sexta-feira, dezembro 15, 2006
a pequenez da agulha
E pronto. O Tiago fica todo contente quando julga arranjar um pretexto para manter uma distância higiénica com os católicos (embora o José, com a sua mania do relativismo ecuménico, se apressasse em lhe estragar a festa). E então, no uso de uma retórica digna de um teólogo alemão do Vaticano (no bom sentido), vem dizer-nos que Jesus, se disse que o bom pastor deixava as 99 ovelhas em busca da perdida, queria dizer que deixa uma mais uma mais uma mais uma (até 99), para ir buscar uma que era igual às outras. Ou quando nos relata as alegrias do pai pelo regresso do filho pródigo quer dizer que aquela é uma alegria igual à que sente todos os dias na companhia do filho que ficou. O que é bom aos olhos do Senhor é o puro e jovial individualismo: quando estiver um a falar sozinho em Meu nome, eu estarei com ele, terá pensado Jesus antes de se enganar a proferir as palavras de Mateus 18:20.
Ou o que queria dizer Tiago (o outro), com «Ouvi, meus caríssimos irmãos: porventura não escolheu Deus os pobres deste mundo para que fossem ricos na fé e herdeiros do Reino prometido por Deus aos que o amam?» (Tiago, 2:5); ou ainda «Se a um irmão ou a uma irmã faltarem roupas e o alimento quotidiano e algum de vós lhes disser: Ide em paz, aquecei-vos e fartai-vos, mas não lhes der o necessário para o corpo, de que lhes aproveitará?» (Tiago, 2:15-16); ou as primeiras instruções da Igreja nascente que S. Paulo relata: «Tiago, Cefas e João, que são considerados as colunas, reconhecendo a graça que me foi dada, deram as mãos a mim e a Barnabé em sinal de pleno acordo: iríamos aos pagãos, e eles aos circuncidados. Recomendaram-nos apenas que nos lembrássemos dos pobres, o que era precisamente a minha intenção» (Gálatas 2:9-10)? Palavras dúbias e ofensivas dos espíritos livres, demasiado complexas para um entendimento latino.

A opção preferencial pelos pobres que a Igreja deve assumir é uma opção primordial pelos que sofrem, pelas vítimas, pelos explorados (há que não ter medo das palavras), pelos pecadores. Não é a Teologia da Libertação, caro Tiago, caro José. É expressão da caritas, ou de uma forma especial de primado na prática da caridade cristã, testemunhada por toda a Tradição da Igreja. Diz respeito à vida de cada cristão, enquanto deve ser imitação da vida de Cristo e aplica-se igualmente às nossas responsabilidades sociais e, por isso, ao nosso viver e às decisões que temos de tomar, coerentemente, acerca da propriedade e do uso dos bens (Sollicitudo Rei Socialis, n. 42; Centesimus Annus, n. 11) . Dos bens materiais (também). Do vil metal com que se compra o pão.

Mas em que é que ficamos, amigo Tiago?: «não será casual que os países com menos pobres são países desenvergonhadamente protestantes»? Ou, «se analisarmos o vigor da religião nos dois países», na Noruega precisam mais de Jesus do que no Uganda? Ou podemos concluir que nos países desavergonhadamente protestantes precisam mais de Jesus?

Carlos Cunha
posted by @ 2:58 da tarde  
3 Comments:
  • At 15 de dezembro de 2006 às 18:05, Blogger zazie said…

    Exacto! é a caritas! é a misericórdia. E a misericórida não impõe condições nem aplica manuais de carreira mundana.A virgem oferece a protecção do manto a todos.

    Não tem nada a ver com carcanhol. Esse vício do homo economicus é que é uma paranóia marxista-liberal

    Bom post. Boa explicação. É bom que se distancie a Bíblia da ideologia.

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 23:29, Blogger Pedro Leal said…

    O problema é a palavra “preferencial”. Deus não tem preferências (Romanos 2:11), não descrimina por sexo, por raça ou por condição social (Gálatas 3:28). E esta é uma das facetas da Boa Nova: os pobres, os excluídos, os vencidos, já não estão no patamar de baixo. Estamos todos ao mesmo nível, somos todos pecadores (Romanos 3:23) necessitados da graça de Deus. Porquê, então, ter preferência por um determinado grupo?

     
  • At 17 de dezembro de 2006 às 13:12, Anonymous Anónimo said…

    Interessante esta reflexão. Hoje fala-se muito da responsabilidade social (numa perspectiva de caridade, dão-se donativos, víveres, etc). Mas é preciso fazer muito mais do que isso...estas acções não passam de "anestesias" ... é preciso ensinar a saír dos problemas. Precisamos de dar a "cana da pesca" para as mãos, em vez de se dar o peixe. E nisso creio também que nós protestantes estamos bem mais à frente ... apesar de alguma falta de organização e de institucionalização das acções.

     
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