quinta-feira, junho 18, 2009 |
Do martelo e da aurora |
para Klatuu Niktos
Mas o eterno enquanto rosto de Deus, não corresponde à intemporalidade da idealidade, seja à de um teorema seja à dos estertores da beleza, e muito menos às cristalizações da mente assustada; corresponde sim à interrogação: Onde isto tudo que desaparece irrevogavelmente? Pois o fiat da vida é o seu próprio decorrer; viver executa-se enquanto crescente aniquilação de si. E o eterno, precisamente, não trata aqui da retenção ou retorno do que há, mas da voz que fala no próprio não-haver.
Para um cristão, o último acto está sempre por ocorrer, e a temporalidade não resolve a sua perca retornando a si mesma; e é esta incapacidade estrutural e dinâmica de se refazer, que pode ou não abrir para algo de inesgotável que advém na própria perca.
A fé não trata de preencher a negatividade temporal com o sonho da imortalidade, nem de dar forma imaginária às forças obscuras do ser e da vida: a fé trata de um diálogo limite com o nada, com o não-havendo da vida que se escoa, consciência funda da palavra orante, a que não cala o silêncio nem confunde o eco. Deus é a voz que fala no deserto do mundo, não porque negue este, mas porque é este mesmo que se nega a si próprio no seu próprio acontecer: o fogo da terra alimenta-se da sua própria combustão, e a sua eternidade é uma dor sem fim no abismo da negação; mas aquele que olha o vazio de frente, vai ao fim da vertigem do tempo, e escuta o Deus que se revela na impossibilidade da combustão se doar a si mesma: o sem-nome, o da peregrinação naufragada no murmúrio da incessante busca; este é um Deus que dança no fundo do próprio abismo, quando a corda ou o nosso porvir próprio se quebram ou largam; e é também um Deus que lança cordas e porvires, e que na sua humanidade caminha por cima do tempestuoso abismo, no centro mesmo da vertigem; e que diz que a mais pequena ternura, a mais pequena pedra da menos notória berma – são já vitória e fundação.
Eis um Deus que dança, não a música da terra, nem a das esferas celestes ou das fúlguras ideias e paixões; são antes estas que a música do Deus dançam, em ponto e contraponto, ilhas e afundamentos. De que nos valeria a leveza, se não erguesse o peso do mundo? . vítor mácula |
posted by @ 5:37 da tarde |
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20 Comments: |
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A tua poesia filosofica dá cá um trabalho! leio, releio aos bocados e vão aparecendo sentidos, duvidas, discordancias e concordancias. No fim acabo aderirndo e mainada, como quando leio um poema do Pessoa :)
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abraço, pá, bom fim de semana :) PS: Fernando Se-abra Pessoa e nietzsche batatóides
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Este final está muito à "S. Cristóvão- lindíssimo.
«Serás tu alguém que tenha o direito de se livrar de um jugo? Há quem perca o seu último valor ao libertar-se da sua sujeição.»
Nietzsche, Assim falava Zaratustra
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pois.
o cristianismo visa alto e fundo; e raros são os seus contrapontos à mesma altura e profundidade
“Se faço guerra ao cristianismo, de tal tenho direito unicamente porque nada vivi deste lado de desgosto ou tristeza – pelo contrário, os seres mais dignos de estima que conheço foram cristãos autênticos, e de todo não guardo rancor aos indivíduos por aquilo que é fatalidade milenar. Os meus próprios antepassados eram eclesiásticos protestantes: não tivesse eu recebido deles um sentido elevado e puro, não vejo de onde me viria o direito de fazer guerra ao cristianismo. Em ocorrência, a minha fórmula: o próprio anticristão é a lógica necessária na evolução de um verdadeiro cristão, em mim o cristianismo ultrapassa-se a si mesmo.” (Nietzsche, Fragmentos póstumos, KGW, VIII)
S. Cristóvão pois também; ou a rã salvando o escorpião da maléfica natureza enquanto afundam ambos ;)
bjocas
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PS: todos somos a rã E o escorpião.
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Apanhas o que interessa no Nietzsche e que nada tem de ateu, e ainda tens a lata de dizer que não és filósofo?
ahahaha
Beijocas
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A propósito, também me deu para oferecer uma prendinha ao Klatuu.
Imagina qual?
ehehehehe
Foi uma grande maldade.
":O))))))
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Ando a dever-te, ripostes ciorânicas, corânicas, hispânicas, lusitanas... e sei lá mais o quê! Vou ver se me concentro, e se me sento.
Abraço!
P. S. A Zazie não anda bem: parece quase um ser humano! :)
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Maninho: Pq vc não se candidata a síndico do Inferno de Dante? :P
Beijos
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Vitor: Mil perdões. O Klatuu mandou-me por e-mail este post e essa proprosta amável foi pra ele. Eu sempre adoro os teus textos e sempre admiro ver um cristão t~~ao progressista. Será que quando eu for gente grande serei assim? Beijos.
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Não deveria ter pedido desculpa... cristão gosta de apanhar... JAJAJAJAJAJAJA!!!
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P. S. Não me «descorrompas» a criança, que tenho tido um trabalhão a pervertê-la... :)
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Klatuu: É bem capaz de chegares no Inferno e o Capeta te pedir autógrafo...JAJAJAJAJA!
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quanto mais filosofia estudo e esboço, mais me apercebo que filósofo não sou, Zazie; a minha zona é o lirismo de tasca e nobreza LOL o que me permite dar tempo ao que precisa, nomeadamente alguma filosofia, que é como se sabe uma dama exigente pois a sua paixão não é a resolução mas a interrogação, na contramão do que (não) pensam alguns ideólogos e doutrinadores de vários serviços. mas enfim, as belas damas e belos senhores têm sempre as suas exigências e resistências, caramba, o fácil nunca foi nobre ;) bjocas
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Huuuuum… na. Penso que o que está a dar é irmos pela gratuidade de tasca e nobreza: nenhuma dívida, e sem afogueamentos apressados: There is no time, diz a vida; I will make time, responde o Steven Brown ;) e atenta que o tio Friedrich dizia que as ideias sentadas eram a morte do filósofo LOL Abraço, Klatuu PS: pois, tenho ouvido queixas, mas eu cá até acho que a Zazie é de bom e humano conselho; é por vezes um pouco desbocada e descontrolada, outro pouco como um certo gajo que blog-anda para aí de machado nas mãos JAJAJAJAJAJAJAJAJAJA!
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o Klatuu é um abusador, biazinha, mas é bom rapaz e os seus abusos são generosos JAJAJAJAJAJJAJA! progressimo? na. há boas e más inovações, boas e más tradições; o progressismo é uma alienação, tal como o tradicionalismo, aliás. de resto não sei, nunca fui grande ;) tentar ser si próprio, construir-se e encontrar-se na tradição e no progresso, já me parece tarefa suficientemente árdua. Bjos!
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bem, isto hoje é dia de “na” LOL cristão não gosta de apanhar, cara, mas cristão sabe que no tribunal dos homens levará sempre na corneta; e quanto à criança, parece que Deus lhe deu um coração verde verdadinha que a protege e orienta; aqui Sun Tse diria: Muitas vezes o guerreiro percebe a sua fraqueza, pois a criança vence a batalha em que nem sequer combate; e Lao Tzu acrescentaria: O vento percorre o arrozal, e espada alguma consegue fendê-lo ;)
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o inferno é o reino da divisão absoluta, em que cada eu é o contrário destrutivo de si próprio e do outro; e Dante não precisou de instanciações Auschwitzianas para se aperceber de tal feroz possibilidade no coração dos homens; como se sabe, Florença é pródiga no seus filhos LOL
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ehehehe
Realmente só mesmo um gajo mais louco e desbocado que eu para me encontrar ligeiras aproximações ao humano
ahahahahahaha
Beijocas.
Eu não ando numa à Texas Chainsaw Massacre mas às vezes lá me obrigam a passar rasteiras a algumas imitações de garagem.
":OP
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A tua poesia filosofica dá cá um trabalho! leio, releio aos bocados e vão aparecendo sentidos, duvidas, discordancias e concordancias. No fim acabo aderirndo e mainada, como quando leio um poema do Pessoa :)