Não somos nós que somos Deus, nem sequer parcelas ou faíscas. Nada fora de Deus é Deus, não há nada de outrém em Deus: a Sua indivisibilidade é total. Mas tudo é em Deus, e nós também. Ele tocava-nos, na impossibilidade de o tocarmos nós a Ele. Até ao dia em que a sua palavra se concentrou num rosto e presença humana, e nos tocou a partir de nós próprios e por dentro. Deus é anterior a tudo o que seja. Puro princípio e simultaneamente pleno, nada decorre necessariamente Dele - nem o mundo, nem o ser, nem nós. É absolutamente indeduzível. Pode-se dizer que algo deve presidir ao puro e bruto facto de haver coisas, aqui, nós e a janela e a noite lá fora e o cinzeiro e a caneta e o outro a respirar ao nosso lado e por aí fora no tempo e no espaço e no além possivelmente. Mas determinar na inteligibilidade de conteúdos isso que se pressente no cerne da vida a partir dela própria - não o podemos.
Se está à mão, não é Deus; se não está à mão, não me é nada. Deus é mediador de si próprio em Cristo. É aí o seu acesso. A ininteligível Trindade, e a afirmação incompreensível da consubstancialidade, são o garante do acesso.
O cristianismo é um excesso total perante a existência, que pretende desbloquear esta das suas aporias. Deus aqui não é uma conclusão mas um ponto de partida; mais do que tentar entender a Trindade e a Revelação, trata-se de nos tentarmos entender e viver a nós próprios a partir delas. E a conclusão, por ora e como se diz - só a Deus pertence. cbs |