quarta-feira, novembro 29, 2006
A paprika do povo

Eu sou dos que acham que o Mundo passava bem sem Chávez. Se o preço for esse, que o Mundo passe sem presépios também.

Demagogia religiosa de esquerda é conceito mais abortivo que a interrupção voluntária da gravidez. Até demagogia ditatorial já não me cheirava bem, dispensava agora a paprika da religião.

De Chávez não se sabe bem qual a hierarquia das capelas. Se reza primeiro a Deus, se a Bolívar, se a Marx, se a Chomsky, se ao espelho. Nem tampouco está universalmente definido se quem reza a Deus pode ter Marx no coração (penso que o próprio Karl não o consentiria).

Mas claro, devemos aplaudir ou ignorar estes trejeitos de tirania. O que é a proibição sumária de uma figura como o Pai Natal (que nós cristãos desdenhamos na quadra) quando a reforma socialista do presidente até está a aumentar a riqueza do país? O que são uns desviozinhos na liberdade de expressão quando se está com tanto rigor na economia?

Com aquela última frase vem-me à lembrança que Salazar até é um nome muito apropriado para presidente sul-americano de filme série-B.

Não se diga que Chávez é um homem sem referências. O seu passado lembra-nos um jovem Castro e o seu futuro um velho Pinochet. Parece-me que todos sabemos em que é que acaba o idealismo individual quando aparece ali abaixo da linha das muito violadas fronteiras do Grande Satã Imperialista Capitalista.

Sou daqueles que acham que o mundo passava bem sem Chávez, mas admito que haja muito gente a achar-lhe graça. Nem tanto pelo pantomineiro excêntrico, mas mesmo pela panhonhice europeia. É que se o bom do Hugo viesse a Portugal dizer que lhe cheirava a enxofre e enfiar umas orelhas de burro mais uns chifres ao Cavaco (o Silva, não o Tiago ou o Tim), nós éramos panhonhas para dar umas risadinhas. Deve ser o nosso civilizadíssimo politicamente correcto que exige bonomia para com o politicamente incorrecto do pobrezinho do sul-americano.

Pouco me espanta que os presépios venezuelanos tenham a figura de Chávez na manjedoura e, já que não era a primeira vez que se apropriava, porque não uma imagem de José Sócrates como S. José?

Samuel Úria
posted by @ 10:15 da tarde  
7 Comments:
  • At 29 de novembro de 2006 às 23:29, Blogger Pedro Leal said…

    Não me digas que te ofendeu mais a proibição das decorações nos edifícios públicos com o Pai Natal ou o chiste do Chávez ao Bush do que a mentira de Bush ao mundo sobre o não-sei-quê que o Iraque tinha. E a guerra justificada por esse motivo fiel e verdadeiro, pleno de vigor democrático e sem "trejeitos de tirania".Talvez isso seja politicamente correcto.

    Mas obrigado pela referência à minha "panhonhice". Estava mesmo a precisar de uma correcçãozinha fraterna.

    CC (um dos que acha que o mundo passava melhor sem o Bush)

     
  • At 30 de novembro de 2006 às 00:35, Blogger Samuel Úria said…

    Caro CC

    Para já a "panhonhice" que eu falei era nossa, não queiras a exclusividade da ofensa.

    Quanto ao Bush, ainda não vi por aqui nenhum post a defendê-lo, nem à política externa dos estados unidos. Só nesse caso penso que poderia haver indignação. Já o que fazes parece-me ser pores o Bush a contra-ponto de tudo. Ora se o senhor presidente estado-unidense é tão asno quanto alega Chavez, como pode ser ele o contra-ponto de tudo? Como pode uma personagem tão desprovida de inteligência ser a raiz de todo o mal?
    Não estou a defender Bush. Estou a (isto com calma entende-se) defender que Bush não pode ser atacado para atacar um ataque a Chávez que nunca defendeu Bush.
    Já agora confesso que me parece algo desonesto minimazares a censura natalícia do Chavez com a questão iraquiana. COm esse desfazamento eu também poderia desculpar a guerra do iraque com atrocidades enganosas maiores, como o holocausto ou a inquisição. O que é certo é que se escreveres um post sobre a situação no Iraque nem me vai passar pela cabeça falar no holocausto ou na inquisição; por não querer desculpar uma coisa com outra completamente diferente e, sobretudo, por não terem sido chamadas á conversa, nem implícitas ao contexto.

    Agora sem hipocrisias: se tivesses que escolher um mundo dominado ou por Bush ou por Ahmadinejad, quem escolhias? A questão não é relacionada com Bush. É sobre Chávez, que defende Ahmadinejad mas nesta situação extrema de certeza que não era parvo para preferir um mundo dominado por ele. Hipocrisia?

     
  • At 30 de novembro de 2006 às 09:16, Blogger Tiago Cavaco said…

    F___ Chavez.
    Ó CC, deixa-me deixar-te uma deixa muito à Uncle Sam, na linha do love it or leave it. Por que não emigra a esquerda europeia para esse horizonte de esperança chamado Venezuela?
    Pois.

     
  • At 30 de novembro de 2006 às 10:49, Blogger Pedro Leal said…

    Samuel, deixa-me recordar-te que tu é que fizeste a primeira referência ao senhor Bush, com a história do enxofre.
    E, já agora, também falaste (a despropósito, parece-me) do Ahmadinejad. Ou o Chávez pode ser atacado através do Ahmadinejad?
    Compreendo que seja retoricamente útil essa amálgama de tipos maus, mas, embora não tenha dificuldade em descobrir más companhias do teu amado Bush, não vou por aí.

    Também não percebi por que razão chamas censura à proibição de se ornamentarem os edifícios públicos com motivos pai-natalícios. Devem ser leituras de Economist a mais.
    Ou achas que os edifícios públicos portugueses podem ser ornamentados sob qualquer gosto dos funcionários públicos? ou também é censura?

    Tiago, infelizmente não partilho essa admiração edílica dos evangélicos pela terra de promessas e maná terreno que são os EUA (com um fulgor semelhante ao dos comunistas dos anos 60 e 70 pelo Sol da Terra). Nem por qualquer outro pedaço de terra. E olha que gosto muito dos EUA. Sou quase tão americano como tu, sabes bem.

    Mas, como bom protestante, desprezas a tradição. E finges não compreender que a minha admiração pelo trabalho de Chávez na Venezuela não a torna uma terra prometida, mas tão-só um lugar um bocadinho menos injusto do que era antes.

    CC

     
  • At 30 de novembro de 2006 às 15:09, Blogger Samuel Úria said…

    Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

     
  • At 30 de novembro de 2006 às 15:11, Blogger Samuel Úria said…

    Caro CC

    Mais uma vez um equívoco. O episódio do enxofre que invoquei só diz respeito a Chávez. Se ele há uns 10 anos tivesse vindo a Portugal chamar despesista ao Guterres e chato do caraças ao Almeida Santos, a minha ira seria muito maior. O que é significativo é que até concordo com essas acusações hipotéticas e não acho que o Bush seja asno nem o Demo encarnado. O mal apontado a estas afirmações nunca se interessou pelo destinatário, só pelo emissor.
    Já o Ahmadinejad surgiu por causa do Bush (que não apareceu por vontade minha). É que gostamos muito de falar dos prepotentes americanos, mas se nos dessem a escolher em extremo uma facção para nos senhorear, das duas uma: ou mentimos ou dizemos que preferimos a alçada do tio Sam.

     
  • At 9 de dezembro de 2006 às 21:08, Blogger PedromcdPereira said…

    É um amaravilha achar graça ao Chávez aqui na europa.

    Olham para a Venezuela como o laboratório e fazem figas para que dê certo (para os admiradores do HC dar certo é não haver genocídio). Depois podem chatear-nos a molécula à vontade...Outra vez.

     
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