segunda-feira, julho 09, 2007 |
Da consciência |
E quando a nossa consciência é basicamente momentânea? (que é caso para dizer, quase sempre) Antonius Block
Permito-me discordar meu caro Antonius. E peço perdão por só agora ter tempo, já havia visto as tuas objecções, mas só agora deu… É então assim: a nossa consciência é momentânea no sentido de que o momento é tudo. Nunca se vive no passado ou no futuro, mas agora! já!... Contudo, noutro sentido mais fundamental, a consciência não é momentânea, isto é, o momento presente engloba todo o meu passado e esse passado está presente agora em todo o meu ser.
Quer isto dizer que ser consciente implica duas coisas essenciais, a saber, memória e reflexão; sem memória não há consciência, quando muito um vago e nebuloso sonho animal (os animais terão uma ténue consciência); e sem introspecção do eu também não existe verdadeira consciência, só uma mecânica. Quer isto dizer também, que a consciência é como a corrente de um rio, não podemos isolar instantes e todo o instante antecedente se engloba total e permanentemente no presente (prenhe do futuro). Enquanto ser consciente, tu és agora, tudo o que já foste. Leia-se então o incontornável Bergson: “Não é possível reduzir a duração da consciência ao tempo homogéneo de que fala a Ciência, o qual é constituído por instantes iguais que se sucedem.O tempo da Ciência é um tempo especializado que perdeu por isso o seu carácter original.…Todos os estados de consciência se unificam na fluida corrente da consciência, da qual não se podem distinguir a não ser por um acto de abstracção, e o tempo é, na consciência, a corrente da mudança, não é uma sucessão regulada de instantes homogéneos.” (Henri Bergson, Essai sur les donnés imediates de la conscience 1889) cbs |
posted by @ 11:37 da tarde |
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5 Comments: |
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Caro cbs,
Eu percebi a fragilidade da pergunta e por isso é que deixei novo comentário. Mas tu próprio me percebeste quando dizes que:
"É então assim: a nossa consciência é momentânea no sentido de que o momento é tudo."
Além disso, reportava-me à consciência no sentido estrito de dever moral, de distinção entre o Bem e o Mal. Deparados com escolhas imediatas, há uma decisão a fazer que nem sempre se pode dar ao luxo de estar apoiada numa profunda reflexão anterior a esse momento. O que não quer dizer que tudo o que tenhamos sido anteriormente não culmine nesse momento fundamental de decisão moral. Mas culmina de forma misteriosa e muitas vezes de forma bem longe de ser consciente. Era a isso que me referia.
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Para tentar descomplicar: Quando vemos um morango e decidimos que o vamos comer, não necessitamos de passar em revista todas as imagens de frutos que temos na memória, para decidirmos que aquilo é de facto um morango, nem "revisitar" o arquivo dos milhares de sabores que guardamos, para saber se gostamos de morangos. Toda essa informação está disponível, em cada momento e de forma instantânea. A unica coisa a decidir é querer ou não querer comer o bendito morango e se isso nos é "permitido". Aquilo que nos pode obrigar constantemente a reflectir e reflectir e ainda outra vez aprofundadamente reflectir, é a indecisão, ou a parcial ou completa ignorância sobre aquilo que temos que decidir. Com essa base de dados bem organizada e actualizada (ir aos treinos), podemos de facto viver como se a vida fosse efectivamente uma simples sequência de momentos. Ah, e quando não se trata de morangos, o princípio é exactamente o mesmo. Não me parece que existam coisas muito mais complexas e maravilhosas no seu mistério, do que um fruto, uma flor, um gesto para com alguém... até o bem e o mal.
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certo Antonius... certo Samuel... mas Samuel, por vezes as escolhas são mesmo difíceis. Nessas alturas é que vem ao de cima o "ter ido aos treinos", que no caso significa "ter reflectido" antes e ter princípios anteriormente definidos; aqui julgo que se ajusta muito bem o "imperativo categórico" de Kant, cumprir o dever custe o que custar.
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Caro cbs,
Eu percebi a fragilidade da pergunta e por isso é que deixei novo comentário. Mas tu próprio me percebeste quando dizes que:
"É então assim: a nossa consciência é momentânea no sentido de que o momento é tudo."
Além disso, reportava-me à consciência no sentido estrito de dever moral, de distinção entre o Bem e o Mal. Deparados com escolhas imediatas, há uma decisão a fazer que nem sempre se pode dar ao luxo de estar apoiada numa profunda reflexão anterior a esse momento. O que não quer dizer que tudo o que tenhamos sido anteriormente não culmine nesse momento fundamental de decisão moral. Mas culmina de forma misteriosa e muitas vezes de forma bem longe de ser consciente. Era a isso que me referia.