segunda-feira, março 10, 2008
O sentido do amor depois de Cristo
“Mas eu creio que o amor é isso, Susana. Não poder repousar por causa do mistério dum ser!... Eu queria aceitar-te completamente, no que é claro e no que é obscuro, em tudo o que conscientemente me dás e em tudo o que implica a tua simples existência. O facto de seres minha não impede que sejas tua, doutra sorte não serias mais do que uma coisa. O meu ciúme acabaria por negar-te o carácter de ser humano. E é um ser humano que amo. E não te imagino subjugada, mas livre e como que repetindo a cada instante o sim do nosso matrimónio.”
Paul André Lesort, Les reins et les coeurs - 1946

O significado ultimo do amor autêntico não consiste pois em submeter alguém. Consiste em promovê-la. Eis para mim uma lição de Cristo, talvez aquela que mais me tocou.

O erro de Sartre - lá estou eu com os erros dos filósofos, lol - estará em ter definido o amor mais como posse do que como promoção. Não terá compreendido bem o papel do sofrimento no amor: está ligado ao exercício da generosidade e não só ao insucesso do desejo de dominar (lá vejo Nietzsche a influenciar…).
É o amor que renova e recria, por excelência. Por isso, está ligado ao sacrifício, que adquire o valor duma verdadeira experiência metafísica. Não há amor sem mortificação, isto é, sem a destruição voluntária do egoísmo. O amor impõe uma desarticulação prévia de si mesmo, e é por isso que amar é também sofrer.
Mas este penoso desenraizar é também um recriar; ao destruir-me, é um outro que se instala em mim, um outro que é mais que eu próprio.

A reflexão cristã, parece-me, reitera a mais simples (e profunda) intuição de todos os amantes: o amor é mais forte que a morte e amar é morrer incessantemente, para incessantemente ressuscitar.
Posso enganar-me, claro, mas isto também é Cristianismo…

cbs em tentativa de resposta ao Vitor

posted by @ 7:57 da tarde  
3 Comments:
  • At 11 de março de 2008 às 11:40, Blogger Vítor Mácula said…

    Meu caro cbs, mas eu sangue-assino por baixo que “isto também é cristianismo”, e para mel(gar) até seria capaz de acrescentar “sobre-tudo”, assim como "posso enganar-me, claro" ;)

    O meu ponto seria a relação disto com os tais de ecumenismos. Não sei se faz parte da estratégia destes auto-questionar-se ou não, mas a malta enquanto comentador mantém a liberdade total de interpelação ;)

    Abraço, bom dia

    PS: Não conheço esse Lesort, mas pelo excerto a água subiu-me à letra. É um romancista?

     
  • At 11 de março de 2008 às 19:31, Blogger cbs said…

    Há uma pequena resenha dele, em francês, no link que fiz; Paul André Lesort nasceu em 1915 em Granville e estudou em Paris.
    Foi prisioneiro de guerra entre 1940 e 45, tendo conhecido no campo de prisioneiros, entre outros, Paul Ricoeur. Faz parte de um grupo de gente, como Ricoeur, Maritain, Jean La Croix, que me entraram no coração, e que se movem entre o espiritualismo vitalista de Bergson e o existencialismo cristão de Kierkegaard e Marcel.
    As obras principais, romances, são Les reins et les cœurs (1946), Le fil de la vie (1951-54) e Le fer rouge (1957)
    Coisas velhas...

     
  • At 12 de março de 2008 às 15:34, Blogger Vítor Mácula said…

    Ah, mas Bergson e Kierkegaard são coisas sempre novas, velhas, novas, velhas, etc ;) Assim como a irónica e secular arte do romance. Obrigado pela indicação.

     
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