sábado, dezembro 30, 2006 |
Fé |
É costume opor às morais do sentimento as morais da razão. Depois de haver demonstrado que a sensibilidade é particular e a razão é universal, somos facilmente induzidos a eliminar da moralidade o sentimento e a fundar a ética na obrigação e no dever. (...) Notemos antes de mais, que o sentimento não se confunde com o prazer, nem com a emoção, nem com a paixão. Considerado em si mesmo, para nos servirmos da fórmula de Pradines, é uma afecção-regra. “Os meus sentimentos” dizia Pierre Janet, “são reguladores da acção, isto é, reacções a uma situação dada… mas reacções organizadas, úteis”. (...) Ter um sentimento moral elevado é possuir uma regra de acção perfeitamente adequada. Por isso não devemos considerar a afectividade apenas uma espécie de interioridade fervente ou um diálogo íntimo consigo mesmo. A afectividade liga-se à acção de que é regra, ao objecto a que nos assimila.Não é certo que o sentimento seja particular e a razão universal, a ponto de sermos obrigados a opô-los, nem é igualmente certo que a moralidade seja, acima de tudo, o triunfo da razão sobre o sentimento (como pretendia Kant, digo eu). (...) Se muitas vezes se opõem, o sentimento e a razão também muitas vezes se conciliam e são, de igual modo, factores de unidade (mútua potenciação, digo eu). Malebranche distinguia duas espécies de conhecimento: - O conhecimento por entendimento ou por ideias, que nos revela a essência das coisas sem nada nos dizer da sua existência. - o conhecimento da consciência ou por sentimento, que nos dá a conhecer a existência do eu, mas não a sua essência. Conhecemos por exemplo, o mundo exterior através da ideia – podemos fazer a ciência dele, sem contudo sabermos se existe ou não: a existência do Mundo não a conhecemos senão pela Fé. (...) Temos um sentimento interior da nossa alma, e isso significa que não podemos duvidar da sua existência, mas sem a ideia dela não possuímos a seu respeito nenhum conhecimento científico: ficamos certos da sua existência, mas ignoramos a sua natureza. (...) A opinião (...) é individual; varia com cada indivíduo e jamais atinge o real; podemos portanto duvidar sempre de uma opinião. O sentimento, pelo contrário, é ligação, põe-nos em contacto com o objecto. (…) Ter o sentimento de uma coisa é estar ligado a ela, não poder pô-la em dúvida, fazer corpo com ela. A opinião tem sempre carácter individual, o sentimento tem sempre carácter social. A opinião dispersa, o sentimento congrega. Por isso a Fé em Deus não deve apoiar-se em provas, mas no sentimento – ou consentimento – universal. E por consequencia “Provar a existência de Deus é destruir a Fé n’Ele” escreve Bonald.
Sacado e um pouco alterado de Jean Lacroix, Les sentiments et la vie morale, P.U.F. 1961
O sentimento é um indicador do nível de ligação existente entre a realidade quantificável (Ciência) e a realidade qualificável (Mística). cbs |
posted by @ 8:07 da tarde |
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