sexta-feira, dezembro 15, 2006
A opção radical do individualista
Ora aí está. É sugerir que se vai pegar nos pobres, a menina dos olhos do catolicismo progressista e liberal, e é vê-los a pegar nas mocas de Rio Maior.
Calma, irmãos.
A Zazie espera já que defenda que a Bília faz a apologia do capitalismo liberal (eu sei que o Armagedão bloguístico da guerra do Iraque foi há pouco tempo mas não há razão para tanto frissom). Vale-me que o Miguel, calmo, revela-se mais próximo do espírito das bem-aventuranças (natural e selectivamente incensadas pelo CC dentre os muitos ditos de Jesus).
Dizer que a "a opção preferencial pelos pobres" é o que de mais radical existe na Boa Nova do Evangelho é o mesmo que dizer que a opção preferencial pelos leprosos é o que de mais radical existe na dimensão sanitária da Boa Nova do Evangelho. Basta contar os contactos de Jesus com doenças e lá estará, provavelmente destacadinha no pódium, a mycobacterium leprae bacterium. O que me leva a questionar: o que terá feito de uma parte importante da mensagem de Jesus o centro da fé de muitos cristãos? E aventuro-me a responder, com a falta de rigor histórico e excesso poético que me caracterizam.
A "opção preferencial pelos pobres" é user-friendly. Proporciona aquele agradável ricochete de eco ético com que Nietzsche tanto antipatizava.
A "opção preferencial pelos pobres" é radio-friendly. É o que nunca embaraçará a Igreja aos olhos do mundo porque o trabalho é feito, é feito em quantidade, e é feito em qualidade.
A "opção preferencial pelos pobres" é ideologically-friendly. É a única maneira de juntar à mesma mesa uma drag queen, um sacerdote cristão e o neto de Wittgenstein. Todos sairão amigos, acabados de mastigar sindicalmente o pão que deve estar em todas as mesas do planeta.
Pessoalmente não tenho problemas com quaisquer dos três aspectos levantados. Que é o mesmo que afirmar que a Igreja tem uma responsabilidade com os pobres. Mas a Igreja não se limita a esta responsabilidade com os pobres. A bem da lógica do argumento, pergunte-se também: tem-se a Igreja limitado a esta responsabilidade com os pobres? Com alguma razoabilidade, creio que sim. Por que não deve a Igreja limitar-se a esta responsabilidade com os pobres?
Porque, como diz o Luís Aguiar Santos, os da Noruega precisam tanto de Jesus como os do Uganda (até precisarão mais, se analisarmos o vigor da religião nos dois países). Porque Cristo não é o funcionário de uma ética social. Porque a redenção não é um upgrade moral e falta-me o amor cristão para acrescentar mais coisas óbvias.
Só uns apartes que a Zazie bem merece. A "falsa pobreza de uma garagem evangélica, onde depois se defende por palavras o benefício e a virtude do carcanhol na algibeira" será sempre a razão que a levará a preferir o conforto estético da sua condição de ajudadora dos pobres. O conforto que os pobres proporcionam é encontrar neles o amparo para não nos revermos nesse mesmo estado de pobreza. Ou seja, se a grande missão estiver ali materializada no cuidado com os pobres eu posso dar como resolvida a minha necessidade espiritual. O que a Zazie, como muitos outros, parece não tolerar é que os evangélicos metam Jesus em tudo. Até no bolso dos outros. Afinal, parece que há coisas mais sagradas.
Como curam os evangélicos os necessitados? Metendo-lhes Jesus pelos olhos adentro. Perguntem aos drogados do Desafio Jovem. O problema da droga resolve-se com Jesus. O problema da pobreza resolve-se com Jesus. Não será casual que os países com menos pobres são países desenvergonhadamente protestantes. O defeito que encontro em muito catolicismo é que, concentrando-se na "opção preferencial pelos pobres", preserva Jesus, bonitinho e altarizado bem ao gosto da Zazie, fora dos corações das pessoas e dos seus próprios. Entretidas, dirão que há muito para fazer. Os pobres, a quem nunca deram a possibilidade de abandonar a pobreza enfiando-lhes Jesus pelos olhos adentro, esperarão o seu pressuroso empenho social.
Vão por mim: um pobre protestante tem mais possibilidade de o deixar de ser que um pobre católico. Não temos prazer em ajudar os pobres. Temos prazer em que deixem de o ser. Por isso temos muita classe média (a razão real do repúdio estético da Zazie) e pouca riqueza (porque não se enriquece facilmente em países católicos).
O que o Miguel devia ter escrito, bem ao jeito do católico G.K. Chesterton, era “há algo de mais radical na Boa Nova dos Evangelhos - a opção preferencial por mim”.

Tiago Cavaco
posted by @ 1:39 da tarde  
8 Comments:
  • At 15 de dezembro de 2006 às 15:47, Blogger Jorge Oliveira said…

    É. Se não existissem pobrezinhos como é que a abastada igreja católica podia conquistar o céu? Dão imenso jeito aos prosélitos da salvaçãozinha pelas obras. Até são os pobrezinhos e os esfarrapados que abrem a porta do céu aos católicos... lol

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 16:02, Blogger Pedro Leal said…

    Nós também temos a salvaçãozinha pela fezinha, caro joicantinho.

    CC

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 16:08, Blogger Jorge Oliveira said…

    E que nunca te faltem essas fezes, caro(a) CC.

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 16:19, Blogger josé said…

    essa agora! querem ver que o plural de fé é fezes?!...

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 16:31, Blogger Bastet said…

    Nós, vós e Ele. "A minha fé é melhor do que a tua". "Vão por mim que deixam de ser pobres...". E a mim que me parece que o que há de mais revolucionário em Jesus é o Amor. E a mim que me parece que o Amor se revela em actos, em obras, na ajuda ao próximo, na fé. E a mim que me parece que se caíu aqui no facilitismo de achar que toda a caridade é caridadezinha. E ao final no que ficamos? É a Igreja Católica que por ser abastada deve ser condenada ou é a fé Protestante que há-de ser abraçada porque nos garante uma razoável estatuto de sobrevivência na classe média?

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 17:12, Blogger zazie said…

    Tiago: não seja tolinho com essa das mocas de Rio Maior. Esperava menos complexos ideológicos da sua parte. Para comunas ressabiados já me basta o que aturo há décadas.

    O que eu disse seguiu-se ao tom triunfante com que proclamou esse “combate aos pobres”.Até parece que seria uma grande virtude a Bíblia ter andado a atacá-los. Porque, para isso, é que já nos basta o v.s evangelhos do Hayek


    Depois tira para aí umas ilações perfeitamente gratuitas. De tal modo que nem sei se vale a pena responder. Estou de partida para terras de Sua Majestade, estamos no Natal, o que é preciso é paz.

    Ainda assim, como também é um privilégio v. dignar-se a responder a um comentário aqui fica:

    “O que a Zazie, como muitos outros, parece não tolerar é que os evangélicos metam Jesus em tudo. Até no bolso dos outros. Afinal, parece que há coisas mais sagradas.”

    Eu estou-me nas tintas para os evangélicos. Como me estou nas tintas para todas as instituições, incluindo o Vaticano.

    Já expliquei que o meu gosto por religião é mais cultural e estético que outra coisa. Por isso, v.s podem meter o bedelho onde quiserem que por mim é igual ao litro. O mal fizeram já está feito e, para mim, consiste apenas na destruição de património por causa das manias do puritanismo.
    Quanto ao resto nem sei. Nem percebo o motivo para se vangloriarem dessa foleireice de missas em armazéns quando eu vou para a Bélgica e a Inglaterra e os protestantes dizem-nas em Igrejinhas lindas e bem cuidadas e com coros magníficos que nada têm a ver com a foleirice da rockalhada e outras anormalidades americanóides.

    Quanto ao prazerzinho que tê m em que os pobrezinhos sejam riquinhos dispenso essa fantochada para as tias dos Hospitais.

    O c*****! Que justiça e misericórdia é precisamente a mão que se oferece a quem está em baixo. Se lhe quiser aliviar a algibeira tudo bem. A vantagem do catolicismo também sempre foi essa- é bom que os ricos aliviem as algibeiras. E é bom que sejam ricos para as aliviarem mais. Ora isto é o oposto da beatiticação da acumulação. E ainda mais- nada tem a ver com a noção de justiça-

    Por outras palavras- é claro que o Cristianismo dirige-se a todos, sejam ricos ou pobres. A salvação não tem nada a ver com isso. Agora o que o cristianismo não é, nem nunca foi- é um manual de práticas de riqueza como boas obras para se atingir a Redenção.

    Isso é folclore americanóide. Se o querem vender, por mim, também me estou nas tintas. Mas não se admirem que apanhem com os gozos. Gozos sem complexos mas gozos com os novos deuses do liberalismo às cavalitas na Bíblia.

    Bom Natal e fique coll que também gosto das suas rocalhadas
    beijinhos

    ";O))

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 17:18, Blogger zazie said…

    Mas realmente... essa do deixem de ser pobres é cá uma coisa...

    Mas esteja à vontade,Tiago, se quiser exemplificar comigo eu dou-lhe já o NIB.
    Cative-me para a causa; alivie-se todo, que assim é que é um menino bonito.

     
  • At 15 de dezembro de 2006 às 17:26, Blogger zazie said…

    mas esta frase é que foi o cúmulo da paranóia classificativa. Digna de um velho comuna de camisa aos quadrados, tatuagem no braço e cheiro a presunto:

    "Por isso temos muita classe média (a razão real do repúdio estético da Zazie) e pouca riqueza (porque não se enriquece facilmente em países católicos)."


    Mas que c***** de repúdio de classe é que acha que eu poderia ter, ó seu tolinho?

    Não sabe que a única classe que eu admiro é a dos Leopardos de Lampedusa?

    Caralhos fodam os pobres e os novos-riquinhos

     
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