sei desde que era miúdo e é bastante menos light, acredite! Não imagina qual foi a imagem que eu carreguei dos católicos durante anos e anos! Vivia numa espécie de clima de guerra fria religiosa em que vocês eram mesmo Hard Core, malandros e enganosos e tudo!
    Já viu? Não tem piada?

     
  • At 24 de maio de 2007 às 16:59, Blogger Luís Sá said…

    carlinha,

    Também tens inteira razão... Estas coisas têm o seu quê de paradoxal :x

    Em Cristo,

     
  • At 24 de maio de 2007 às 18:20, Blogger Hadassah said…

    Não julgava que fossemos vistos tão "jactantes"...eh eh eh

    Muito interessante esta "confissão"...falta saber se é subscrita pelos demais.

     
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