sábado, junho 02, 2007 |
Uma provocaçãozita para os nossos amigos criacionistas... |
Não é por acaso que este filme aparece aqui. Pena a qualidade manhosa da imagem, ainda por cima logo num filme do Kubrick, que sempre foi muito reticente em ver os seus filmes transmitidos na TV (quanto mais na Net). Sempre foi um purista da tela de cinema. Antonius Block |
posted by @ 4:17 da tarde |
|
26 Comments: |
-
Já te respondi no outro post.
Por muito que goste do 2001, o sentido do filme não é sequer alternativa ao Génesis Bíblico.
Nada desse obelisco e do projectar o osso para o céu nos falam da busca da eternidade pela humanidade. Nem nos falam do sentido do Paraíso inicial e da Queda.
O que o filme tem de espantoso em matéria simbólica, logo nesse iníncio é a representação de duas questões: o divino como presença que acompanha o curso do mundo e do universo e o erguer dos olhos do chão que humaniza e espiritualiza o primata e leva traz consigo o desafio dos limites- o espaço, o céu, a máquina, como pontos de partida da História. Hefaisto e Ícaro é que estão lá. Muito mais do que Adão e Eva.
-
O que há de humano aparece como domínio da força dos primatas uns sobre os outros, aparece como duplo da capacidade de descoberta e de capacidade de se tornar predador do próximo.
-
O obelisco é inteligência criadora. Autónoma e "chamânica". E ela que impele a evolução e que se mantém como mistério numa espécie de fita moebius.
-
Eu não disse que o filme dizia que se tratava do Deus cristão, muçulmano ou judeu. Ou de Deus sequer.
O que gosto no 2001 é que a Humanidade surge quando surge o Mistério. Impenetrável, que observa sempre a evolução da Humanidade até ao seu misterioso término. Tu própria o disseste... Mas demonstra como a história de uma inteligência criadora não é incompatível com a evolução e por isso é que me lembrei do filme. Já não tem nada que ver com Adão e Eva...
Também este filme é alegórico, não defendi uma visão à letra do que diz...
-
Exacto. E lembraste-te muito bem. È o filme que melhor "fala" do assunto.
Eu também me expliquei mal. Concordo contigo que, numa perspectiva evolucionista é o melhor exemplo da tal inteligência divina que está presente à própria Criação (não sendo por isso exclusiva a crença com a ciência).
Só me lembrei que nada disto se associa directamente à riqueza simbólica do Adão e Eva do Paraíso.
Quem fala muito melhor dessa simbólica e dessa criação é o David Lynch. No Grandmother e depois no Eraserhead. Aliás, estou até convencida que este é um tema dominante do Lynch, ainda que não o mostre pelas formas mais "canónicas".
Digo isto porque tive de pegar no tema das duas Árvores (a da Vida e a do Bem e do Mal) e é neles que a riqueza e profundidade da mensagem atingem um valor muito superior.
Por acaso até estou neste momento a trabalhar sobre o assunto. Daí o aparte. A MC referiu até um outro sentido de Eternidade enquanto qualidade e não tempo que é extremamente importante. E é algures por aqui que se vão demarcar (ou misturar) os sentidos míticos da àrvore da vida (essa sim, comum a uma série de civilizações) e a do Bem e do Mal- com sentido diferente, em que o Bíblico não me parece superado por mais nenhuma leitura não religiosa (ainda que não tenha certezas acerca deste último aspecto).
O que é diferente e até oposto é o sentido da Queda por desobediência- a expulsão e a semente que Adão trás (que vai ser o lenho da cruz de Cristo) e o sentido do 2001. No 2001, o Kubrik fala de um desafio que é saber. Quando o macaco eleva a cabeça para o céu e projecta (sem qualquer sentido prático) o osso no ar, está a falar disso mesmo- do erguer os olhos da condição animal e elevar o espírito à ultrapassagem dela. E daí temos a nave e o espaço a girar, e estamos em 2001 de ficção científica.
Este é o mito do Efaisto e do Ícaro. O mito de Babel e de Nimrod, dos construtores e dos engenhos, do fogo e do voo, o mito da ilumiação da razão.
Ora a religião católica não trata o Genesis propriamente neste sentido- excepto na ideia da semente da árvore da eternidade, que é coloada na boca de Adão, aquando da Expulsão. Mas a finalidade não é a mesma. A ciência, o saber, as descobertas, o conhecer do mundo, sempre foram tratadas como vanitas. Como vaidades vãs a que a morte põe termo ou o tempo se encarrega de mostrar a sua efemeridade. Ligadas à única salvação que é a fé, à qual não se chega pelo exercício do saber e da Razão.
-
Submersos em tanta erudição, falta aos católicos algum pragmatismo. Criacionistas. Com i.
-
ahaha Deixa lá que o Desidério Murcho já fez erro igual. Assim eram carnívoros
":O)))
-
Agradecido Tiago.
É a (má) influência inglesa. Acaba-se por ler mais a palavra escrita em inglês que em português.
-
"Uma provocaçãozita para os nossos amigos criacionistas..."
Julgava-te dentro do "club"!? Mas já estou confusa...
-
No meu caso é assunto em que nem entro .Não entro na oposição. Mas já escrevi que chegue sobre o assunto no Comedor de Gafanhotos
-
E nunca percebi o motivo pelo qual os Criacionistas temem tanto o evolucionismo. Mas acerca disso quem mandou a boca mais fantástica foi o Tim
-
Temer o quê Zazie?
O evolucionismo não é filme de terror para os criacionistas, é antes uma comédia... Eh eh eh
-
Eu não falei em filme de terror. E ainda menos percebo onde é que pode estar a comédia.
Qualquer crença que seja incompatível com o saber da humanidade fica reduzida a superstição.Não há comédia nisto. A menos que se considere ignorantes os crentes.
Esta é questão que só se resolve separando o maravilhoso religioso da verdade factual histórica. E nem vale a pena ficar à espera de provas ou contra-provas da evolução das espécies. Penso eu. Pelo menos, nunca poderá ser colocada em termos equivalentes.
Só assim ninguém se ri de ninguém, nem a fé terá obrigatoriamente de ser prova de ingnorância.
Sendo que as tentativas teóricas de conciliação de criacionismo com evolucionismo ainda me parecem mais disparatadas.
-
zazie,
"Esta é questão que só se resolve separando o maravilhoso religioso da verdade factual histórica."
Aí é que acho que te enganas. Isso é forma muito em voga de um escondido obscurantismo. Jesus existiu ou não existiu. O mesmo com Adão e Eva. E se se começarem a juntar indícios incontestáveis que assim não foi (indícios sérios, não esta palhaçada), então a fé cristã tem um problema.
Nunca a fé cristã se escondeu atrás "do maravilhoso". Desde a escolástica (bem sei que não gostas) que o cristianismo, para o bem e para o mal, conviveu com a senda de conhecimento do mundo natural, que nunca lhe foi indiferente e sempre soubre reflectir sobre ele e integrar na própria fé. É essa a grande virtude e a grande fraqueza do cristianismo. Dizer que são duas realidades separadas quando a coisa começa a ficar díficil é que é fraquinho. Prefiro o Teillard de Chardin para isso (embora haja muita coisa de duvidoso nas suas teorias) e embora achando que o Inteligent Design não tem ponta por onde se pegue, ao menos é honesto na necessidade de integração da ciência (ou no caso deles, pseudo-ciência) com a fé.
O que advogas, e que oiço todos os dias de católicos sobretudo, é no fundo inventar uma separação higiénica e clara que nunca existiu. Senda de conhecimento no ocidente é senda de conhecimento no ocidente, ciência e religião. Se a ciência se universaliza cada vez mais e o catolicismo se advoga como hermeticamente separado de qualquer postulado cientifico, está a condenar-se a morte certa e a uma rotura da forma ocidental de busca do conhecimento.
-
Eu não quero provar o cristianismo cientificamente. Não preciso nem nunca precisarei.
Tu é que queres o contrário, queres salvaguardar o cristianismo do confronto com a ciência.
Por isso é que citei São Paulo sobre a ressurreição. Porque São Paulo põem-se em posição humilde: ou existe ressurreição e então Cristo ressuscitou, ou não existe e isto é absurdo. É posição de fragilidade, não de força.
-
Já te respondi no outro poste mais abaixo.
Estás enganado. O que eu digo não ouves tu a uma data de católicos e muito menos tem proximidade com revisionismos à Anselmo Borges
Tu esqueces-te sempre que eu nem me intitulo propriamente uma católica.
O que eu penso e o modo como penso estas questões é bem diferente do que percebeste.
É algo que faz a conciliação dos opostos. Que ultrapassa o princío da identidade. Mas não é, nem nunca foi, uma forma de obscurantismo. E consigo separar esta minha visão de lenda e maravilhoso (a lenda é real, a partir do momento em que faz parte do mundo) da forma de trabalho estritamente racional da ciência.
Ou seja, o que eu faço é o oposto de me rir destes disparates evolucionistas como fazem os protestantes. Porque, nem a pequena fé em Deus que tenho depende das provas científicas; nem a crença é tão dominadora que passaria me fecharia ao saber.
Não junto, não faço sínteses de criacionsimos e evolucionismos porque convivem em níveis diferentes na minha cabeça.
E nada disto é assim por esforço. É assim naturalmente. Sempre o foi, com muito mais questões.
Detesto obscurantismos e irracionalidades no que toca ao pragmatismo. Mas também nunca apaguei o imaginário para o reduzir a uma variação comtiana.
A fé não anda obrigatoriamente por aqui. Não anda em todas as questões, melhor dizendo. Nesta não anda muito.
-
"Tu é que queres o contrário, queres salvaguardar o cristianismo do confronto com a ciência.
errado. Não me entendeste.
Quem faz isso são os protestantes que se riem das possíveis provas científicas.
Quem faz isso são os que inventam terceiras vias entre criacionismo e evolucionismo.
Eu estou fora disso. E não é para salvar o Cristianismo que assim entendo estas questões.
Já te expliquei que me acontece o mesmo se quiserem deitar as unhas ao Afonso Henriques, tal como acontece o mesmo quando inventam maneiras de negar a existência de Marco Polo.
Eu vejo isto como o Baudolino do Eco.
-
"Mas porque mo dizes a mim, mestre, e não a Rathewino? —Porque Ratewino não tem fantasia, só pode contar o que tiver visto, e certas vezes nem isso, porque não compreende o que vê. Tu, em contrapartida, podes imaginar o que não viste.”
-
ah bom, é uma questão que não te faz perder muito sono e que nada tem que ver com a tua busca de Deus individual ou a tua relação com o cristianismo. De acordo, também eu não vivo disso, nem descobri Cristo num livro de Chardin.
Mas acho que isso só nos deve fazer relativizar no fundo o nosso próprio conhecimento e sentimento. Gostamos de umas dimensões do cristianismo e aderimos a ele por isso. Não podemos interessar-nos sobre todos os ângulos (não me poderia estar mais marimbando para o código canónico por exemplo) nem seria natural que o fizéssemos. Seria o mesmo que gostarmos de todas as áreas do saber. Aqui há muito de feitio e personalidade.
E tal como tu, não perco o sono a tentar compatibilizar fé e ciência. Sei aliás demasiado pouco de ambas para que veja qualquer contradição que me afliga. Para mim é tudo ignorantemente e humildemente compatível. Mas reconheço que outras pessoas devem fazer o esforço...
-
E este compreender melhor por "imaginar o que não vi" não é fé.
A noção de sagrado não é fantasia. A crença em Deus não é fantasia desta ordem.
A segurança dela não depende de provas científicas.
Uma coisa são factos históricos (e a existência de Cristo está provada naquilo em que pode ser provada) e outra é o divino (a ressurreição nunca poderá ser provada ou negada cientificamente).
O facto do sobrenatural não se provar também não é sinónimo de fé religiosa- qualquer obscurantista que acredita em magias seria crente e, nesse caso, a crença era imbecilidade.
Se não existisse separação em tudo isto, então os ateuzinhos militantes tinham razão em dizerem que um crente é um influenciável irracional.
E se não existisse diferenças de ordem entre isto e relatos de criação, então a crença era apenas uma variante do espírito de pesquisa científica.
-
Resumindo: um relato do Genesis não é equiparável a Deus, nem um relato todos os relatos da Bíblia são da mesma ordem simbólica ou histórica.
Há simbolismo e maravilhoso, assim como há factual histórico e a fé não depende do grau de "aperfeiçoamento" destas variantes.
-
Acreditar na virgindade de Maria é uma coisa; achar que é preciso acreditar-se que tudo começou com um casal igual a nós chamado Adão e Eva, ao mesmo nível da crença na virgindade de Maria é outra coisa.
Para mim é um erro, fazer-se isso. Nem o consigo pensar.
-
-
Não era sarcasmo... Era enunciar algo no qual pelo menos eu próprio me revejo...
zazie eu não perco mesmo sono por isto, quanto mais ser sarcástico ou qualquer outra atitude de sobranceria para com outros.
Sobre outros assuntos talvez, sobre a criação é mesmo um dos quais não me sinto minimamente tentado a menorizar quem quer que seja...
-
Eu li melhor e vi que não era e foi por isso que apaguei. Pareceu-me mas foi por ter lido à pressa.
Foi aquela frase do "não tirar muito sono".
Creio que não entendeste nada do que eu disse mas deixa lá. Nem eu própria entendo.
Apenas quis justificar teoricamente que o sobrenatural é uma coisa, a fé outra, a lenda outra e que o relato do Genesis, quanto a mim, pela forma como me relaciono com a crença, anda mais perto da lenda.
E nunca me afetaria a crença precisamente por isso. Com lendas sem eu conviver nas calmas. E com a ciência também.
-
Ok. Percebo a tua posição melhor que os revisionismos do Anselmo Borges mas acho que, teoricamente, misturaste questões distintas.
Nos dogmas da fé não é propriamente o casal primoridal que estão em causa mas a Criação divina. E nas provas científicas ou históricas nunca entra o sobrenatural. O relato do Genesis não é sobrenatural, a ressurreição, sim.
|
|
<< Home |
|
|
|
|
Um blogue de protestantes e católicos. |
|
Já escrito |
|
Arquivos |
|
Links |
|
|
Já te respondi no outro post.
Por muito que goste do 2001, o sentido do filme não é sequer alternativa ao Génesis Bíblico.
Nada desse obelisco e do projectar o osso para o céu nos falam da busca da eternidade pela humanidade. Nem nos falam do sentido do Paraíso inicial e da Queda.
O que o filme tem de espantoso em matéria simbólica, logo nesse iníncio é a representação de duas questões: o divino como presença que acompanha o curso do mundo e do universo e o erguer dos olhos do chão que humaniza e espiritualiza o primata e leva traz consigo o desafio dos limites- o espaço, o céu, a máquina, como pontos de partida da História. Hefaisto e Ícaro é que estão lá. Muito mais do que Adão e Eva.