segunda-feira, novembro 13, 2006
Ainda sobre a Teologia da Mononucleose
Caros Miguel, José e TimShel,
já outras vezes tenho pensado sobre a vossa Teologia da Mononucleose (ainda por dogmatizar no Vaticano mas há muito encarnada pela maioria dos Católicos com cursos superiores). E como na minha também "fé sempre vivida em insegurança" pouco mais consigo descortinar que não a minha própria existência (ainda não fui redimido pelo evangelho da alteridade) deixo-vos um texto recente que escrevi, de algum modo sobre o tema, na Revista Atlântico.
Tenham paciência pela auto-citação mas aos destronados do convívio humano resta-lhes o ceptro masturbatório (o meu pastor não aprovaria isto):

"E Jesus chispou
As Escrituras falam-nos do episódio em que Jesus, atrasando-se a visitar o amigo Lázaro em doença grave, chorou ao saber da sua morte. Por isso, um dos versículos mais curtos da Bíblia diz: "E Jesus chorou" (João 11:35). Sabemos da necessidade de muitos em chamar a atenção para esta passagem para sublinhar a humanidade do Salvador. Com a mesma graciosidade teológica de quem procura nos Evangelhos um episódio oculto em que o Messias tenha corrido a meia-maratona para assim poder re-estabelecer a relação perdida entre o cristianismo e a prática do desporto. Quem carece de relatos de muitas lágrimas para simpatizar com o Redentor está para além da redenção. A gentil persuasão emocional dos nossos dias bem pode constituir um dos derradeiros sintomas da nossa falta de coração.
Certo é que no último século o Jesus que vende melhor é o humano, sereno e conciliador. Que mais facilmente seria produto da audição de uma palestra de Júlio Machado Vaz que da leitura da Palavra de Deus. O Mestre deseja-se titubeante, se necessário, uma vez que o gaguejar já ultrapassou hoje a respiração na competição pelo sinal vital mais primário. Atenção. Nada contra os gagos. Ao que tudo indica o próprio Moisés era de fala ritmada, o que não o impediu de libertar o seu povo do Egipto.
Por que substituíram as pessoas a necessidade de Deus pelo desejo de um companheiro de ginásio? Por que será que quando fala de religião o povo parece ter acabado de ser massajado na zona lombar? Nem só de relaxamento muscular vive o cidadão. Há que imputar culpas aos prelados que caem nas boas graças da comunicação social. São bispos convertidos à meiguice, escrevendo arco-íris duplos nos énes, desenhando pétalas à volta dos pontos dos is. Sobra para as religiões minoritárias suspeitas, como a minha, lembrar as curvas do caminho para os Céus. Alguém tem de incorporar os espasmos quando o Espírito Santo desce.
Não é caso para nos dedicarmos exclusivamente ao Messias vingador, chispando dos sacros olhos. Ao Mestre pragmático e de espada na mão do Evangelho de Lucas. Basta equilibrar com uma consulta ao globo terrestre. Enquanto o cristianismo cresce nos continentes tradicionalmente pagãos, confrontando sem reservas os credos nativos, na Europa a cristandade, por preferir a simpatia à fidelidade, deixa as capelas às moscas. As mesmas que poisam apenas nos ombros de um Criador de mãos tão largas quanto as fronteiras espanholas. Um Deus não feito Homem mas feito mano. Demasiado mano."


Tiago Cavaco
posted by @ 2:16 da tarde  
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