domingo, dezembro 31, 2006
"Quem quer ser actual já está ultrapassado"
«Sucedeu por aquela altura que Jesus atravessava umas searas com os seus discípulos. Era sábado, o dia de repouso judaico, e como os discípulos sentiam fome, começaram a partir espigas de trigo e a comer o grão. Mas alguns fariseus que os viram fazer isto protestaram: Os teus discípulos estão a ir contra a lei, colhendo no dia de sábado!

Mas Jesus disse-lhes: Nunca leram o que o rei David fez quando ele e os companheiros estavam com fome? Entrou no santuário e todos eles comeram o pão sagrado, coisa que só os sacerdotes podiam fazer. Também isto era contra a lei.

E nunca leram na lei de Moisés que os sacerdotes de serviço no santuário podiam trabalhar no sábado? Pois aqui está um que é maior do que o santuário!

Mas se conhecessem o que quer dizer esta passagem das Escrituras: 'Mais do que as vossos sacrifícios, quero provas da vossa bondade , não teriam condenado quem não tem culpa. Porque eu, o Filho do Homem, sou Senhor do próprio sábado.

Depois foi para a sinagoga, e viu ali um homem com uma das mãos aleijada. Os fariseus perguntaram-lhe: A lei permite trabalhar fazendo curas no dia de sábado? (Esperavam, é claro, que ele respondesse Sim, para desta forma poderem acusá-lo.)

A sua resposta foi: Se um de vocês tivesse uma única ovelha e no sábado ela caísse num poço, não trabalhariam para a salvar, naquele dia? Quanto mais não vale uma pessoa do que uma ovelha! Evidentemente que é justo fazer bem num sábado.

E, voltando-se para o homem: Estende o braço. Quando ele o fez, a mão doente ficou igual à sã!»

[Mateus, 12, 1-13 (nesta versão)]

Miguel Marujo
posted by @ 1:08 da tarde  
9 Comments:
  • At 31 de dezembro de 2006 às 14:15, Blogger zazie said…

    Precisamente. Ele não quis ser "actual". Ele seguiu uma lei para além do tempo. A lei da misericórdia. O imperativo ético é isto. Porque a lei não se resume a ritos e muito menos a esse exemplo máximo de toda a hipocrisia do mundo que é o espírito farisaico.

    Este exemplo não responde à questão colocada no debate. Tinhas de ser capaz de mostrar que o princípio da sacralidade da Vida é idêntico ao fariseu e provar que ir contra ele era seguir um imperativo maior e mais absoluto que este o negava, no seu particularismo

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 14:34, Anonymous Anónimo said…

    Não, não e não, Zazie! Ele actualizou o significado do Sábado! Ele mudou, ele não teve medo de arriscar levar a novidade mesmo ao Sábado! Ele seguiu uma lei para além do tempo ao tornar esse tempo novo, de hoje, de agora. É esta, e só esta, a medida da leitura por mim postada aqui, o sentido e a significação do que cito.

    E para mim, o princípio da sacralidade da Vida, mede-se nesta frase plena de actualidade: "Mais do que as vossos sacrifícios, quero provas da vossa bondade, não teriam condenado quem não tem culpa."


    [Lateralmente: não percebo como sou aqui atacado por supostamente atacar a vida e depois pasmo a ler com o Tiago a regozijar-se na sua Voz com a forca feita "pena justa". A sacralidade da vida da concepção à morte natural afinal fina-se nos escolhos da ideologia, da "actualidade", destes tempos. Que raio, (cito o Tiago, no post Atropelados) «Há sempre muitos mas, muitas contrapartidas, muito erotismo desejado com os não-da-fé, muito progressismo nebuloso. No final, desconhecemos se lemos um católico ou um vulgar sindicalista.» e substituo os da "não-da-fé" pelos "pró-bushistas" e "vulgar sindicalista" pelos "ideólogos da guerra sem olhar a meios e mentiras!]

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 15:02, Blogger zazie said…

    ehehee

    Não aguentas o argumento do ponto de vista teórico.

    A frase do Ionesco e o que eu também já tinha dito, é que o dogma da sacralidade da vida ou a persistência da condenação do aborto por parte da Igreja é um princípio que vai contra o Mundo. Contra o tempo.
    Como todos os imperativos éticos, esses princípios são trans-históricos e não perdem o seu valor pelo facto de existirem casos particulares em que podem existir questões dramáticas se a gravidês for levada àvante.
    Mas o dramatismo dessas consequências nunca poderá ser chamado uma questão de "vida ou de morte". Quanto mais não fossem porque até existe a possibilidade de se dar para adopção esse bebé.
    (não estou a defender que se deva seguir esta ideia-acho-a até contra-natura, tal como as mães de aluguer) mas, a verdade é que não acaba a vida por se ter um filho. Ponto final.

    Enquanto que a defesa teórica da Vida é um princípio abstracto que até faz parte do próprio instinto de sobrevivência da espécia humana.

    Nunca existiu nenhuma sociedade que não penalizasse o crime; se o fizesse estava a negar a sua possibilidade de sobrevivência histórica.

    É claro que, no caso do aborto a questão não é assim definitiva, de tal modo que, ao mesmo tempo que sempre foi condenado, também sempre foi praticado. Em segredo, com vergonha. E, eu penso que a intenção da Igreja em não abrir mão deste detalhe, é isso mesmo- uma preservação de um sinal negativo que é bom que não se esqueça. E, nesse aspecto, estou de acordo.

    Depois existe o outro grande valor simbólico do atentado contra o próprio desígnio de Deus, que se manifesta no facto de apenas a ele se atribuir o destino e possibilidade de criar ou determinar o fim de uma vida. Por isso, como tu dizes, a questão do aborto está a par da eutanásia. E eu, no caso da eutanásia é que não tenho a menor dúvida- sou absolutamente contra.
    Porque, nesse caso, ainda é mais clara a violação da vida ao deturpar o juramento de um médico, cujoa finalidade consiste em salvar vidas e não em fazer de carrasco por comissão burocrática.

    Resumindo: tu apontas um exemplo de Cristo como o que vai contra a lei burocrática e falsa dos fariseus. O que também correu com os vendilhões do templo. Mas não explicas que ele o fez para dissolver a moral no tempo e nos costumes da época que até podiam ser pouco morais. Não exlicas que essa misericórdia foi uma concessão humanista anti-ética. E não foi. Foi apenas contra a tradiçÃo do rito esvaziado de amor.

    E, o problema, é que o amor é o grande móbil, mas o amor não se legisla em leis que tanto podem atender o drama como o capricho.

    Por isso, o único exemplo que tu podias invocar e que eu costumo usar, é que é bom que os interditos continuem a existir porque, também é à conta deles, que o heroísmo e o espírito de sacrifício por misericórdia se pode manifestar:

    exemplo: um médico ou uma enfermeira que arriscam a profissão para atender a um caso de vida em que a lei não atende, e cometem o pecado, ou a ilegalidade, com risco de até serem presos- e ajudam a abortar.
    Este sim, é um exemplo de que a ética também vive fora da lei, com risco e com verdade. E que acaba, no dia imediato em que a interndição passa a formalismo burocrático.
    (igual para tudo, para a escapadela, para a senhora rica que assim até poupa umas massas na ida a Badajoz e passa a usar o SNS, a par da miudinha adolescente que fica na bicha e que até deixa de ser alvo da caridade de uma enfermeira que a ajudaria às escondidas.

    Perde-se tudo isto, no às claras. Mas eu não tenho posição definida porque também não me agrada que um caso extemo destes possa estar sujeito a prisão.

    Melhor dizendo: eu até sei que estes casos, na prática nunca estão sujeitos a prisão. Simplesmente não voto pelo Não porque teria de assumir que poderia estar a contribuir para uma destas miudinhas inconscientes e desamparadas poder ter a cadeia à frente, e eu ter contiguído para isso (simbolicamente é este o meu problema) e não consigo julgar ninguém. Mas essa ideia de passar a ser oficial e feito pelo SNS seja lá porque motivo, e até a ter direito a descontar nos impostos, e nas as clínicas particulares ser colocado,de forma legal, ao lado do lucro (que a presente lei até condena no artigo 141 de forma mais forte- até 8 anos de cadeia) essa ideia parece-me ser demasiado cretina e nitidamente um aproveitamento político por via da moral e dos costumes também terem passado a andar a reboque das mudanças de partido no poder.

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 15:05, Blogger zazie said…

    contribuído e mil outra gralhas. Sorry, escrevi a 300 à hora e nem reli

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 15:13, Blogger zazie said…

    Ou seja: e em termos mais abstractos: a liberalização do aborto, a par da próxima que vai ser a eutanásia e até dos casamentos e adopções gay, inscreve-se num caminhar do mundo para as avessas. Para a utopia facilitária onde tudo tem almofada e nimguém carrega culpas nem responsabilidades.

    E, é neste sentido mais amplo que se inscreve o Mundo- a socieade. Por esse motivo a lei moral é uma resistência cada vez mais difícil de aguentar quando o sentido da maioria- esboroada na indifirença- nem se preocupa com ele.

    E é também por isso que eu posso admitir que ir contra a facilidade da capa humanitária, pode ser um desejo de manutenção de alguma ordem porque ajudar a empurar para onde as coisas vão nem é preciso. Já vão por si.

    Por isso, é que acredito que o espírito conservador é o oposto do reaccionário e do revolucionário- é aquele que prefere a manutenção do que já provou ser útil e contribuir para a estabilidade e não arrisca em rupturas cujas consequências nunca foram provadas como benéficas.

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 15:14, Blogger zazie said…

    E Cristo não foi um revolucionário. Foi um ser solitário contra a voz feita da maioria.

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 15:27, Blogger zazie said…

    Quanto ao post do Tiago nem o tinha visto e como não foi colocado aqui nemsei se é muito correcto usá-lo para argumento.

    Na verdade, o problema dos debates é que, às tantas está-se mais a debater as pessoas que as palavras e ideias em causa.

    Ainda assim, não tenho o menor problema em dizer que esse post do Tiago é um exemplo de complexo ideológico neocon.
    E que mais não diz que foi para mostrarem aos bárbaros que não são diferentes que para lá foram e que este parlamente deu o exemplo.

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 15:29, Blogger zazie said…

    mas o Tiago é um esteta e, como ele confessou, gosta de palco. Grande parte do que escreve é para funcionar pelo estilo. E é verdade que tem estilo mesmo quando eswcreve disparates

    ";O)))

     
  • At 31 de dezembro de 2006 às 16:23, Blogger zazie said…

    Ainda assim, e voltando ao tal post da morte do bárbaro; estilisticamente também lhe fazia uma ligeira alteração:

    Por acaso até dava jeito que se levantassem agora uns magníficos ocidentais, porque, humanismo, humanismo, foi não ter acabado em farsa macaca numa Abu Grahib dos exportadores da democracia.

     
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