sexta-feira, janeiro 18, 2008
ex-citações
És indecente ó Cbs! Confrontar um gajo, assim, a frio, com disparates por ele escritos há mais de quatro anos! Disparates que ele pensava já estarem enterrados numa espessa camada de sedimentos boguísticos! Obrigá-lo a fazer aqui em público o que ele evita fazer em privado e que é explicar-se! Tás lixado comigo, pá! Vou chamar a Zazie para seres trucidado à saída da missa! Mas antes de pereceres em holocausto zaziano sempre terás direito não à explicação, que essa é minha e só minha, mas antes a uma interpretação.
Realmente, no meu percurso de fé eu tive um período cubista, chamemos-lhe assim. Ou panteísta, se quiseres. Nessa altura, como católico destes tempos, tolhido por um higiénico horror ao Catecismo mas galvanizado pelo interesse do Papa João Paulo II no diálogo inter-religioso, eu procurei o meu encontro com Jesus que é Deus e procurei-O por todo o lado. Comecei por querer perceber os muçulmanos, coitados (estávamos em 2001, claro), e li sobre o Maomé, li os Sufis, cheguei mesmo a tentar ler o Corão! Depois li a História das Religiões do Trevor Ling que me levou a espreitar o Budismo e o Hinduísmo. Cheguei a ler o Bhaghavad Gitâ, ou lá como aquilo se chama, pela competente tradução e contextualização do António Barahona, esse autêntico brâmane. Tive o meu período judaico, com ajuda do Paul Johnson, descobri Isaac Luria e a Cabala, sobretudo o bom Maimónides que deu o nome ao meu Guia, fartei-me de conversar com o Nuno Guerreiro da Rua da Judiaria, reli o Pentateuco enquanto Torá! E, já avançado nesta deriva religiosa, consegui chegar mesmo aos nossos irmãos evangélicos onde, na falta de teólogos encartados, comecei a ler o Tiago Cavaco, hábito que mantenho ainda hoje.
Tudo isso porque tive a intuição de que «a essência das revelações divinas que estão na génese das grandes religiões é muito semelhante». Pior, ocorreu-me que «a negação da Verdade das outras religiões prejudica objectivamente a afirmação da Verdade da nossa; a mútua exclusão e anatemização entre Religiões é fonte, talvez a maior, do ateísmo! A assunção profunda da Verdade da nossa religião obriga-nos a aceitar e respeitar a Verdade das outras religiões. O Ecumenismo não deve pois ser um esforço de tolerância: é um imperativo racional e teológico! » Soa bem como o caraças, não soa?
Mas depois, lentamente, paulatinamente, fui caindo em mim, fui percebendo que padecia de um mal que nem original era: excesso de conhecimento sobre os Outros, falta de conhecimento sobre Nós próprios. E isso era bem patente nas estantes da minha sala! Tinha que reequilibrar os níveis e fi-lo, sempre de fora para dentro, começando com a Simone Weil, com o Victor Frankl, com a Edith Stein, todos ex-judeus chegados ao Cristianismo, como se precisasse do seu apoio para também eu redescobrir aquilo que a nossa Fé tem de único e irreproduzível. E andava eu às costas do Unamuno quando Ratzinger foi eleito Papa, facto que me desolou profundamente. Ora foi a tentar perceber este guardião da Fé Católica, ao lê-lo (o que não é fácil), que a minha antipatia por ele se tornou numa imensa admiração. E foi então que o meu deslumbramento inter-religioso deu lugar a uma vergonha embaraçada e logo depois a uma redescoberta maravilhada e que é a redescoberta daquilo que é tão essencial como distintivo no Cristianismo e, dentro dele, do Catolicismo. Aquilo que abafa todos os relativismos, aquilo que torna a nossa Fé num inigualável instrumento de Conhecimento.
E seja dito também que este fórum trauliteiro também ajudou a cimentar o meu renovado catolicismo. E é nesta que eu estou, ó meu, ó Cbs dum camano! Só para teres uma ideia termino com uma citação comentada do grande Ratz, só para perceberes que essa cena do essencial ser comum e ser uma viagem e ser tal e coiso, não é nada assim:
«Onde Deus é compreendido como puro nada em relação a tudo o que nos parece real, como é o caso do budismo, não existe uma relação positiva de ‘Deus’ com o mundo. Neste caso o mundo não está aí para que lhe demos forma, e sim para que seja superado, porque é a fonte do sofrimento. A religião serve então para mostrar os caminhos de superação do mundo, de libertação do peso da sua aparência, mas não nos fornece parâmetros para viver nesse mundo, nem formas de responsabilidade comum dentro dele. No hinduísmo, a questão é um pouco diferente. O essencial é a experiência da identidade: no fundo do meu ser eu sou um só com o fundo oculto de ser da própria realidade. A salvação encontra-se assim na libertação da individuação, ou seja na superação da distinção de todo o ser baseada no ser pessoa: é preciso eliminar a ilusão do si mesmo sobre si mesmo. Onde já não existe a singularidade da pessoa, fica difícil justificar a dignidade da pessoa individual». Percebe-se assim melhor algo que quase nós todos esquecemos há muito: que o personalismo, a responsabilidade perante o outro e a comunidade são valores profundamente cristãos, na sua essência. E quanto ao mundo, Ratzinger diz-nos que «o mundo não é apenas aparência que, em última análise devemos deixar para trás. Ele não é apenas a roda infinita dos sofrimentos, da qual devemos tentar escapar. O mundo é positivo. Ele é bom, apesar de todo o mal e todo o sofrimento que contém, e é bom viver nele».
(da Introdução ao Cristianismo que a todos recomendo)
E mai nada!

josé

posted by @ 11:08 da manhã  
7 Comments:
  • At 18 de janeiro de 2008 às 13:12, Anonymous Anónimo said…

    As religiões foram uma invenção do caneco!
    O jeito que isto dá aos "espertos"...

     
  • At 18 de janeiro de 2008 às 13:14, Blogger mulheres_estejam_caladas said…

    Este comentário foi removido pelo autor.

     
  • At 18 de janeiro de 2008 às 13:15, Blogger mulheres_estejam_caladas said…

    Exceptis excipiendis
    O catolicismo é como uma droga: Sabe-se que há algo de errado com ele, mas volta-se anyway...

     
  • At 18 de janeiro de 2008 às 14:39, Blogger Tiago Cavaco said…

    Se hoje eu tivesse de proteger o Trento de um incêndio e guardar apenas um post era este que eu guardava.

     
  • At 18 de janeiro de 2008 às 15:26, Blogger cbs said…

    Este comentário foi removido pelo autor.

     
  • At 18 de janeiro de 2008 às 15:27, Blogger cbs said…

    José, meu caro, perdoa-me, eu bem que suspeitei que não estava a fazer nada de muito católico, lolol
    Não ligues, tava com sono e apeteceu-me entrar na corrente das citações... nem vi bem o que fazia.

    Mas, em vez do Ratz, agora deu-me para ler o Guia desde o princípio e gosto.
    Devo estar mais ou menos no teu estado cubista porque:

    "a essência das revelações divinas que estão na génese das grandes religiões é muito semelhante" não a Revelação, mas a intuição do Transcendente sim, acho semelhante.

    "A assunção profunda da Verdade da nossa religião obriga-nos a aceitar e respeitar a Verdade das outras religiões." subscrevo sem pejo, porque qualquer das grandes religiões me parece muito mais próxima do Transcendente do que o vazio ateu.
    Repito aqui Transcendente para não dizer Deus. Com Transcendente quero significar o pressentimento de Deus que ainda não é Deus Revelado.

    "O Ecumenismo não deve pois ser um esforço de tolerância: é um imperativo racional e teológico!" só aqui discordo, porque o ecumenismo é mesmo, para mim, um esforço de tolerancia, isto é, um exercício de amor fraternal.

    Ou seja, como não fiz o teu percurso, provávelmente ainda estou perto de onde estavas.
    Deixa-me lá admirar o José de antanho pá!

     
  • At 19 de janeiro de 2008 às 14:26, Blogger Hadassah said…

    Porque é que, como evangélica, fico tão descansada com esta frase do José: "consegui chegar mesmo aos nossos irmãos evangélicos onde, na falta de teólogos encartados,..."

    e com tantas dúvidas sobre este seu "reencontro" derivado da constatação da falta de certa literatura nas prateleiras da sua estante?

     
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