sábado, dezembro 13, 2008
«(…) Aquele que possui o espírito fraco quer sempre congelar o tempo e conservar a vida sob o apertado jugo do imobilismo.
Também existe esse espírito na religião. Foi essa a razão por que algumas vezes ela rejeitou com paixão dogmática verdades novas. Por meio de éditos e bulas, inquisições e excomunhões, a igreja tentou prorrogar a verdade e erguer barreiras intransponíveis no caminho daqueles que a procuravam. Para os espíritos fracos, o criticismo histórico-filosófico da Bíblia é considerado blasfemo, e a razão um exercício duma faculdade corruptiva. Interpretando a seu modo as Bem-Aventuranças, eles lêem: «Bem-aventurados os puros na ignorância, porque verão a Deus!»
Isto conduziu também à divulgada noção de um conflito entre ciência e religião, o que não é verdade. Haverá talvez conflito entre um religioso de espírito fraco e um cientista de espírito forte, mas nunca, mas nunca entre a ciência e a religião. Os seus campos são diferentes e os métodos diversos. A ciência investiga; a religião interpreta. A ciência dá ao homem o conhecimento, que é força; a religião dá-lhe a sabedoria, que é domínio. A ciência trata principalmente de factos; a religião, sobretudo, de valores. Não são rivais; completam-se. A ciência evita que a religião caia no abismo dum irracionalismo destrutivo e obscurantismo paralisante; a religião impede a ciência de se afundar num materialismo obsoleto e num niilismo moral.
(…)»

(Martin Luther King, in Força para Amar, tradução de Margarida Bénard da Costa, 2ª edição: Moraes editores, 1969 – Círculo do Humanismo Cristão)


«Sou discípulo de Kant. Ele diz que há três questões fundamentais: o que posso saber, o que devo fazer, o que me é lícito esperar. E achou que a primeira depende da ciência. As más catequeses tiveram sempre a mania de misturar essa questão com a apologética. Kant achava que não, eu também.
Uma coisa é tentar compreender o universo. Para isso há a física e a biologia. Se quero saber se houve ou não big bang, se a vida evoluiu ou não, não pergunto à Bíblia, não pergunto à Igreja, que não tem competências nessa matéria.
A segunda questão é o que devo fazer, como se deve viver para se ser homem. Pergunto à história, às culturas, às religiões. A terceira pergunta é o que me é lícito esperar, qual o sentido de fundo disto tudo. Aí, encontro a questão de Deus.
Em suma, questões relativas a como é feito este mundo são da ciência. O sentido da vida diz respeito à religião, à filosofia, às culturas. Nós aprendemos com todas as culturas. Eu, em particular, aprendi e acreditei em Jesus Cristo.»

(Pe. João Resina Rodrigues, em entrevista concedida a António Marujo, revista Pública, 10 de Abril de 2007)


(escolhas de) Rui Almeida
posted by @ 2:57 da tarde  
6 Comments:
  • At 14 de dezembro de 2008 às 23:04, Blogger cbs said…

    Não sou discípulo de Kant, mas "aprendi e acreditei em Jesus Cristo".
    Eu, em particular... na Igreja Romana, que foi quem me ensinou ;)

    e manda mais escolhas
    abraço Rui

     
  • At 15 de dezembro de 2008 às 14:25, Blogger vitor g.santos said…

    ola sou um discipulo de Jesus e todas, mas todas as questoes tem reposta na Biblia.
    se nao, veja:conceber a toda a não-criada massa do universo concentrada num único não-criado ponto, do tamanho de uma moeda, explodindo em um não-criado espaço-tempo, e dando origem a tudo e explicando assim o BigBang para dar uma explicaçao ao começo de tudo, implica implica, no minimo um acto de fé.

     
  • At 16 de dezembro de 2008 às 00:37, Blogger Pedro Leal said…

    Rui

    Boas citações, independentemente de concordar ou não com o que está escrito.
    Pois, eu também subscreveria o que diz Martin Luther King
    "A ciência dá ao homem o conhecimento, que é força; a religião dá-lhe a sabedoria, que é domínio. A ciência trata principalmente de factos; a religião, sobretudo, de valores. Não são rivais; completam-se. A ciência evita que a religião caia no abismo dum irracionalismo destrutivo e obscurantismo paralisante; a religião impede a ciência de se afundar num materialismo obsoleto e num niilismo moral."
    subscreveria se isso não significasse, na prática, a secundarização progressiva e subserviente do Evangelho, secundarização bem exemplificada nas palavras do Padre Resina Rodrigues. Na verdade, constato que é natural alguma tensão entre religião e ciência. Como noutras áreas da vida, não há fronteiras definidas a régua e esquadro. E quando acontece essa tensão entende-se, por regra, que a intrometida é a religião. Fica então o "deus dos restos", aquele que se contenta com o que sobra após o magistério da ciência, da cultura, e da filosofia.

     
  • At 16 de dezembro de 2008 às 10:14, Blogger cbs said…

    Desculpa meter a colher, Pedro, mas... salvo melhor opinião, essa tensão tem de existir, corresponde a "ver" e "caminhar", sendo que uma posição, isolada, torna-se estática, e a outra torna-se cega.

    Por outras palavras, ao dizeres "quando acontece essa tensão entende-se, por regra, que a intrometida é a religião" deverias dizer "quando se rompe essa tensão"; e também acontece, em certos meios, considerar que a intrometida é a ciência, o que configura a posição estática de que falei, "ver" e não compreender, uma cegueira de luz que é redutora.
    Qualquer das posições extremas configuram encarniçamentos obstinados, penso eu.

     
  • At 17 de dezembro de 2008 às 12:25, Blogger Pedro Leal said…

    cbs

    Na virgindade de Maria ou na ressurreição de Cristo, por exemplo, a posição não é estática? A ciência diz-nos que é impossível mas s fé diz-nos que foi verdade. Aí temos que optar por um dos extremos.

     
  • At 18 de dezembro de 2008 às 20:12, Blogger cbs said…

    A priori tens razão Pedro.
    No entanto falta aqui um factor, creio eu: a filosofia, o pensar com base na intuição, como diria Bergson. Creio também que, como contraponto (e complemento) da Ciencia (mais racional), a Filosofia desemboca na Religião, axiomática dos valores morais. E nesse sentido, "ver" é saber e também pode ser um caminhar.

    Dou-te razão, a fé diz-nos que foi verdade. Por isso eu (digo eu, específicamente eu) não acredito na ressureição ou na virgindade de Maria, mas sim em Jesus Cristo; e é por ele que acredtio no resto e tenho essa fé "cega" que ofuscante me guia.

    Assim, não tenho problemas nenhuns em pôr em causa "cientificamente" esses dogmas, em tentar compreendê-los sem receio de chegar a um "dead end"; a Ciência sabe pouco e tantas vezes acaba por provar que o impossivel de ontem é o real de hoje - por exemplo, é possivel, apesar de raro, uma virgem fecundada, se bem que não é disso que se trata no dogma de Maria. Quando a Ciencia não explica ou torna impossivel, sobra e impõe-se a minha fé em Cristo. Mas não deixo nunca de pensar, que para além da Ciencia - que não passa de método, de caminho - há mais... e parte desse mais pode vir ainda a ser compreendido por humanos.
    A religião não deve excluir a razão, nunca; o espirito humano deve abrir-se e não enclausurar-se.

    escrevi ao correr da tecla, desculpa se algo confuso, mas pensarei isto melhor...
    ;)

     
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